Mais de 130 interrupções de gravidez dos Açores “desviadas” para o continente por objecção médica

Secretário regional Paulo Estêvão referiu que a existência de médicos especialistas em ginecologia/obstetrícia objectores de consciência “comprometeu a capacidade assistencial local”.

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No ano passado, foram realizadas no país 17.124 interrupções da gravidez Manuel Roberto (Arquivo)
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Os utentes do Serviço Regional de Saúde dos Açores (SRS) tiveram de realizar 131 interrupções voluntárias da gravidez no continente, em 2023, devido a objecções de consciência de médicos e cumprimento de prazos, segundo o governo regional.

Numa resposta a um requerimento do deputado único do BE/Açores, António Lima, o secretário regional dos Assuntos Parlamentares e Comunidades, Paulo Estêvão, referiu que a existência de médicos especialistas em ginecologia/obstetrícia objectores de consciência nos hospitais do SRS “comprometeu a capacidade assistencial local”.

“Esta limitação, somada à necessidade de assegurar o cumprimento dos prazos legais para a realização dos procedimentos de interrupção voluntária de gravidez (IVG), resultou na impossibilidade de dar resposta, face à procura, resultando no encaminhamento das utentes para o território continental do país”, esclareceu.

O titular da pasta dos Assuntos Parlamentares apontou que, de Janeiro a Abril de 2024, foram encaminhados para o Hospital do Divino Espírito Santo 21 utentes de outras ilhas. Já de Janeiro a Setembro de 2024, na ilha de São Miguel solicitaram a IVG 74 utentes do SRS.

O secretário regional adianta, na resposta ao BE/Açores, que, actualmente, o Serviço de Ginecologia/Obstetrícia do HDES “tem condições para dar resposta apenas aos pedidos de IVG provenientes das ilhas de São Miguel e Santa Maria”. No primeiro trimestre de 2025, será realizada uma “avaliação faseada para determinar a possibilidade de retomar o encaminhamento de utentes de outras ilhas para a realização de IVG no HDES”.

Segundo o executivo açoriano, em 2024, existiam 14 médicos especialistas em ginecologia/obstetrícia nos três hospitais dos Açores, sendo que 11 declararam objecção de consciência para a prática de IVG.

No ano passado, foram realizadas no país 17.124 interrupções da gravidez. É o segundo ano consecutivo em que o número aumenta, o que altera a tendência decrescente que vinha a verificar-se desde 2011, nota o Relatório de Análise dos Registos da Interrupção Voluntária da Gravidez de 2023, publicado pela Direcção-Geral da Saúde (DGS) na sexta-feira.

O número anual de interrupções da gravidez realizadas no país, tanto por opção da mulher como por motivos relacionados com a saúde do nascituro ou da grávida, apresentou uma tendência decrescente até 2021, atingindo nesse ano as 14.348. Em 2014, por exemplo, tinham sido 16.961. Estas variações, nota o relatório, são influenciadas sobretudo pelas interrupções da gravidez realizadas por opção da mulher nas primeiras dez semanasde gestação.

Olhando apenas para as interrupções voluntárias da gravidez por vontade da mulher, foram registadas 16.559 em 2023, que representam 96,7% do total das interrupções da gravidez. É o principal motivo em todas as faixas etárias. No entanto, há ainda 2,8% das interrupções de gravidez que se deveram a doença grave ou malformação congénita do nascituro.