Grécia está longe de alcançar “programa coerente”, diz Lagarde

A directora-geral do FMI responde a pedido de explicações de Atenas após Wikileaks divulgar alegada transcrição de teleconferência.

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Lagarde diz que o FMI "forçará a Grécia a adoptar mais medidas de ajustamento económico" Paul J. Richards/AFP

A directora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, afirmou neste domingo que as negociações com Atenas estão ainda longe de chegar a um programa coerente.

"A minha visão das negociações é a de que estamos ainda a uma boa distância de um programa coerente que eu possa apresentar ao nosso conselho de administração", escreve Lagarde numa carta enviada ao primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras.

Lagarde respondia a um pedido de explicações de Atenas, após a WikiLeaks ter publicado no sábado uma alegada transcrição de uma teleconferência entre dois responsáveis do FMI, na qual discutem a estratégia para a Grécia aceitar mais cortes orçamentais e para levar a Alemanha a ceder a uma nova reestruturação da dívida.

O documento então divulgado por aquele portal identifica os interlocutores como o director de assuntos para a Europa do Fundo Monetário Internacional (FMI), Poul Thomsen, e a chefe da missão da instituição na Grécia, Delia Velculescu, tendo a conversa acontecido a 19 de Março último.

Na conversa, ambos os responsáveis mostram-se exasperados com o ritmo lento das negociações quanto às reformas à concretizar pelos gregos e a pouca pressão por parte das instituições e parceiros europeus, e falam sobre a estratégia a adoptar nas negociações do terceiro programa de resgate para o FMI fazer valer a sua posição.

Na carta divulgada neste domingo no site do FMI, Lagarde referiu ter já ter indicado, repetidamente, que o FMI não pode apoiar "um programa [de ajuda financeira] que não seja credível e baseado em hipóteses reais". Neste sentido, realça que a organização "forçará a Grécia a adoptar [ainda] mais medidas de ajustamento económico".

Do que se depreende das transcrições da conversa revelada este sábado, a instituição liderada por Christine Lagarde defende metas orçamentais mais exigentes, que implicam maiores cortes de despesa, como um excedente primário orçamental de cerca de 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB), e propõe um alívio da dívida grega.

Durante a conversa, Poul Thomsen lembra que, no passado, os gregos só aceitaram ceder às exigências quando "estavam prestes a ficar sem dinheiro e a entrar em incumprimento". "E isso é provavelmente o que vai acontecer de novo. E, neste caso, arrasta-se até Julho e claramente os europeus não vão ter quaisquer discussões durante o mês anterior ao Brexit", acrescentou, em referência ao referendo britânico marcado para 23 de Junho, que vai decidir sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia.

Thomsen fala ainda da reestruturação da dívida grega, que há bastante tempo o FMI defende, e da forma como levar a Alemanha a aceitá-la. "Basicamente, nós a certa altura dizemos: 'Olhe, senhora Merkel, tem um desafio e tem de pensar o que lhe traz mais custos. Ir em frente sem o FMI e, aí o Parlamento alemão irá questionar 'O FMI não participa?', ou escolher o alívio da dívida que nós pensamos que é necessário para estarmos dentro'", afirmou, citado na transcrição disponibilizada pela WikiLeaks.
Na segunda-feira são retomadas as negociações entre os credores internacionais da Grécia, após uma pausa de duas semanas, estando previsto que Delia Velculescu viajasse ainda neste domingo para a capital grega.

O terceiro programa de resgate à Grécia foi aprovado no Verão de 2015, sendo que em Janeiro deste ano o Governo grego aceitou o envolvimento do FMI. A Alemanha tem insistido na participação do FMI, uma vez que considera que esta será mais exigente com a Grécia na execução de reformas. Para aceitar estar financeiramente envolvido no resgate, no valor de 86 mil milhões de euros, o FMI – que actualmente presta assistência técnica – exige de Atenas várias reformas, nomeadamente nas pensões, mas também que a zona euro aceite a renegociação da dívida pública do país.