Subida do rendimento das famílias é atenuada pelo custo dos combustíveis e imposto sobre crédito

Carga fiscal diminui mas mantém-se acima dos 36% do PIB em 2016. Aumento do ISP faz imposto subir combustíveis quatro a cinco cêntimos. Tabaco sobe e imposto de selo sobre as operações de crédito ao consumo vai ser agravado em 50%.

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Centeno apresentou nesta sexta-feira o esboço do orçamento enviado à Comissão Europeia Daniel Rocha

O Orçamento do Estado para este ano contém medidas de aumento do rendimento, mas traz outras que penalizam quem tem carro, com um agravamento do imposto dos combustíveis (o ISP), quem peça crédito ao consumo (por via do imposto de selo) e os fumadores de cigarros (que voltam a assistir um agravamento fiscal).

No esboço do orçamento que apresentou nesta sexta-feira, o ministro das Finanças foca-se nos impostos indirectos, ao mesmo tempo em que alivia algum do peso do IRS (pela redução da sobretaxa). É aquilo a que o executivo chama de uma “saudável recomposição das receitas”.

Com aquelas três medidas de aumento da receita mas também com os resultados do combate à fraude e evasão fiscal, a equipa de Mário Centeno prevê um impacto positivo de 392 milhões de euros nas receitas arrecadas pelo Estado (0,21% do PIB).

Com o agravamento do imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP), o preço do litro do gasóleo sobe quatro cêntimos e o da gasolina aumenta cinco cêntimos. O objectivo é compensar a descidas verificadas desde Julho, por causa da queda do preço do petróleo nos mercados internacionais, repondo o nível de tributação aos valores de então. A medida será implementada através do ISP, compensando assim as perdas com o IVA.

No caso do tabaco, explicou Mário Centeno em conferência de imprensa, haverá uma actualização na fórmula de cálculo do chamado “imposto mínimo”, com impacto numa parcela do imposto cobrado e que passa a incluir o IVA. Será “uma alteração fiscal que actualiza o valor do imposto específico em 3% e tem um impacto ao longo de toda a cadeia de preços no tabaco”.

Travar endividamento
Em relação ao imposto de selo, este sofrerá um aumento de 50%. Com isso, o ministro diz que o objectivo é dar um sinal de maior contenção do endividamento das famílias, por se aplicar às operações de crédito ao consumo.

A medida foi já contestada pela Associação de Instituições de Crédito Especializado (ASFAC). Num comentário enviado ao PÚBLICO, o presidente da ASFAC, António Menezes Rodrigues, mostra “preocupação” com “o anúncio de medidas conducentes a restrição do consumo”.

“Com um aumento de 50% do imposto de selo, as instituições financeiras perdem competitividade e os consumidores também não saem beneficiados, dado que o custo do crédito vai aumentar”, avalia Menezes Rodrigues. A medida vai em contracorrente com as expectativas que o sector tinha sobre o programa eleitoral do PS, mas também sobre o programa do Governo, que, explica o presidente ASFAC, apontavam para que, em 2016, “o aumento da procura interna e do consumo seriam factores importantes para o crescimento do PIB”.

Com as medidas previstas para o orçamento, o executivo quer, por um lado, aumentar o rendimento disponível e aumentar o consumo, mas, por outro, desincentivar o endividamento, numa altura em que o crédito vencido nos empréstimos ao consumo representa 10,6% do valor concedido aos particulares pelo sector financeiro.

A concessão de novos créditos ao consumo tem vindo a crescer nos últimos tempos, nomeadamente ao nível dos empréstimos para a compra de automóveis. Entre Janeiro e Novembro do ano passado, o total dos novos empréstimos foi de 1624 milhões de euros, mais 41% do que no ano anterior, de acordo com os últimos dados do Banco de Portugal.

No imediato, a perspectiva de um gasto superior com o imposto de selo poderá vir agora acelerar o processo de compra de quem já ponderava adquirir um veículo. Por outro lado, uma fonte bancária referiu que a medida pode conduzir a um aumento do valor dos empréstimos concedidos, de forma conseguir pagar a subida do imposto com o próprio financiamento.

O cálculo do imposto de selo sobre o crédito ao consumo varia conforme a maturidade: até um ano, de um a cinco anos, e de cinco a mais anos. No primeiro caso, a compra de, por exemplo, uma máquina de lavar roupa com empréstimo de 500 euros a dez meses terá uma subida de 1,75 euros.

Já uma televisão de 1000 euros paga a mais de um ano implicará pagar mais 4,5 euros, enquanto o caso de um automóvel que custe 25.000 euros com um crédito superior a cinco anos ficará mais caro em 125 euros. Se o aumento decidido pelo Governo implicar também uma subida do imposto de selo que incide sobre os juros pagos mensalmente, a factura será ainda maior.

Neste momento, não é claro se também incide

Olhando para as facturas que irão subir, no caso de um condutor de um carro a gasóleo que encha o depósito (50 litros) duas vezes por mês, e com o preço por litro a um euro, o aumento do ISP faz com que pague mais 3,2 euros. No caso do tabaco, não se sabe ainda o impacto final, mas é certo que ficará sempre mais caro.

Carga fiscal nos 36,1%
Os 392 milhões de receita que o Governo espera arrecadar com o ISP, imposto de selo, tabaco e as medidas de combate à evasão fiscal compensam apenas em parte a perda prevista com a redução gradual da sobretaxa de IRS em função dos escalões de rendimento (430 milhões de euros).

No esboço do orçamento, o executivo ainda não discrimina quanto é que espera arrecadar com cada um dos impostos, apenas refere que a redução total da receita será de 0,9%, ou seja, cerca de 1680 milhões de euros.

A recomposição das receitas fará com que haja uma diminuição do peso dos impostos directos em 3,4% e um aumento de 5,8% do peso dos impostos indirectos (como é o caso do tabaco, ISP e do imposto de selo). Por esclarecer está qual é o impacto individualizado no aumento das receitas destas medidas do lado dos impostos indirectos e combate à evasão fiscal, que valem em conjunto 0,21% do PIB.

No documento enviado a Bruxelas, o executivo refere que a redução dos impostos directos se deve “à eliminação gradual da sobretaxa do IRS, bem como à materialização em 2016 do efeito da redução da taxa do IRC para 21%, introduzida no OE de 2015”.

Ao todo, a previsão é que a carga fiscal seja de 36,1% do PIB, face aos 36,9% estimados para 2015.

O esboço confirma ainda qual o impacto orçamental do desagravamento do IVA da restauração para 13% a partir de 1 de Julho (uma diminuição da receita de cerca de 168 milhões de euros, mas que seria perto do dobro se entrasse em vigor a 1 de Janeiro) e das alterações na sobretaxa de IRS (0,23% do PIB, ou seja, 430 milhões).

Em relação à consolidação orçamental, a Comissão Europeia ainda não se pronunciou oficialmente sobre as medidas que reduzem a receita. Mas quanto à composição da carga fiscal, o Governo procura ir ao encontro das recomendações que Bruxelas tem feito a alguns países europeus, incluindo Portugal.

Num relatório publicado em Setembro sobre as reformas nos sistemas de impostos dos países europeus, a Comissão considerava que a economia portuguesa ainda tem margem para aumentar a carga fiscal. E se Portugal decidisse fazê-lo, aconselhava a privilegiar os impostos com menos efeitos negativos sobre o crescimento económico: em vez de um agravamento dos impostos directos sobre o rendimento das pessoas e das empresas, defendia antes um aumento da fiscalidade dos impostos sobre o consumo. com Rosa Soares e Camilo Soldado

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