Este cientista climático recusou-se a viajar de avião e foi despedido. Agora ganhou o processo e 75 mil euros

Após ordens para regressar da Papuásia-Nova Guiné de avião, Gianluca Grimalda insistiu na sua “viagem lenta” e foi demitido.

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O italiano Gianluca Grimalda, investigador na área do clima, não deixou de lado os seus princípios numa das suas últimas viagens profissionais — e foi por se recusar a viajar de avião no regresso a casa que acabou despedido. No entanto, o processo que se seguiu rendeu-lhe uma indemnização de 75 mil euros que pretende doar para causas ambientais e activismo climático.

Aconteceu em 2023, numa altura em que Grimalda estava a conduzir trabalho de campo na região de Bougainville, parte de Papuásia-Nova Guiné, na Oceânia. Nessa altura, o investigador tinha um contrato de investigação com o Instituto de Economia Mundial de Kiel, sediado na Alemanha. E fez a viagem até à Papuásia-Nova Guiné guiado pelos seus princípios: demorou 35 dias, em opções de transportes mais sustentáveis do que o avião, como comboios ou autocarros.

Esta forma de viajar foi inicialmente aprovada pela entidade empregadora. No entanto, o problema aconteceu na hora de voltar. Grimalda não foi capaz de regressar a Kiel na data combinada, cinco dias depois de ter sido notificado. A viagem de regresso devia demorar dois meses; no entanto atrasou-se devido a “adiamentos de visto, ameaças à segurança, actividades vulcânicas e outros problemas logísticos”, descreve Grimalda à Euronews.

O cientista descreveu o percurso num artigo de opinião publicado no britânico The Guardian em Outubro de 2023: “Este fim-de-semana, vou embarcar num cargueiro para regressar à Alemanha, viajando até East New Britain, na Papuásia-Nova Guiné. A partir daí, percorrerei a distância restante até à Europa num navio de carga, ferry, comboio e autocarro”.​

De acordo com os seus cálculos, se tivesse feito o percurso de 28.000 quilómetros que separam a Europa da Oceânia de avião, teria emitido cerca de dez vezes mais gases de efeito estufa do que durante a sua "viagem lenta" — algo moralmente inaceitável para si, escreveu no mesmo artigo de opinião.

Por se recusar a voltar de avião, o instituto rescindiu o seu contrato de investigação em Outubro desse ano. ​. "Um preço que valeu a pena pagar", escreveu em 2023 no The Guardian. ​

A rescisão desencadeou um processo, uma vez que Grimalda entendeu ter sido despedido injustamente. Agora, chegou a acordo com o ex-empregador: uma indemnização de 75 mil euros.

O investigador diz estar “triste e feliz ao mesmo tempo” com o acordo: triste porque perdeu um emprego que adorava, mas feliz porque o juiz “reconheceu a impossibilidade de demitir um funcionário” por se recusar a viajar de avião.

Espera que este momento da sua vida "inspire mais funcionários, instituições e empresas a apoiar activamente a transição de economias baseadas em combustíveis fósseis para sociedades descarbonizadas e centradas nas pessoas”, sublinha.

O advogado de Grimalda, Jörn A. Broschat, destaca que este caso, o primeiro conhecido deste género, “representa um marco na discussão emergente sobre os direitos dos trabalhadores de defender os seus princípios climáticos como parte das suas obrigações profissionais”, cita a Euronews. E acrescenta: “Este é apenas a primeira de inúmeras decisões que abordarão a complexa interacção entre as mudanças climáticas e os interesses dos empregados e empregadores”.

Quanto ao futuro de Grimalda, a Papuásia-Nova Guiné continua no seu mapa. Este ano, planeia voltar para aquela região, com o intuito de continuar a sua investigação junto da população local para compreender de que forma a comunidade se está a adaptar às alterações climáticas.

Texto editado por Inês Chaíça

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