Em volte-face, Israel admite que deteve o director do hospital Kamal Adwan
O Estado hebraico tinha inicialmente negado ter levado Hussam Abu Safiya do Norte da Faixa de Gaza. Agora diz que ele era comandante do Hamas.
O desaparecimento de Hussam Abu Safiya, director do hospital Kamal Adwan, no Norte da Faixa de Gaza, depois do final do ataque que retirou todos os funcionários e pacientes da unidade de saúde, deixando-a totalmente inoperacional, causou pressão sobre Israel, com pedidos de esclarecimento sobre o que tinha acontecido vindos de organizações das Nações Unidas ou da Amnistia Internacional.
Também nas redes sociais ganhou relevância uma campanha a pedir a libertação do médico, repetindo a que se pensa ser a última imagem de Abu Safiya num vídeo da emissora Al-Jazeera, em que se vê um homem de bata branca no meio de escombros a dirigir-se para um carro de combate israelita.
O Exército de Israel tinha afirmado, no final do ataque ao hospital, há cerca de uma semana, que tinha detido Abu Safiya mas esta quinta-feira declarou que não tinha qualquer “indicação” de este estar detido. No dia seguinte, já disse que o director do hospital estava detido pelo Shin Bet, a agência de informação e segurança interna, sem dar mais pormenores.
O director-geral da Organização Mundial de Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, voltou a pedir a libertação de Abu Safiya, lamentando que Israel não tenha dado qualquer resposta sobre “a segurança e bem-estar” do médico.
A secretária-geral da Amnistia Internacional. Agnès Callamard, recordou que o hospital Kamal Adwan já tinha sido alvo de uma operação militar israelita em Dezembro de 2003, e que, nessa altur,a Hussam Abu Safiya tinha sido interrogado e “nem uma fonte israelita acusou o Dr. Hussam de alguma coisa”.
Callamard considerou que Abu Safiya deve ser considerado vítima de “desaparecimento forçado”. Recordou ainda que nenhum médico ou funcionário do sistema de saúde levados de Gaza pelas forças israelitas desde Novembro de 2023 foi acusado ou presente a julgamento, e que os que foram entretanto libertados sofreram, antes, tortura durante a sua detenção.
A mais recente detenção “é emblemática dos ataques ao sector da saúde e das tentativas de o destruir”, escreveu ainda Callalard, algo que faz parte da “intenção genocida de Israel”: a Amnistia acusou, num relatório divulgado a 5 de Dezembro, Israel de estar a levar a cabo um genocídio na Faixa de Gaza.
Numa carta publicada nas redes sociais, o embaixador de Israel à ONU em Genebra, Daniel Meron, afirmou que a operação militar no hospital Kamal Adwan foi motivada por “provas irrefutáveis” da presença de combatentes do Hamas e da Jihad Islâmica na unidade de saúde.
Mas o destinatário da missiva, o alto comissário da ONU para os direitos humanos, Volker Türk, afirmou que Israel “não fundamentou muitas destas alegações” e que além de “vagas e genéricas” parecem, “em alguns casos, contrariadas por informações que estão disponíveis publicamente”.
Dois relatores especiais da ONU, Tlaleng Mofokeng e Francesca Albanese, expressaram “grande preocupação” com a situação de Abu Safiya, dizendo que “o ataque de Israel ao direito à saúde em Gaza e no resto do território palestiniano ocupado chegou a novos níveis de impunidade.”
Durante o cerco ao hospital, e ao Norte da Faixa em geral, Abu Safiya foi uma voz de denúncia dos efeitos dos ataques com vídeos frequentes nas redes sociais. O seu filho foi morto num ataque israelita ao hospital, e ele próprio tinha sido ferido num ataque.
Os relatores Mofokeng e Albanese sublinharam que morreram mais de 1057 médicos e profissionais de saúde na Faixa de Gaza e muitos foram detidos. No final de Setembro de 2024, a ONU disse ter provas da morte de pelo menos três médicos durante a sua detenção por Israel.