Uma nova Serralves em Famalicão?
Constituir-se como uma "nova Gulbenkian" ou "uma espécie de Serralves II" é a ambição da Fundação Cupertino de Miranda, que pretende construir um novo espaço, a projectar por Eduardo Souto Moura, onde ficará o Centro de Estudos do Surrealismo. A inauguração, ontem, da exposição antológica da obra de Cruzeiro Seixas, foi o primeiro passo.
"Começar tudo de novo". Este parece ser o lema do Conselho de Administração (CA) da Fundação Cupertino de Miranda que está a estudar a hipótese de vender a actual sede (mesmo no centro da cidade de Famalicão e onde esta tarde é inaugurada uma exposição de homenagem a Cruzeiro Seixas - ver suplemento Mil Folhas no PÚBLICO de ontem - e construir um novo edifício, maior e melhor preparado para servir os propósitos da instituição. O projecto está a ser discutido no CA e tem recebido os maiores elogios por parte de todos os directores da fundação criada pelo banqueiro Artur Cupertino de Miranda, mas conta com um carinho especial por parte dos empresários que têm assento no seu órgão gestor. A câmara de Famalicão até já apontou um terreno no Parque da Devesa para alojar o novo espaço. "Seria uma espécie de 'Serralves II', um pólo cultural capaz de competir com Lisboa e Porto", disse ao PÚBLICO Agostinho Fernandes, o presidente da autarquia e também um dos membros do CA. A ideia é partilhada por José Peixoto, o presidente do CA que como único entrave ao avanço do projecto aponta a falta de dinheiro. "É uma realidade indiscutível que o edifício actual já não satisfaz as exigências", diz ainda Peixoto, garantindo estar consciente de que os três pisos que servem de sede à fundação não são "práticos" e não convidam os visitantes a entrar. A nova sede, segundo os "herdeiros" de Cupertino de Miranda, deveria ser construída por um arquitecto que, por si só, atraísse visitantes. O edifício para além de espaço para os serviços da fundação e para exposições, deveria ter ainda um local específico para o Museu do Surrealismo. Assim sendo, acabariam as dúvidas sobre a adaptação ou não de um antigo palacete no centro da cidade famalicense para esse efeito. A autarquia local já disponibilizou o Edifício Malheiro para alojar a colecção de surrealismo e o arquitecto Eduardo Souto de Moura já fez um ante-projecto. Só que a ideia inicial de restaurar o edifício teve que ser posta de lado, tal é o seu estado de degradação. Em vez disso, serão precisos cerca de trezentos mil contos para levantar o museu. E a verba elevada é outra das razões que faz os responsáveis pela fundação pensarem numa solução alternativa, "muito mais abrangente e moderna". Quanto ao dinheiro para a nova sede, parece não haver dúvidas de que seria conseguido através da venda do actual espaço. Ao que o PÚBLICO apurou, há já várias instituições bancárias e até uma multinacional interessadas em adquirir o edifício. De resto, a venda de algum do espólio artístico poderá ser também um dos caminhos a seguir.O antigo Colégio dos Maristas, na Avenida da Boavista, no Porto, é a mais "intensa" dor de cabeça dos membros do CA da Fundação Cupertino de Miranda. A casa, comprada há três anos pelo anterior presidente da administração, precisa de obras urgentes. Os arquitectos António Portugal e Manuel Reis elaboraram já um projecto de restauro, mas o facto de a câmara do Porto ter classificado o imóvel como de interesse concelhio obriga a cuidados redobrados. "O Estado tem que ajudar a pagar as obras", refere José Peixoto, que, sem apoio estatal ou comunitário, não vê forma de conseguir pagar o restauro do antigo colégio. Embora o espaço esteja a valorizar-se, Peixoto garante que a sede da fundação "nunca sairá da cidade escolhida por Cupertino de Miranda", ou seja, de Famalicão. Sem dinheiro para as obras e com vontade de investir no concelho famalicense, parece certo que o antigo Colégio dos Maristas poderá ser vendido a médio prazo. Esta seria, aliás, uma outra forma de financiar o novo espaço que deverá ser erigido no Parque da Devesa. "É preciso ver as coisas com futuro", disse ainda o presidente da câmara de Famalicão, garantindo "tudo fazer" para que a sede da fundação permaneça na terra natal de Cupertino. A decisão sobre o avanço da construção daquilo a que também já chamam "uma nova Gulbenkian" deverá ser tomada em breve. O único "travão" poderá ser apenas o da família do banqueiro, que ainda há bem pouco tempo acusou José Peixoto e os restantes membros da administração de terem feito "um assalto ao poder". Os herdeiros naturais de Cupertino de Miranda queixam-se de terem sido afastados da liderança da fundação e, segundo fonte da família, tudo farão para que "o património não seja delapidado".