Os incêndios florestais que estão a devastar a paisagem árida de Los Angeles, no estado norte-americano da Califórnia, são o mais recente exemplo de fenómenos climáticos extremos, que deverão acontecer com mais frequência à medida que as temperaturas globais continuarem a subir, alertam cientistas.
Fora da época tradicional dos incêndios florestais, os fogos da Califórnia propagaram-se rapidamente na quarta-feira e já causaram cinco mortes. Os cientistas sublinham que os incêndios passaram a ser um risco para todo o ano. Nos últimos anos, o estado da Califórnia, nos EUA, tem vindo a registar incêndios cada vez mais intensos, com uma maior área ardida devido às condições de seca e às alterações das tendências meteorológicas.
“As alterações climáticas estão a remodelar os regimes e os padrões característicos dos incêndios florestais numa região”, disse Kimberley Simpson, investigadora da Escola de Biociências da Universidade de Sheffield, no Reino Unido.
Poucas horas depois de os alertas meteorológicos terem avisado sobre ventos extremos e condições de seca na área de Los Angeles na noite de terça-feira, partes da icónica cidade no meio do deserto já estavam em chamas. As faíscas saltavam das estradas e incendiavam os telhados. As palmeiras ardiam como palitos de fósforo. Na quarta-feira de manhã, dezenas de milhares de pessoas fugiam das suas casas enquanto os incêndios ardiam fora de controlo.
Ventos anormalmente fortes
A cidade Los Angeles, que se estende num canto do deserto do sul da Califórnia, não é estranha aos ventos selvagens e ao tempo quente e seco, com os seus famosos ventos de Santa Ana a soprarem com frequência ao longo da paisagem, em direcção à costa. Em condições de Inverno seco, não é invulgar a ocorrência de ventos rápidos, explica Brent Walker, do Met Office, o serviço meteorológico britânico.
Só que o fenómeno atmosférico que está a alimentar os actuais incêndios de Los Angeles não cumpre o movimento típico de descida dos ventos de Santa Ana. Em vez disso, os ventos anormalmente fortes estão a soprar na parte de trás de um sistema de tempestade sobre o vale inferior do rio Colorado e a ser amplificados, pelo que os cientistas chamam um fenómeno de “onda de montanha”.
As tempestades de neve desta semana nas montanhas de San Bernardino, a cerca de 100 quilómetros de Los Angeles, também podem estar a contribuir para a dinâmica regional do vento. Enquanto isso, os meteorologistas da área esperam uma ocorrência de ventos de Santa Ana no final desta semana.
Onda de montanha
O fenómeno de onda de montanha ocorre quando há uma conjugação de temperaturas acima de uma cadeia de montanhas e ventos específicos que passam por cima dessas montanhas. “Quando estas condições se alinham na perfeição, o fenómeno comporta-se como uma onda no oceano, quando os ventos passam por cima das montanhas e depois se abatem do outro lado”, explica o cientista Paul Schlatter do Serviço Nacional de Meteorologia dos EUA (NWS, na sigla em inglês) em Boulder, no estado do Colorado.
“A força desses ventos (do sistema de tempestades) e um pequeno aumento da onda da montanha é o que realmente está a alimentar estes incêndios”, acrescentou o cientista.
Uma onda de montanha semelhante ocorreu em torno do incêndio Marshall, que deflagrou no estado de Colorado a 30 de Dezembro de 2021, que foi alimentado por ventos descendentes com rajadas de até 185 quilómetros por hora e destruiu milhares de casas e empresas. Acabou por ser extinto pela queda de neve na noite seguinte, mas tornou-se o incêndio mais destrutivo da história do estado.
“Qualquer incêndio nestas condições ficará rapidamente fora de controlo”, afirmou Schlatter.
Casas vulneráveis e combustíveis naturais
Antes dos incêndios, o serviço de meteorologia emitiu vários alertas para a região densamente povoada de Los Angeles, avisando do risco de incêndio e dos “combustíveis criticamente secos”, o que significa que a paisagem árida de arbustos, palmeiras, gramíneas e madeiras duras estava pronta a arder.
Como a temperatura média da Califórnia aqueceu cerca de 1°C desde 1980, o número de dias com vegetação seca - vulnerável ao fogo - duplicou, explica Lindon Pronto, especialista em gestão de incêndios do Instituto Europeu das Florestas. “Por fim, temos um efeito de acumulação em que se assiste a um comportamento muito mais extremo dos incêndios em diferentes alturas do ano... mesmo que seja em Dezembro ou Janeiro”, afirma.
Para além do chaparral e dos eucaliptos, a paisagem urbana densamente povoada de Los Angeles também inclui material inflamável com cabos eléctricos pendurados, postes telefónicos de madeira e casas construídas com madeira, de acordo com os códigos anti-sísmicos.
A construção em madeira foi também um factor importante na rápida propagação do incêndio de 2023 na cidade histórica de Lahaina, no Havai, e na destruição massiva que se seguiu.
Os cientistas alertaram para outros perigos associados aos incêndios, como o risco de derrocadas em encostas íngremes após a queima da vegetação ou a explosão de tanques de gás propano, linhas de gás ou outros materiais perigosos à medida que o fogo se desloca para as zonas industriais ou espaços de arrumos das habitações. “Há uma enorme quantidade de materiais perigosos em todas estas casas que estão a arder”, concluiu Lindon Pronto.