Tribunais sem autonomia financeira perdem independência, avisa presidente do Supremo
Tribunal da Relação de Lisboa tem um novo presidente, o juiz Carlos Castelo Branco, que na sua tomada de posse criticou falta de meios no sector da justiça.
O aviso deixado pelo presidente do Conselho Superior da Magistratura, o juiz conselheiro João Cura Mariano, na cerimónia da tomada de posse do juiz desembargador Carlos Castelo Branco como presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, soou alto e claro: sem autonomia financeira, os tribunais da Relação têm uma gestão limitada, que coloca "perigosamente em causa uma verdadeira independência do funcionamento do poder judicial".
O também presidente do Supremo Tribunal de Justiça fez igualmente várias críticas ao actual estado da justiça, lembrando que "incompreensivelmente, a presidência dos Tribunais da Relação não dispõe de um gabinete administrativo e jurídico".
O juiz desembargador Carlos Castelo Branco, por seu turno, criticou a falta de meios na justiça, pedindo uma "verdadeira reforma" nos tribunais. "Não queremos ser um órgão de soberania de segunda linha", disse. No seu discurso de posse, o desembargador sublinhou que "o sistema de justiça, na esfera dos tribunais, precisa de uma verdadeira reforma".
"Quem conhece os tribunais por dentro percebe que os grandes problemas - a falta de juízes, a falta de funcionários, a falta de meios, a falta de apoio, a falta de condições de trabalho, a carga processual excessiva - são frequentes e estão sinalizados há muito", observou.
Em relação à falta de recursos humanos, o novo presidente do Tribunal da Relação de Lisboa adiantou que se assiste, há anos, à saída de magistrados e de funcionários judiciais e que há cada vez mais jubilações. Neste tribunal, por exemplo, jubilaram-se, desde Setembro passado, mais de uma dezena de juízes desembargadores. E no Supremo Tribunal de Justiça "quase 90% dos juízes conselheiros podem deixar o tribunal no próximo ano", acrescentou Carlos Castelo Branco.
A acrescentar à falta de trabalhadores, foi também apontado "o excesso de trabalho, a ausência de assessoria de apoio, a sobrecarga de distribuição e a exposição mediática de alguns processos", que são fonte de desmotivação e ansiedade. As críticas estenderam-se ainda às condições de trabalho, com o novo presidente a sublinhar que "os edifícios dos tribunais apresentam deficiências e desadequações decorrentes de décadas de inacção, assentes na ausência de meios ou na má gestão desses meios".
Natural de Lisboa, Carlos Castelo Branco licenciou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, em 1993, tendo depois ingressado no XIII Curso Normal de Formação de Magistrados do Centro de Estudos Judiciários. Fez o estágio em Cascais, em 1996 e 1997, passando no último ano a juiz de direito auxiliar do 2.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa. Exerceu também em Coruche e Almada.
Entre 2014 e 2016, foi adjunto do gabinete do vice-presidente e membro do Conselho Superior da Magistratura, em acumulação de serviço. Mais tarde, desempenhou as funções de juiz secretário do Conselho Superior da Magistratura, tendo-se tornado vice-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa há perto de um ano.