Público Brasil Histórias e notícias para a comunidade brasileira que vive ou quer viver em Portugal.
Governo contrata apenas um terço dos advogados para destravar processos de imigrantes
A meta era chamar 300 advogados e solicitadores, mas, até agora, apenas 100 foram convocados, dificultando os trabalhos de análise dos cerca de 450 mil processos pendentes na AIMA.
Os artigos da equipa do PÚBLICO Brasil são escritos na variante da língua portuguesa usada no Brasil.
Acesso gratuito: descarregue a aplicação PÚBLICO Brasil em Android ou iOS.
O Governo de Portugal contratou apenas um terço dos advogados e solicitadores que havia prometido para ajudar na análise dos cerca de 450 mil processos de pedidos de residência que estão encalhados na Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA). Dados repassados ao PÚBLICO Brasil pela Ordem dos Advogados apontam que, até agora, foram chamados apenas 100 profissionais de um total de 300 previstos. A promessa, agora, é de que outros 200 sejam contratados até o fim de janeiro. Eles terão de concluir todo o trabalho até o final de maio.
Segundo a Ordem, essas informações foram repassadas à instituição pela AIMA. O PÚBLICO Brasil já havia mostrado que, por conta da demora na contratação de advogados e solicitadores, o trabalho de regularização dos imigrantes está pela metade. Há um bom fluxo de atendimento dos cidadãos nos 20 centros de missão (força-tarefa) criados pelo Governo — a capacidade é de até 6 mil pessoas por dia —, mas, a partir dali, poucos processos têm andado, pois falta gente para fazer a segunda etapa da checagem das informações.
Essa é a razão, no entender das advogadas Catarina Zuccaro e Tatiana Kazan, de a maior parte das pessoas que passaram pelos centros de missão não terem recebido os cartões de residência até agora. Para elas, seria muito importante que a AIMA concluísse todo o processo de regularização dos imigrantes, pois, sem os documentos oficiais, eles continuam em situação de vulnerabilidade, sem acesso a serviços básicos como saúde e educação e no subemprego, além de ficarem confinados em Portugal, pois não podem transitar por outros países. Por lei, os cartões de residência devem ser entregues em até 90 dias.
Na opinião do advogado Bruno Gutman, diante do atraso na contratação dos profissionais que farão a análise final dos processos de imigrantes, dificilmente o Governo conseguirá cumprir o prazo de zerar os 450 mil processos até 30 de junho deste ano. “Acho quase impossível que esse prazo seja cumprido. Certamente, terão de postergá-lo”, ressalta. “É questão de matemática”, complementa o também advogado Fábio Pimentel. “Como solicitadores e advogados só poderão, cada um, avaliar no máximo 200 processos por mês, supondo que cada um dos 300 atinja essa meta, serão 60 mil processos mensais. Em quatro meses, de fevereiro a maio, 240 mil processos terão sido analisados”, calcula.
Política de Estado
Para Pimentel, um dos fatores que mais pesaram para a contratação de advogados e solicitadores pela AIMA foi o valor definido para cada processo avaliado: 7,50 euros (R$ 48). “É muito pouco”, afirma. “Esse valor chega a ser aviltante, sobretudo porque o trabalho que foi proposto deveria ser realizado pelo Estado, não por agentes privados”, acrescenta. Na visão dele, o Governo deveria ter se estruturado de outra forma, fazendo concursos públicos, preenchendo as vagas de milhares de servidores que têm se aposentado ano após ano.
Gutmam destaca que, além do valor irrisório que foi oferecido para advogados e solicitadores, não haverá tempo suficiente para o preparo adequados dos profissionais para lidar com processos tão complexos, que envolvem a vida de pessoas que buscam se regularizar em Portugal. “O anúncio da contratação desses agentes foi feito em setembro do ano passado. Por que só agora a AIMA promete correr para resolver a questão? Isso mostra o despreparo da gestão da agência e um desrespeito aos que dela dependem”, assinala. Procurada, a AIMA não se manifestou.
Diante desse quadro, reforça Pimentel, o que se vê é que Portugal ainda não entendeu a importância de a imigração ser uma política de Estado, tamanho o impacto que tem para a economia do país. Bruno Gutman acrescenta que não se pode colocar a ideologia à frente do direito de pessoas de exercerem a plena cidadania. “Portugal tem incentivado a vinda de imigrantes. Portanto, o mínimo que o país pode fazer é dar dignidade para aqueles que atendem ao chamado e têm sido peças fundamentais para os mais diversos setores da economia. A política migratória deve ser de Estado, não do governo de plantão”, emenda.