Presidente cessante da Geórgia recusa legitimidade do novo chefe de Estado
Mikheil Kavelashvili tomou posse no Parlamento mas a sua antecessora, Salome Zurabishvili, diz que leva com ela “a legitimidade e a bandeira”.
Ao mesmo tempo que, em frente ao Parlamento, os manifestantes exibiam cartões vermelhos, o antigo futebolista Mikhail Kavelashvili tomava posse como Presidente da Geórgia, após uma escolha, feita através de um colégio eleitoral, que foi boicotada pela oposição e com a chefe de Estado cessante a contestar a legitimidade da sucessão.
Num discurso de desafio perante os seus apoiantes no exterior do palácio presidencial, no centro da capital georgiana, Tbilissi, Salome Zurabishvili prometeu continuar a luta contra o que considera um governo ilegítimo.
“A sociedade está cá fora. Eles estão fechados lá dentro”, disse a Presidente cessante sobre Kavelashvili e o partido no poder, o Sonho Georgiano, que acusa de terem cometido fraude eleitoral nas eleições legislativas de Outubro, desencadeando protestos violentos que abalam o país há semanas.
“Comigo trago a legitimidade e a bandeira”, afirmou Zurabishvili após deixar o palácio presidencial, perante pelo menos duas mil pessoas que gritavam “Geórgia” e “Salome”.
Giorgi Mamatelashvili, um manifestante de 34 anos, disse à agência France-Presse que inicialmente esperava que Salome Zurabishvili permanecesse no palácio presidencial, mas admitiu que isso conduziria a um “impasse demasiado dramático”.
“Mas ela continua a ser a nossa Presidente”, acrescentou.
Kavelashvili, 53 anos, que era o único candidato a votação no Parlamento, venceu facilmente a votação realizada no início de Dezembro, já que o Sonho Georgiano controla um colégio eleitoral de 300 lugares que, em 2017, substituiu as eleições presidenciais directas. Este colégio é composto por membros do Parlamento, dos conselhos municipais e das legislaturas regionais.
No seu discurso de tomada de posse, o político e antigo futebolista - chegou a jogar no Manchester City na década de 1990 -, conhecido pelas suas opiniões ultraconservadoras e antiocidentais, fez a defesa da paz e dos valores nacionais.
“A nossa história mostra claramente que, após inúmeras lutas para defender a nossa pátria e as nossas tradições, a paz foi sempre um dos principais objectivos e um dos principais valores do povo georgiano”, afirmou Kavelashvili.
O novo Presidente apelou ainda ao respeito pelas "tradições, valores, identidade nacional, a santidade da família e da fé” do país.
O Sonho Georgiano manteve o controlo do Parlamento no país do Cáucaso do Sul nas eleições legislativas realizadas a 26 de Outubro, que a oposição alega terem sido manipuladas com a ajuda de Moscovo. A Presidente cessante da Geórgia e os principais partidos pró-ocidentais boicotaram as sessões parlamentares pós-eleitorais e exigiram a repetição do escrutínio.
O governo que saiu das eleições, liderado por Irakli Kobakhidze, anunciou no final de Novembro que iria retirar da sua agenda o processo de adesão à União Europeia “até ao final de 2028”, acusando o bloco comunitário de recorrer à “chantagem” nas negociações com o país.
No sábado, os partidos da oposição emitiram um comunicado conjunto a apelar à comunidade internacional para que não reconheça os resultados das eleições de Outubro e a rejeitar a legitimidade de Kavelashvili.
Também no sábado milhares de manifestantes pró-europeus voltaram a juntar-se na capital da Geórgia para protestar contra a tomada de posse de Kavelashvili, exigindo a libertação dos cidadãos detidos durante as manifestações anteriores e pedindo a realização de novas eleições legislativas.
Kavelashvili é um fiel de Bidzina Ivanishvili, milionário com fortuna feita na Rússia nos sectores dos metais e das telecomunicações, que fundou o Sonho Georgiano e é visto como o líder de facto da Geórgia.
Na sexta-feira, os EUA impuseram sanções a Ivanishvili, que foi primeiro-ministro da Geórgia entre 2012 e 2013, afirmando que ele estava a liderar a actual viragem anti-ocidental e pró-russa da Geórgia.
O secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, disse que Washington estava a sancionar Ivanishvili por este “minar o futuro democrático e euro-atlântico da Geórgia em benefício da Federação Russa”.
Blinken acrescentou que Ivanishvili tinha implementado “acções ou políticas que minam os processos ou instituições democráticas nos Estados Unidos ou no estrangeiro” em benefício da Rússia.