O charme da ArcoLisboa
A feira de arte contemporânea, que junta 45 galerias portuguesas e estrangeiras na Cordoaria Nacional até domingo em Lisboa, abriu esta quarta-feira para convidados. Elogios ao espaço, às peças expostas e a expectativa de que por ali passem dez mil visitantes.
Carlos Urroz, o director espanhol da ArcoLisboa, parece descontraído e não é só porque está de fato e ténis. Está “contente” – e sorridente –, assim como a dezena de pessoas com quem falámos durante a visita para jornalistas à feira de arte contemporânea que junta 45 galerias portuguesas e estrangeiras na Cordoaria Nacional.
Durante quatro dias e até domingo – esta quarta-feira foi a visita para profissionais, como jornalistas e coleccionadores –, Lisboa vai testar, com uma organização da IFEMA, a mesma da feira congénere de Madrid, se está pronta para ter uma feira de arte contemporânea. “Há conteúdos muito bons, desde artistas latino-americanos jovens até mestres como Pistoletto ou clássicos como Torres García e Vieira da Silva”, afirma Carlos Urroz. “Gosto muito da Cordoaria, porque é um espaço histórico e cria um bom contraste entre arquitectura e arte contemporânea, o que lhe dá muito charme.” O director da ArcoLisboa não quer fazer previsões sobre o público, porque o que interessa numa primeira edição é que haja qualidade e que a inauguração seja um êxito, mas está a apontar para um número entre os oito e os dez mil visitantes. Esta também é uma estreia para a IFEMA e para a Arco, que fazem em Lisboa a sua primeira feira fora de Espanha.
Com um orçamento de um milhão de euros, e o apoio do Ministério da Cultura, da Câmara de Lisboa e do Turismo de Portugal, a feira tem uma entrada de 15 euros e um programa de debates e conferências. “Acho que está fantástica. Estou absolutamente surpreendido pela positiva”, diz o artista Vasco Araújo. “O espaço, que não é fácil, foi bem resolvido”, explica. “As peças que os galeristas trouxeram são francamente boas. Está tudo de parabéns.”
Esta feira, continua Vasco Araújo, “tem a máxima importância”, porque “o mercado da arte português é muito débil” e a Arco consegue mostrar aos coleccionadores, galeristas e profissionais que traz a Lisboa que “há arte contemporânea em Portugal, bons artistas e boas instituições”.
Quem já viu a Cordoaria ocupada pela Feira de Antiguidades, que esteve aqui no início do mês, vai encontrar um espaço muito diferente. Além de se estender por todo o edifício, a montagem optou por pôr os stands das galerias ao centro, deslocando a circulação para junto da luz natural das janelas.
A galerista Juana de Aizpuru, fundadora da ArcoMadrid e um dos membros do comité de selecção de Lisboa, diz que esta não pode ser vista como “uma Arco pequenina”, mas uma feira com um modelo diferente. A organização chama-lhe "uma feira-boutique", mas Aizpuru, que chegou a defender uma feira um pouco maior para Lisboa, lembra que é preciso resistir “ao tremendamente impressionante e caro”. “Há alguns coleccionadores que gostam de ver arte num ambiente fraternal e descontraído. Esta é uma feira pequena, sem tantas pretensões, e com obras muito boas.” A galerista espanhola acredita que Lisboa pode ser também o local onde a arte africana se encontra com a arte europeia, como Madrid é uma porta de entrada para a arte latino-americana.
Manuel Ulisses, cuja galeria Quadrado Azul está logo à entrada, também está satisfeito, embora sublinhe que mal teve tempo para ver o recinto: “É bom que haja uma feira em Portugal com uma estrutura que seja sólida e com pessoas capazes.” Para já, a única coisa sobre a qual tem dúvidas é o conceito de “artista em destaque” e o pedido da organização para que o seu nome fosse exibido na sinalética mesmo ao lado da identificação da galeria. Se na Quadrado Azul está o nome de Francisco Tropa, já Juana de Aizpuru não destacou ninguém.
A curadora Isabel Carlos, que até recentemente dirigiu o Centro de Arte Contemporânea da Gulbenkian, diz que o espaço “está com muito bom aspecto”. Só tem ainda 15 minutos de feira, mas já dá para ver que “há coisas boas”. “Sempre achei que Lisboa tinha que ter uma feira de arte. Depois de várias tentativas, é bom para Lisboa esta ligação à marca Arco.”
Entre as 45 galerias, mais de metade são estrangeiras com origem em oito países. Muitas vêm de Espanha, mas também há cinco do Brasil, como a galeria Luisa Strina, de São Paulo, que mostra sete obras de Nicolás Paris. Trazem o artista colombiano “porque quiseram retomar o momento que ele teve aqui no ano passado”, quando expôs no Museu Berardo, explica Maria Quiroga. Estão "superfelizes" por fazer a ponte com Lisboa, que pode ser um lugar para mostrar artistas de uma forma pontual.
Pedro Cera é da opinião que este espaço da Marinha podia estar um bocadinho mais cuidado, mas as suas expectativas para a feira são boas. “Se o momento que a cidade vive se puder estender à feira, penso que esta pode ser uma grande feira.” Nos últimos dois anos, apareceram clientes novos, coleccionadores estrangeiros que estão a criar raízes em Portugal e que “têm a coisa simpática de quererem a sua residência com arte portuguesa”.
Pedro Maisterra, da galeria Maisterravalbuena, que destaca a artista polaca Maria Loboda, diz que está em Lisboa para apoiar a Arco, mas também porque tem coleccionadores portugueses e conhece a cena artística portuguesa. Esta jovem galeria espanhola faz a ArcoMadrid há oito anos e o circuito das feiras internacionais mais conhecidas, como a Frieze e Basel.
Está mesmo ao lado da galeria Vera Cortês, que traz cerca de 15 peças. Uma delas vai ficar mesmo sobre a secretária onde está sentado o pessoal da galeria, três ovos estrelados feitos em silicone e resina de Gonçalo Barreiros, o artista em destaque. Outra, de tão subtil, mal se vê sobre o branco da parede: Simbiose, de Joana Escoval, é um fio de cobre com uma pena de periquito.
À hora que saímos eram esperados 60 coleccionadores. Depois vinham os políticos, que, como diz Carlos Urroz, também são importantes nas inaugurações.
Nesta quinta-feira, no fórum de discussão que acompanha a feira, haverá um debate conduzido pelo curador Miguel von Hafe, às 16h, sob o tema “Da colecção privada à apresentação pública”, com os coleccionadores Miguel Leal Rios, Frédéric de Goldschmidt e Julia Mullié. Às 18h, discute-se o artista como curador com a moderação de Julião Sarmento e a participação de Elmgreen & Dragset, Paulo Mendes e Delfim Sardo.
No programa paralelo, assinala-se no Pavilhão Branco Myse en Abyme, uma exposição de Eduardo Batarda comissariada por Julião Sarmento. Um programa feito a pensar nos mais de 100 convidados de 27 países, entre coleccionadores, directores de museus, comissários e outros profissionais do mundo da arte.