Lei contestada pelos estivadores entra hoje em vigor

A nova lei vem limitar o acesso dos estivadores a algumas funções dentro dos portos. Governo afirma que vai trazer flexibilização do sector e uma redução na factura portuária que pode chegar aos 30%.

Foto
Nova lei traz um rasto de quatro meses e meio de greves e protestos dos estivadores Daniel Rocha

Na dimensão laboral, ponto crucial devido à contestação que gerou junto dos trabalhadores portuários, a nova lei vem alterar o âmbito das funções que podem ser desempenhadas pelos estivadores.

Ao contrário do que acontecia ao abrigo da lei de 1993, a movimentação de carga em trailers, a armazenagem e os serviços nas portarias deixam de ser consideradas funções do trabalho portuário. Assim sendo, os estivadores, que desempenhavam até agora estas funções exclusivamente, vão deixar de ter acesso a elas, que passam a estar abertas a trabalhadores não-portuários.

Ainda dentro do apelidado pacote de poupança “5+1” com que o Governo espera cortar a despesa das empresas com os portos até 30%, encontram-se ainda a renegociação dos contratos de concessão dos portos e a redução das taxas portuárias pelo Estado. Espera assim o Executivo compensar a perda de receita exigida aos proprietários dos navios (armadores) com uma maior flexibilização dos portos.

Nova lei tem rasto de quatro meses
A nova lei entra com um rasto de quatro meses e meio de paralisações nos portos que ainda deixa sequelas na movimentação de mercadorias. Parte exigência da troika, parte vontade do Governo em flexibilizar e aumentar a competitividade do sector, a nova lei do trabalho portuário foi aprovada em Agosto em Conselho de Ministros. O documento, que iria tardar até chegar à Assembleia da República, em Novembro, levava o selo de aprovação da UGT e do sindicato de trabalhadores portuários de Leixões, o segundo maior porto nacional.

Se, por um lado, o Governo argumentava que a nova lei traria mais emprego e mais competitividade, os estivadores dos sindicatos da Frente Comum defendiam que iam perder postos de trabalho, que a segurança seria afectada e que a verdadeira competitividade vinha de trabalhadores especializados.

Foi em Agosto, pouco antes do documento seguir para aprovação que se registaram as primeiras greves. Nas primeiras semanas, resultavam de dias inteiros de paralisação distribuídos por diferentes áreas de trabalho em dias diferentes, de forma a assegurar que a actividade dos portos congelasse totalmente.

Nas primeiras semanas, as paralisações chegaram a atingir o porto de Sines, que entretanto deixou de acompanhar as paralisações sem nunca deixar de apoiar as greves. 

Os trabalhadores em contestação afirmavam, como afirmam agora, que a nova lei vai levar à desprofissionalização e à precarização do sector. Dizem também que o Governo não levou em conta as propostas de alteração e alegam que nunca foram ouvidos até ao documento estar terminado.

Os portos afectos aos sindicatos da Frente Comum – Lisboa, Setúbal, Aveiro, Figueira da Foz e Caniçal, na Madeira – foram renovando os pré-avisos de greve. Exigia-se que o Governo se sentasse à mesa com os estivadores para discutir a nova lei dos portos.

Já o Executivo, quase sempre na voz do secretário de Estado das Obras Públicas, dos Transportes e Comunicações, Sérgio Monteiro, disse ter tomado em conta as sugestões dos sindicatos afectos à Frente Comum. Sobre as acusações de falta de diálogo, o Governo repetiu várias vezes que não se sentaria à mesa com os estivadores se estes não suspendessem as greves, que em Outubro se transformara em paralisações de um turno por dia.

Aprovação e fim da greve
A 29 de Novembro foi aprovada a nova lei do trabalho portuário na Assembleia da República, com o voto a favor do Partido Socialista. Os socialistas disseram então que aprovariam sempre medidas que visassem o aumento da produtividade e crescimento da economia.

O PS já tentara no passado uma reforma à lei do trabalho nos portos, durante o primeiro Governo de maioria de José Sócrates. Sobre a lei dos socialistas, Vítor Dias, a cara da contestação e o presidente do sindicato dos estivadores do Centro e Sul, admitiu ao PÚBLICO que “era uma lei com pés e cabeça, ao contrário desta”.

As paralisações prosseguiram até 27 de Dezembro, data em que os sindicatos da Frente Comum decidiram colocar um fim à contestação. Em primeiro lugar, justificam, não adiantava contestar uma lei que já tinha data marcada para entrar em vigor. Em segundo lugar, no entanto, queriam dar oportunidade às negociações, que empresas e operadores dos portos afirmavam que só iriam acontecer caso terminassem as greves.

Em todo o caso, os estivadores anunciaram em Dezembro que iriam mover um pedido de inconstitucionalidade à Presidência da República e uma queixa à Organização Internacional do Trabalho. Os trabalhadores entendem que a nova lei do trabalho portuário impede os princípios constitucionais da contratação colectiva e que, à luz do código internacional do trabalho, levantam obstáculos à formação do quadro de efectivos dos portos. Essas queixas ainda não avançaram, como admitem os sindicatos, mas estão em andamento.

Sugerir correcção
Comentar