Porto volta a atacar: TAP vai cortar 70% da operação, acusa a autarquia
Depois de uma semana de intensa polémica em redor dos voos da companhia no Sá Carneiro, levanta-se agora dúvidas sobre a legitimidade da chamada “ponte aérea”.
A Câmara do Porto não parece mesmo disposta a baixar os braços relativamente aos cortes na operação da TAP no aeroporto Francisco Sá Carneiro. Neste domingo, a autarquia lançou novas críticas à companhia, que acusa de ter cortado em 70% o número de voos na região. Acusações que surgem a poucos dias da reunião entre António Costa e Rui Moreira, marcada para quarta-feira.
Num artigo publicado no site Porto.pt, a câmara diz que a cidade “perde 70% dos seus voos TAP e o número de lugares disponíveis em rotas como Madrid ou Genebra baixa radicalmente, além de Roma, Milão, Bruxelas, Barcelona e Londres verem frequências reduzidas a zero ou parcialmente”.
A decisão de reestruturar a operação no aeroporto Francisco Sá Carneiro foi tomada depois de a transportadora aérea ter sido vendida, pelo anterior governo PSD/CDS, ao consórcio Atlantic Gateway, de Humberto Pedrosa e David Neeleman. E tem causado muita controvérsia, sobretudo desde que o executivo de António Costa alterou as condições da venda, acordando com os privados que o Estado passará a ter 50% do capital (e não os actuais 39%).
O texto publicado pela autarquia liderada por Rui Moreira aprofunda, em especial, a situação da PGA e da chamada “ponte aérea” que a TAP vai iniciar entre Lisboa e Porto, no próximo dia 27 de Março. Serão voos de hora a hora, operados pela TAP Express, a antiga PGA, mas também com recurso a aviões e tripulações da White (grupo Omni). A TAP, que já recorria ao fretamento de dois aviões da White, subirá agora a fasquia para oito ATR, aviões com maior capacidade que vêm substituir os ATR mais antigo e alguns Embraer.
“A Portugália [PGA] custou ao Estado 140 milhões de euros, pagos há oito anos ao BES. Desaparece a 27 de Março e os seus voos serão entregues à privada White sob a designação TAP Express e sem qualquer capital público envolvido”, começa por afirmar a Câmara Municipal do Porto.
“Os voos que a TAP anunciou recentemente pretender suprimir a partir do Porto, bem como alguns outros que a TAP não comunicou mas que também vai suprimir ou onde vai baixar o número de lugares disponíveis, são quase todos operados pela Portugália”, lê-se no site Porto.pt.
Mas o documento vai mais longe, analisando o negócio de venda da PGA à TAP e as condições impostas na altura pela Autoridade da Concorrência para que este se realizasse. Por entender que poderia estar em causa uma concentração com risco de posição dominante, o regulador obrigou a companhia de bandeira ceder slots aos concorrentes no trajecto Porto-Lisboa, Lisboa-Funchal e Porto-Funchal. Além disso, a TAP assumiu o compromisso de não aumentar o número de frequências oferecidas entre Lisboa e Porto por um determinado período de tempo”, relembra a autarquia, juntando os anexos que comprovam a existência destas obrigações.
“A Autoridade da Concorrência estava, por isso, preocupada com a concentração da operação na rota Porto-Lisboa. Ou seja, estava preocupada com a possível criação de uma ‘ponte aérea’”, refere.
Em Outubro de 2015, o regulador aprovou a privatização da TAP, considerando que "nenhuma das partes adquirentes tem actividade nas rotas aéreas que a TAP opera, nem existe o risco de eliminação de concorrência potencial sobre a TAP nas rotas para o Brasil".
Mas, como lembra a autarquia, o regulador “não analisou as alterações anunciadas em Janeiro por Fernando Pinto [presidente da TAP], que estarão em vigor em 27 de Março e que podem representar uma distorção objectiva e completa ao mercado de aviação civil em Portugal, com uma enorme concentração de operação num só operador que, anteriormente, nem sequer tinha qualquer voo regular no mercado doméstico: a White”. A mesma empresa cujos aviões “têm origem na brasileira Azul [de David Neeleman], em regime de locação”, acrescenta.
Para a câmara liderada por Rui Moreira, “o desaparecimento da Portugália e sua substituição pela TAP Express não foi, pois, uma mera operação de marketing ou de mudança de naming, mas a verdadeira transmissão para uma terceira parte, uma fatia considerável da operação aérea comercial em Portugal, nomeadamente, 16 voos diários entre o Porto e Lisboa”.
“Toda esta operação, que antes estava na esfera pública e passou agora a ser operada por privados, não está, por isso, incluída no controlo do Estado, nem sequer a 50%, se a reversão parcial da privatização foi concretizada, como anunciou o Governo. Foi, por assim dizer, uma espécie de subconcessão, mas cujas regras e contornos não foram públicos”, sublinha.
O texto termina com a promessa de que a autarquia não vai parar por aqui. “Esta investigação (…) continuará nos próximos dias, com a apresentação dos números reais que nunca foram assumidos pela TAP e que representam um impacto negativo para o Porto muito superior ao que, até agora, se julgava existir”. Recorde-se que, no final da semana passada, a companhia enviou um documento a associações do Norte em que justificava o encerramento de rotas com prejuízos de oito milhões de euros.
O texto publicado no Porto.pt surge a poucos dias de António Costa receber em Lisboa o presidente da Câmara do Porto, depois de Rui Moreira ter pedido uma audiência urgente com o primeiro-ministro para debater a situação da TAP. O encontro está agendado para quarta-feira, ainda sem hora fechada.
Contactada pelo PÚBLICO, a TAP preferiu não fazer comentários.