Bragança e Vinhais contra prospecção de metais na região

Municípios aprovam pareceres políticos desfavoráveis à prospeção mineira em áreas protegidas, mas não travaram pedidos na fase de consulta pública. ICNF emitiu parecer desfavorável.

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A aldeia de Tuizelo, em Vinhais, fica dentro da área área protegida do Parque Natural de Montesinho Tiago Bernardo Lopes
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A Assembleia Municipal de Bragança aprovou, por maioria, uma moção contra os pedidos de prospecção mineira que abrangem o distrito de Bragança, "indo ao encontro do sentimento das populações e posição tomada pelas Juntas e Uniões de Freguesia". Na moção, aprovada em 13 de Dezembro e divulgada a 30 de Dezembro pela autarquia, lê-se que a Assembleia Municipal de Bragança decide "discordar totalmente, dando o seu parecer desfavorável à atribuição dos direitos de prospecção e pesquisa".

Em Novembro, a câmara municipal de Bragança tinha emitido um parecer desfavorável ao pedido de prospecção mineira. A 31 de Outubro, também o município de Vinhais tinha deliberado, em reunião de câmara um parecer desfavorável aos pedidos de prospecção. Estas tomadas de posição política, no entanto, não são vinculativas no processo.

No âmbito da consulta da Direcção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), antes do período de consulta pública, ​a Câmara de Vinhais tinha emitido um parecer favorável à prospecção com base na sua análise do PDM, e a câmara de Bragança não chegou a pronunciar-se formalmente durante o processo. Segundo a lei das minas, relembram os cidadãos do movimento Uivo, “os pareceres das Câmaras são vinculativos na fase de prospecção” - mas nenhuma travou os pedidos na consulta formal, justificando-se com questões técnicas.

Prospecção no Parque de Montesinho

O pedido de prospecção e pesquisa foi feito por uma empresa privada, a GMR Consultores, com sede em Braga, para prospecção e pesquisa de depósitos minerais metálicos de níquel, cobalto, cobre e platinóides, no projecto denominado "Valongo 2", numa área de 105 quilómetros quadrados, em seis freguesias do concelho de Bragança e cinco do concelho de Vinhais. Há ainda mais dois pedidos de prospecção que abrangem os concelhos de Bragança e Vinhais, denominados "Revelhe" e "Castrelos".

Parte das áreas incluídas no pedido fazem parte da Reserva da Biosfera Transfronteiriça da Meseta Ibérica, reconhecida pela UNESCO, da Rede Natura 2000 e onde está a maior mancha de carvalho negral do país e da Europa, abrangendo a área protegida do Parque Natural de Montesinho.

O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) emitiu um parecer desfavorável aos pedidos logo na fase inicial do processo.

Histórico de exploração mineira

A moção da assembleia municipal refere que, apesar de se compreender ser importante para o país o mapeamento de depósitos minerais, para cumprir as orientações europeias de descarbonização e da transição energética, entende-se que deve salvaguardar territórios de elevado valor paisagístico e ambiental, classificados pela legislação.

No documento, lê-se ainda que se considera que "seria correcto e de maior confiança que em sessões de esclarecimento às populações estivessem presentes técnicos de agências estatais e não de empresas privadas". A moção foi proposta por Adriano Augusto Correia Rodrigues, representante das juntas e uniões de freguesias de concelho de Bragança.

A declaração escrita invoca ainda o "histórico de exploração mineira no concelho", em Portelo, Paredes e Coelhoso, onde, "à semelhança do que acontece também um pouco pelo país", é perceptível que "as empresas, ao longo de anos, recolhem os benefícios da exploração, deixando os problemas para as populações".

Também a população local se tem manifestado contra os pedidos de prospecção mineira. "Estes pedidos ameaçam a conservação de valores naturais e colocam em causa o desenvolvimento num ambiente que se pretende sustentável e compatível com o património e o modo de vida dos habitantes de Trás-os-Montes", lê-se num comunicado do movimento Uivo, criado em 2020 com o objectivo de manter a Reserva da Biosfera Meseta Ibérica livre de minas.

"Temos aqui a nossa água da Serra da Nogueira"

A última sessão de esclarecimento pública obrigatória nas freguesias do concelho de Bragança aconteceu a 22 de Novembro, na aldeia de Carrazedo.

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Tiago Bernardo Lopes

Noutra das sessões, na freguesia de Nogueira, à qual a Lusa assistiu, e em que marcaram presença cerca de 50 pessoas, foi referido por parte dos representantes da empresa que "não é possível entrar nos terrenos de ninguém se as pessoas não derem o seu expresso consentimento" e que, por isso, "contra a vontade das pessoas não se avança com o projecto".

“As pessoas todas estão contra estas prospecções porque atrás disto pode vir a exploração mineira. Nós temos aqui o nosso bem-estar e a nossa água da Serra da Nogueira”, disse na terça-feira à Lusa Artur Araújo, presidente da junta de freguesia de Nogueira, no final deste encontro.

Câmara de Bragança não quer prospecção

Em Novembro, a câmara municipal de Bragança emitiu um parecer desfavorável ao pedido de prospecção mineira.

"Ouvidas várias partes interessadas e face aos contributos apresentados, a Câmara Municipal de Bragança toma a decisão de emitir, publicamente, um parecer desfavorável, apesar de não assente em fundamentação legal, por considerar que as actividades (expectáveis) subsequentes à fase de prospecção e pesquisa são totalmente incompatíveis com os valores naturais, culturais, sociais e económicos que o Município de Bragança preconiza e defende", lê-se no comunicado enviado pela câmara.

O autarca de Bragança e presidente da co-gestão do Parque Natural de Montesinho, Paulo Xavier, tinha informado no início de Novembro que estava a auscultar a população, assim como os membros da comissão da área protegida, para que o município tomasse uma posição.

Vinhais também contra

Já a 31 de Outubro, o município de Vinhais tinha deliberado em reunião de câmara, por unanimidade, um parecer também desfavorável aos pedidos de prospecção que abrangem o concelho do distrito de Bragança.

Apesar de “não existir fundamentação legal para a emissão de um parecer desfavorável, o município pretende manifestar a sua oposição no deferimento da pretensão”, lê-se na posição contra o pedido de prospecção, que foi comunicada à DGEG.

"A área proposta para a realização dos trabalhos de prospecção e pesquisa e, futuramente, de exploração, irão impactar negativamente no território e nas pessoas, na medida em que vão colidir directamente com a preservação e a conservação da natureza, com a salvaguarda dos valores culturais e com actividades económicas que importa valorizar e fomentar, designadamente o turismo, a agricultura, a apicultura, a cinegética, entre outras", fundamenta o município.