Receita electrónica arranca em Portalegre

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Os doentes vão passar a levar uma referência numérica à farmácia,em vez de um papel PÚBLICO

Nos últimos dias têm sido montados, com toda a pressa, computadores nos gabinetes dos clínicos dos centros e extensões de saúde desta região alentejana. E tudo graças ao projecto-piloto da receita electrónica que hoje vai ser publicamente apresentado em sessão presidida pelo ministro da Saúde, Luís Filipe Pereira.

À boa maneira portuguesa, porém, o projecto está a arrancar aos solavancos. Há locais onde os computadores já estão montados mas os médicos ainda não foram formados; outros há, como hospital de Portalegre, onde as duas etapas já estão completas, mas a receita electrónica apenas deverá começar a funcionar na próxima semana. "O projecto está no início e hoje apenas vai ser dado o pontapé de saída", desvaloriza José Cruzinhas, vogal da Administração Regional de Saúde do Alentejo.

Numa primeira fase, a experiência arrancará nos hospitais Dr. José Maria Grande (Portalegre) e no Hospital de Santa Luzia (Elvas), para além dos 16 centros de saúde do distrito de Portalegre ligados em rede com as quatro dezenas de farmácias da região.

Na prática, o que vai mudar é que os doentes atendidos nas unidades de saúde de Portalegre, em vez de receberem as tradicionais receitas, levam apenas uma referência numérica que permitirá ao farmacêutico identificar no computador da farmácia a prescrição do médico e aviá-la, dispensando papéis. É fácil, evita erros de leitura e permite detectar eventuais anomalias e fraudes rapidamente.

Outra grande vantagem da prescrição electrónica é que o Serviço Nacional de Saúde passará a ter, em tempo real, o controlo da despesa com medicamentos, facto não negligenciável numa altura em que o próprio ministro da Saúde já percebeu que o controlo dos gastos com fármacos é mais complicado do que calculara - em 2004 a factura cresceu 9,2 por cento, regressando a níveis anteriores a 2002 .

Quem também vai lucrar com este sistema são as farmácias, que passam a gerir de forma mais adequada os seus "stocks". Não terá sido por acaso que o Ministério da Saúde escolheu para parceiro único neste projecto a Associação Nacional de Farmácias (ANF). Preparar as farmácias para o projecto-piloto de Portalegre foi fácil, uma vez que a maior parte já tem computadores e está ligada em rede desde há muito tempo.

Prós e contras

O processo correu sem sobressaltos, garante Costa Freire, ex-secretário de Estado da Saúde e gestor da Consiste, empresa do universo da ANF que está a desenvolver este projecto. Optimista, o gestor acredita ser possível alargar a experiência a 80 por cento do país nos próximos quatro anos.

Mais cauteloso, Alberto Serrano, vogal do Instituto de Gestão Informática e Financeira (IGIF) do Ministério da Saúde, afirma que o "conceito vai ser testado e os problemas práticos verificados" e que, "se funcionar bem, será generalizado a todo o país".

Aparentemente, todos saem a ganhar com o projecto. Os especialistas contactados pelo PÚBLICO não o negam, reconhecendo as virtualidades da experiência. Mas também não deixam de apontar deficiências à forma como o processo foi conduzido. "Mandava a boa governação que o projecto fosse apresentado aos parceiros", nomeadamente as ordens dos médicos e dos farmacêuticos, defende António Rodrigues, membro da Comissão para a Utilização Racional do Medicamento.

Admitindo embora que isso possa ter acontecido apenas por "uma questão logística", Rui Nogueira, da Associação Portuguesa dos Médicos de Família, lamenta que a ANF seja o único parceiro do Ministério da Saúde neste projecto, o que "não parece razoável". Os dois especialistas gostariam ainda de saber quem vai ficar detentor da informação agregada e esperam que questões como a do sigilo profissional tenham ficado salvaguardadas.

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