Martim Moniz: queixa sobre acção policial entregue à provedora de Justiça
Deputados do PS, BE e Livre estiveram presentes no momento da entrega, mas apenas os representantes dos movimentos cívicos falaram aos jornalistas.
Uma queixa sobre a actuação da PSP na operação realizada no Martim Moniz, em Lisboa, a 19 de Dezembro último, foi entregue esta manhã à provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral. Filipa Bolotinha, responsável da Associação Renovar a Mouraria, entregou a queixa acompanhada por alguns deputados, como Isabel Moreira e Eurico Brilhante Dias, do PS, Isabel Mendes Lopes, do Livre, ou Joana Mortágua, do Bloco de Esquerda. Segundo Bolotinha, o objectivo da queixa, que somou 700 assinaturas, é “averiguar e apurar a legitimidade e proporcionalidade” da actuação policial.
Filipa Bolotinha explicou que os signatários querem “garantir que a queixa interna não disciplinar da IGAI siga o seu processo o mais rapidamente possível e que este assunto não seja esquecido, porque a rua é de pessoas reais que vivem e trabalham lá, e não foi só nesse dia que houve uma acção discriminatória”. Agora, com a queixa, os signatários esperam que seja elaborado um parecer e que o assunto seja levado à Assembleia da República.
A responsável e moradora na rua que foi alvo da acção policial relatou ainda que, nesse dia, viu “pessoas portuguesas que passaram naquela rua e não foram encostadas à parede”. “A rua estava em total silêncio, o que não é comum. Aos portugueses, que vivem naquela rua e circundantes, foi-lhes dito para seguirem”, disse Filipa Bolotinha aos jornalistas, esta manhã.
Questionada sobre as declarações do primeiro-ministro na entrevista ao Diário de Notícias, Filipa Bolotinha respondeu: “Ainda bem que ele não gostou de ver. Não sei se não foi já resultado de alguma movimentação da sociedade civil. Não percebo é como é que no dia da operação alguém se pode congratular com algo que, no mínimo, foi falhado, porque os resultados que teve são aqueles que sabemos”, vincou a responsável da Associação Renovar a Mouraria.
“Não podemos ter num dia os telejornais a dizer que Portugal precisa de 130 mil trabalhadores imigrantes e, no dia a seguir, um discurso em que associam a imigração à insegurança, o que é falso, como se viu pelos resultados da operação”, vincou.
Filipa Bolotinha disse ainda ter existido recentemente uma acção policial semelhante na mesma zona, no interior do centro comercial do Martim Moniz. “Não há fotos porque é um espaço fechado”, declarou.
Acção policial gerou medo
Também o presidente da Casa da Índia pediu “dignidade humana e respeito pelos direitos humanos” e considerou que ambos “foram gravemente violados” no decorrer da acção policial.
“Todas as pessoas que foram encostadas à parede vão ficar com esta imagem para a vida toda. Este trauma vai ficar no pensamento daquelas pessoas para a vida toda e isso é inadmissível”, apontou Shiv Kumar Singh, para quem esta é uma situação que as democracias não podem permitir que aconteça. Aos jornalistas, Shiv Kumar Singh disse ter conhecimento de casos de imigrantes, particularmente asiáticos, que estarão agora a evitar circular naquela zona da cidade de Lisboa, pelo medo de a qualquer momento serem alvo de uma rusga policial.
No texto da queixa, os promotores lembram que a operação incluiu a revista de dezenas de cidadãos encostados à parede, “perfilados e de mãos levantadas, sem qualquer indicação de suspeita de prática de crimes”.
“Tal actuação configura, a nosso ver, uma utilização de meios desproporcionais em relação aos fins anunciados: a forma como a operação foi conduzida fere o princípio da proporcionalidade previsto no artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa e também os direitos fundamentais à dignidade da pessoa humana e à presunção de inocência”, consideram.
O texto defende que o que aconteceu no dia 19 de Dezembro foi uma “actuação desnecessária e humilhante” por parte da PSP e que, “a justificar-se uma intervenção na zona, esta nunca pode implicar uma actuação simbólica e individualmente vexante, quando a PSP tem ao seu dispor outros meios de actuação proporcionais e adequados”.
Entre os subscritores da queixa estão a deputada Joana Mortágua (BE), a deputada e ex-ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social Ana Mendes Godinho (PS), o encenador Tiago Rodrigues, o deputado e sociólogo historiador José Soeiro (BE), a promotora musical Maria Escaja e a líder parlamentar do Livre, Isabel Mendes Lopes.
Para o próximo dia 11 de Janeiro está agendada uma manifestação que descerá a Avenida Almirante Reis, em direcção ao Martim Moniz, em Lisboa. com Lusa