Revistas de culinária tiram a barriga de misérias à imprensa portuguesa
O grupo Edimpresa, de Francisco Pinto Balsemão, vai lançar, no final de Setembro, uma nova revista mensal de culinária intitulada "Boa Mesa", entrando assim num mercado disputado palmo a palmo pela Meribérica, Impala, PressPeople, Instituto Vaqueiro e Hachette Filipacchi. Apesar da crise na imprensa, as revistas de culinária constituem em Portugal um dos mais pujantes segmentos de mercado, a comprovar que, como garante a sabedoria popular, "os olhos também comem".Semanalmente, cinco publicações lutam pela preferência do público, a que se juntam outras tantas mensais e mais três com publicação regular ao longo do ano. Nem mesmo as revistas de televisão escapam à moda da culinária - todas apresentam semanalmente um destacável com receitas ilustradas, o que prova o interesse que o assunto desperta no público.Um dos pioneiros nesta arte é o chefe António Silva, o fundador e actual director culinário da "Teleculinária", a mais antiga revista da especialidade que continua no mercado. "Começámos em 1976 e chegámos a fazer 260 mil revistas por semana. Havia senhoras que a compravam para oferecer às filhas e às mães. Ainda hoje há gente que me diz que aprendeu a cozinhar comigo, o que muito me honra. Não fico envaidecido mas fico comovido", conta o chefe Silva, que também chegou a cozinhar nos ecrãs da RTP.Lembrando a primeira revista de culinária portuguesa, "O Banquete", de Maria Emília Cancella de Abreu, o cozinheiro vê com bons olhos a evolução do mercado e o destaque que é dado em Portugal à culinária. "É bom que assim seja, porque o público tem muito por onde escolher", diz, acrescentando, contudo, não ter o hábito de folhear a "concorrência", para não se influenciar. "Eu gosto de fazer por mim, embora esteja sempre a aprender com o povo, com as donas de casa", revela.Leitores do sexo masculino são cada vez maisDonas e donos, porque há muito que cozinhar deixou de ser património exclusivo das mulheres. "A maioria do nosso público ainda é feminino, mas temos cada vez mais homens a escreverem-nos, a pedirem-nos receitas e conselhos", afirma Graça Morais, directora da "Mulher Moderna na Cozinha" e de "Segredos de Cozinha", dois títulos da Impala, editora de revistas como a "Maria" e a "Nova Gente". A responsável garante que "os tempos mudaram" e que "há agora muitos mais homens que vivem sozinhos, que gostam de cozinhar, de reunir amigos em casa e de fazer os seus petiscos".Directora da "Segredos de Cozinha" há oito anos, Graça Morais assistiu à multiplicação de títulos neste segmento de mercado e encara o negócio com sentido prático: "Os bons produtos são sempre vendáveis, desde que vão ao encontro das necessidades dos leitores." Ingrediente imprescindível para o sucesso das receitas é o marketing e, por isso mesmo, o título conta há meses com a colaboração do barranquenho Zé Maria, vencedor da primeira edição do Big Brother. "Temo-lo a ele, como poderíamos ter qualquer outro chefe, porque ele cozinha muito bem", assegura Graça Morais.Em concorrência directa está agora a PressPeople, uma editora de Cascais que lançou, só de há um ano para cá, duas revistas semanais ("Receitas de Sucesso" e "Cozinha Semanal") e mais duas mensais ("Cozinha de Sucesso" e "Cozinha Tradicional de Sucesso"). Pelo meio, há ainda edições especiais da "Receitas de Sucesso", dedicadas ao chocolate, ao bacalhau, ou ao leite condensado, só para citar algumas. A directora editorial, Manuela Bica, não tem dúvidas: "Há mercado para todas, enquanto tiverem este tipo de receitas, simples de confeccionar e com alimentos que agradam aos portugueses. Um bacalhau vende sempre bem, uma peça de carne no forno também é um sucesso. Ou então, os morangos, na época deles", exemplifica.Também Carlos Capote, autor de programas televisivos e que desde o início do mês dá a cara a um destacável de culinária na "TV Guia", acredita no potencial do negócio. "Temos um receituário tão rico, que tem pano para mangas. Mas isto é tudo uma questão de marketing e há que manter o pessoal entretido a cozinhar, porque este país está num estado lastimável", comenta.O cozinheiro acredita que "há mercado para todos" e que o seu objectivo é "dar a conhecer algumas receitas caídas em desuso, mas sempre com ingredientes fáceis de arranjar e a baixo custo". Confrontado com a possível saturação do mercado editorial, Capote diz esperar que isso não aconteça. "Deus queira que não. É que isto já dá trabalho a muita gente", desabafa.