Supremo Tribunal céptico em relação a argumentos do TikTok contra proibição nos EUA
Juiz conservador aventou possibilidade de tribunal emitir suspensão administrativa que suspenderia temporariamente a lei enquanto os juízes decidem como proceder, algo que também é pedido pelo TikTok.
Os juízes do Supremo Tribunal dos Estados Unidos mostraram-se esta sexta-feira, 10 de Janeiro, cépticos em relação a uma contestação do TikTok e da sua empresa-mãe, a chinesa ByteDance, a uma lei que obrigaria à venda ou proibição da aplicação até 19 de Janeiro no país, num caso que opõe os direitos à liberdade de expressão às preocupações com a segurança nacional norte-americana.
O TikTok e a ByteDance, bem como muitos utilizadores que publicam conteúdos na aplicação, contestaram a lei aprovada pelo Congresso norte-americano (com forte apoio bipartidário) no ano passado e assinada pelo Presidente democrata cessante, Joe Biden.
Durante cerca de duas horas e meia de argumentação, alguns dos juízes pareceram reconhecer as preocupações com a segurança nacional apresentadas pelo Congresso — que acredita que a aplicação permitiria ao Governo da China espiar os norte-americanos e levar a cabo operações secretas de influência. Mas alguns dos juízes também manifestaram preocupações quanto às implicações da lei para a liberdade de expressão.
O juiz conservador Samuel Alito aventou a possibilidade de o tribunal emitir uma suspensão administrativa que suspenderia temporariamente a lei enquanto os juízes decidem como proceder. O presidente conservador do Supremo Tribunal, John Roberts, pressionou Noel Francisco, advogado do TikTok e da ByteDance, sobre o facto de o TikTok ser propriedade de uma empresa chinesa, bem como sobre as preocupações do Congresso. "Parece-me que estão a ignorar a principal preocupação do Congresso — que era a manipulação chinesa do conteúdo", referiu.
O TikTok, a ByteDance e os utilizadores da aplicação recorreram da decisão de um tribunal de primeira instância que confirmou a lei e rejeitou o argumento de que esta viola a protecção da Primeira Emenda da Constituição dos EUA contra a restrição governamental da liberdade de expressão. A apreciação do caso pelo Supremo Tribunal ocorre numa altura de crescentes tensões comerciais entre as duas maiores economias do mundo. O republicano Donald Trump, que iniciará o seu segundo mandato como Presidente a 20 de Janeiro, opõe-se à proibição.
Noel Francisco disse aos juízes que a aplicação é uma das plataformas mais populares para os norte-americanos e que o verdadeiro alvo da lei "é o próprio discurso — esse medo de que os norte-americanos, mesmo os que estão totalmente informados, possam ser persuadidos pela desinformação chinesa". "Isso, no entanto, é uma decisão que a Primeira Emenda deixa para o povo. Em suma, este acto não deve ser mantido", afirmou Francisco sobre a lei.
O advogado também citou a posição de Trump sobre a questão. A 27 de Dezembro, Trump pediu ao Supremo Tribunal que suspendesse o prazo de 19 de Janeiro para dar à sua nova administração "a oportunidade de procurar uma resolução política das questões em causa no processo". Francisco pediu aos juízes para, no mínimo, suspenderem temporariamente a lei, "o que permitiria considerar cuidadosamente esta questão importante e, pelas razões explicadas pelo Presidente eleito, potencialmente anular o caso".
Referindo-se à ByteDance, a juíza liberal Elena Kagan disse a Francisco que a lei "visa apenas esta empresa estrangeira, que não tem direitos da Primeira Emenda". "A manipulação de conteúdos é um raciocínio baseado no conteúdo: pensamos que este Governo estrangeiro vai manipular conteúdos (...) que nos dizem respeito e que podem muito bem afectar os nossos interesses de segurança nacional. Foi exactamente isso que pensaram sobre o discurso do Partido Comunista na década de 1950, que estava a ser escrito, em grande parte, por organizações internacionais ou directamente pela União Soviética."
"Objectivos geopolíticos"
A procuradora-geral dos EUA, Elizabeth Prelogar, defendeu a decisão da administração Biden e afirmou que o controlo do TikTok pelo Governo chinês representa uma grave ameaça à segurança nacional norte-americana. O imenso conjunto de dados do TikTok sobre os seus utilizadores norte-americanos, entre outras informações, dá à China uma ferramenta poderosa para assédio, recrutamento e espionagem, disse Prelogar.
O Governo chinês "poderia usar o TikTok como arma a qualquer momento para prejudicar os Estados Unidos". Prelogar afirmou que a Primeira Emenda não impede o Congresso de tomar medidas para proteger os norte-americanos e os seus dados. "O prejuízo para a segurança nacional decorre do próprio facto de um adversário estrangeiro ser capaz de manipular secretamente a plataforma para fazer avançar os seus objectivos geopolíticos, independentemente da forma que este tipo de operação secreta possa assumir", afirmou a procuradora-geral.
O poderoso algoritmo da plataforma alimenta a atenção dos utilizadores com vídeos curtos adaptados aos seus gostos. O TikTok afirmou que a proibição atingiria a sua base de utilizadores, anunciantes, criadores de conteúdos e funcionários, que são cerca de 7 mil nos EUA. Prelogar disse que o prazo de 19 de Janeiro poderia finalmente forçar a ByteDance a iniciar seriamente o processo de alienação do TikTok.
Francisco explicou ao juiz conservador Brett Kavanaugh que a 19 de Janeiro, "pelo menos como eu entendo, nós (TikTok) ficamos às escuras". "Essencialmente, a plataforma fecha a menos que haja um passo atrás, a menos que o Presidente Trump exerça a autoridade para estendê-lo", apontou. Mas Trump não poderá fazer tal coisa a 19 de Janeiro porque só assume o cargo no dia seguinte. "É possível que, a 20, 21 ou 22 de Janeiro, estejamos num mundo diferente", acrescentou Francisco, que considerou ser esta uma das razões pelas quais os juízes deveriam decretar uma pausa temporária na lei para "dar a todos um pouco de espaço para respirar".
O advogado do TikTok sublinhou o impacto de permitir que o Congresso proíba o TikTok, o que significa que o Governo poderia simplesmente dizer: "Vou encerrar o TikTok porque é demasiado pró-republicano ou demasiado pró-democrata, ou não vai disseminar o discurso que quero. Não pode ser este o caso", referiu.