A duas semanas da manifestação, taxistas estão irados com proposta do Governo
PCP e Bloco de Esquerda também também criticam regras para regular plataformas como a Uber e a Cabify.
Os protestos contra a Uber subiram esta segunda-feira de tom. A decisão do Governo de avançar com regras para plataformas que permitem chamar carros com motorista deixou irados os representantes dos táxis, que acusam o Executivo de ter pactuado com uma situação ilegal e de estar, agora, a dar condições de concorrência desleal àquelas plataformas – e tudo acontece a duas semanas de uma manifestação em Lisboa.
O presidente da Federação Portuguesa de Táxis, uma das associações do sector, começa por questionar a actual situação dos carros que usam plataformas como a Uber e a Cabify. “O que se faz aos ilegais que continuam a desenvolver a actividade? O Governo tem permitido que nos últimos dois anos se pratique um crime contra a economia”, acusa Carlos Ramos, em declarações ao PÚBLICO.
Carlos Ramos argumenta que as regras delineadas pelo Governo abrem caminho a que qualquer pessoa com um carro possa fazer transporte de passageiros e nota que a lei não prevê um preço mínimo. Isto, aponta o representante dos taxistas, pode levar a que as plataformas pratiquem valores "abaixo do preço de custo para rebentar com o sector do táxi". Queixa-se também de "um estigma" em relação aos táxis e garante que estes têm posto em cima da mesa mudanças à lei para melhorar a qualidade de serviço em praças como as dos aeroportos, defendendo que os carros nestes locais tenham um limite de idade, multibanco, passem factura electrónica obrigatória e tenham um regime disciplinar mais apertado.
Já do lado da ANTRAL, outra associação de táxis, surgiu a intenção de avançar para os tribunais para pedir uma indemnização de seis milhões de euros. Florêncio Almeida, que preside àquela associação e tem sido o rosto mais visível na contestação às plataformas digitais concorrentes, afirmou que o objectivo da divulgação feita pelo Governo é mitigar o protesto agendado para 10 de Outubro, que tem o arranque previsto na zona do Parque das Nações, em Lisboa, e terminará no Parlamento.
“Isto, ao aparecer neste momento, é para nos desmobilizar do dia 10, dia da nossa grande manifestação, mas pelo contrário só nos vem dar mais força. Veio foi unir mais a nossa classe”, disse Florêncio Almeida, citado pela agência Lusa. “Estes senhores não têm contingentes, tarifas. Criaram um regime especial porque são diferentes dos outros. Se querem legalizar as plataformas, as pessoas têm de lutar com as mesmas armas. As regras têm de ser iguais para todos”, concluiu.
O Governo anunciou que pretende manter, pelo menos por ora, inalteradas as regras para os táxis e tem em cima da mesa uma série de novos requisitos para as plataformas como a Uber e a Cabify, bem como para as empresas de transporte que as usam. As plataformas terão de obter uma autorização do regulador dos transportes, que é revista periodicamente, e passam também a estar obrigadas a fazer aquilo que essencialmente já praticam, como identificar na aplicação o motorista, a viagem e o preço.
Já os carros passam a ter um limite de idade de sete anos, ficam sujeitos a inspecções anuais e terão de ter um seguro igual ao dos táxis. Serão descaracterizados, mas terão obrigatoriamente um dístico. Os motoristas terão de frequentar uma formação de 30 horas e obter uma habilitação específica.
Também o PCP e o Bloco de Esquerda, que apoiam o Governo no Parlamento, criticaram as novas regras. “Entendemos esta decisão do Governo como uma cedência às imposições e interesses das multinacionais, que confronta claramente o país e coloca em risco milhares de empregos num sector que, tendo muito para melhorar, é predominantemente de base nacional”, argumentou à Lusa o dirigente comunista Vasco Cardoso. Já o bloquista Heitor de Sousa argumentou que a proposta do Governo vai “agravar ainda mais os elementos de precariedade de trabalho que existem no sector” e criticou o facto de o diploma não estar “de qualquer forma articulado com as autarquias e os municípios que, como se sabe, são quem define o contingente de táxis que existe em cada município”.
Por seu lado, tanto a Uber (que está em Portugal desde 2014) como a Cabify (cujas operações arrancaram este ano) se congratularam com a intenção do Governo. "Tudo indica que o Governo vai fazer corresponder acções concretas às declarações que tem vindo a prestar sobre a questão da mobilidade nas cidades, indo ao encontro dos cidadãos e das suas necessidades. Importante é que as pessoas, as cidades e o ambiente beneficiem de uma legislação à medida dos tempos em que vivemos", afirmou, em comunicado, o director da Cabify em Portugal, Nuno Santos.
Na mesma linha, a Uber classificou a proposta do Governo como "um primeiro passo para que Portugal tenha um quadro regulatório moderno e transparente, alinhado com os interesses dos cidadãos portugueses e motoristas, e que contribua para cidades mais sustentáveis”.