Morreu o antigo secretário-geral da ONU Kurt Waldheim

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Kurt Waldheim DR

Waldheim, presidente da Áustria entre 1986 e 1992 e secretário-geral da ONU entre 1972 e 1981, foi hospitalizado em Maio por causa de uma infecção e febres altas. Na última semana, teve alta do hospital e foi levado para casa onde acabou por morrer, revelou a família.

Apesar da polémica sobre o seu passado nazi, Kurt Josef Waldheim foi eleito presidente da Áustria com 54 por cento dos votos, uma vitória boicotada pelos países ocidentais, com excepção para o Vaticano que o convidou para uma visita de Estado. Os Estados Unidos chegaram a proibir a sua entrada no país, uma decisão nunca tomada em relação a qualquer outro dirigente austríaco.

As revelações sobre os episódios menos claros da carreira militar de Waldheim começaram a ser feitas pelo Congresso Mundial Judaico (CMJ) quatro meses depois de ter entrado oficialmente na corrida às presidenciais. Segundo esta organização, sediada nos EUA, Kurt Waldheim fez parte do grupo de oficiais austríacos ligados a Exército alemão que mandou mais de 42 mil judeus gregos de Salónica para a morte nos campos de extermínio nazis. O CMJ garante ainda que o antigo chefe de Estado austríaco foi responsável directo pelo massacre de milhares de jugoslavos nas montanhas de Kozara, palco de uma importante batalha durante a II Guerra Mundial.

Quando foi confrontado com estas acusações, Kurt Waldheim começou por negar qualquer envolvimento nas atrocidades relatadas, mas, mais tarde, já enquanto presidente, fez uma afirmação que chocou a opinião pública internacional: “só fiz o meu dever”. Nessa altura, a grande maioria dos austríacos não acreditava nos actos que imputavam ao presidente que tinham acabado de eleger. O certo é que o próprio Waldheim admitiu, durante uma entrevista em 1988, que este escândalo levou os austríacos a reverem a sua condição de vítimas passivas da Alemanha nazi.

“Dia após dia, tenho sido invariavelmente perseguido por acontecimentos que se passaram há 40 ou mais anos. Os meus inimigos continuam a trazer a lume acusações e prometem novas provas. Provas que nunca apareceram”, disse Waldheim.

Mas o certo é que as provas foram aparecendo. Uma fotografia de 1943, por exemplo, mostra Waldheim de uniforme militar ao lado de oficiais dos Exércitos italiano e alemão e das SS, a organização paramilitar directamente ligada ao partido nazi. No final dos anos 80, o CMJ divulgou documentos que provam que a unidade do antigo secretário-geral da ONU esteve ligada à morte de activistas políticos e civis. Alguns desses documentos tinham a assinatura ou as iniciais de Waldheim. Apesar destas evidências, o chefe de Estado austríaco continou irredutível no seu cargo afirmando que o seu “trabalho” nessa época passava apenas por verificar a autenticidade dos documentos e não dar ordens ou passar informações. Quando o escândalo estava ao rubro, alguns jornais jugoslavos publicaram um fac-símile de um documento que mostra o nome de Waldheim entre uma lista de oficiais alemães que estiveram envolvidos na operação das montanhas Kozara. De acordo com fontes da ex-Jugoslávia, 68 mil pessoas, incluindo 23 mil crianças, morreram nessa ofensiva do Exército alemão.

Depois da polémica, foi publicado ainda o relatório de um comité de historiadores que mostra que Waldheim era mais do que um burocrata de baixa patente. Por outro lado, nada fez ao saber do planeamento de várias atrocidades cometidas pelos nazis durante o conflito.

Nos últimos anos, Kurt Waldheim raramente se mostrava em público. Mas, em Maio último, apareceu no Parlamento austríaco para uma cerimónia em memória das vítimas da violência e do racismo na qual participaram também sobreviventes dos campos de concentração nazis.

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