PS propõe novas regras de contratação para facilitar mobilidade no Estado
Programa eleitoral prevê que técnicos superiores celebrem contrato com a Administração Pública em geral, sem especificar o serviço ou organismo em causa. Medida facilita mobilidade e gestão de recursos humanos. Sindicatos desconfiam.
Os socialistas propõem um conjunto de medidas para “valorizar o exercício de funções públicas”, nomeadamente a eliminação total dos cortes salariais em 2017, o descongelamento das progressões em 2018, a revisão do mecanismo da “requalificação” e “a injecção de sangue novo na Administração Pública”, através dos concursos para jovens quadros superiores com vínculo ao Estado como um todo.
Pedro Camões, professor na Universidade do Minho e especialista em Administração Pública, nota que esta medida vem na sequência da “política de recursos partilhados” que é transversal ao programa eleitoral do PS. “A estratégia é concentrar os serviços de acordo com as suas tipologias na área do atendimento ou das compras públicas e essa estratégia exige uma maior flexibilização da gestão do pessoal”, destaca em declarações ao PÚBLICO.
O especialista lembra que actualmente essa flexibilização só é possível através “do quadro de disponíveis, porque a lei pressupõe a afectação do trabalhador a um serviço específico”, excepto em determinadas carreiras especiais como a dos professores, a dos juízes ou dos funcionários judiciais.
“A medida vai no sentido certo e corresponderá a uma grande alteração. Passa-se a dizer que os recursos são do sector público e não de um serviço”, realça. Alerta, contudo, que “será difícil de implementar e implica uma alteração da lei". Além disso, acrescenta, “há questões que se colocam, nomeadamente ao nível da mobilidade geográfica": "É difícil que o regime legal preveja que a Administração possa dispor dos funcionários para trabalharem em todo o território nacional”.
A mobilidade da generalidade dos funcionários do Estado (com excepção das carreiras especiais, que têm regras próprias) pode ocorrer dentro do mesmo serviço ou entre serviços diferentes, estando sujeita a algumas restrições e ao acordo do trabalhador. Em alguns casos, mesmo quando se trata da transferência para um serviço a mais de 60 km da residência, o acordo do trabalhador é dispensado, embora ele possa sempre invocar e provar prejuízo sério para a vida pessoal. As mobilidades são, em regra, temporárias e só podem tornar-se definitivas por acordo.
Caso a proposta do PS vá por diante, será também preciso esclarecer como é que este regime vai articular-se com o Curso de Estudos Avançados em Gestão Pública, ministrado pelo INA (acrónimo que designa a Direcção-Geral da Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas) e que tem sido a principal via de entrada de técnicos superiores no Estado. O curso está sujeito ao pagamento de uma propina e a sua conclusão garnate um lugar na carreira de técnico superior.
Sindicatos desconfiam
Para os sindicatos, medidas que impliquem a admissão de novos trabalhadores e uma renovação dos quadros de pessoal – “que nos últimos anos se tornaram muito envelhecidos” - são vistas como positivas. Mas, ao mesmo tempo, querem saber como é que a medida será operacionalizada e como será articulada com as regras que estão em vigor para a função pública e que estabelecem alguns limites à mobilidade geográfica dos trabalhadores.
Para José Abraão, coordenador do Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública (Sintap) e uma das vozes que dentro do PS tem contestado a redução da TSU, “a ideia parece aceitável”. “Tudo o que seja renovação de quadros na Administração Pública é positivo, porque é um movimento contrário à tendência dos últimos anos. Temos de ver como será operacionalizada” , disse ao PÚBLICO.
Ana Avoila, coordenadora da Frente Comum (CGTP), ressalva que ainda não analisou em profundidade as propostas do PS. À partida parece-lhe positivo que haja uma intenção de reforçar os quadros da função pública, lembrando contudo que não são só os técnicos superiores que estão em faltam, mas também trabalhadores de outras carreiras.
A sindicalista nota que a medida poderá representar uma ruptura face à forma como se processa actualmente o recrutamento. “É normal abrir-se um concurso para a Saúde, por exemplo, sem dizer qual é o serviço, mas sabe-se o ministério em causa. Se não há qualquer indicação, pode ser perigoso”, alerta, justificando que o risco é os trabalhadores serem deslocados dos serviços ou de localidade contra a sua vontade.