Cavala, esse grande peixe versátil que se vende por tuta e meia
De olho na sustentabilidade e na promoção da mudança de hábitos de consumo, pedimos ao chef Arnaldo Azevedo sete receitas com peixes populares. Esta é a penúltima da série.
Arnaldo Azevedo é um chef que tanto se sente bem a combinar ingredientes improváveis no Vila Foz, onde detém uma estrela Michelin, como a recriar receitas tradicionais ligadas ao mar no Bistrô by Vila Foz, que está inserido no Mercado de Matosinhos.
Arnaldo passou pela banca do Tó Peixe e trouxe carapaus, sardinhas, cavalas, petingas, peixe-porco, sarrajão e a bela da faneca. E, numa hora, preparou sete receitas. Vamos à sexta– a última será publicada daqui a dois dias. Bom proveito!
Já publicadas:
- 7 peixes, 7 receitas (1): Carapaus de escabeche
- 7 peixes, 7 receitas (2): Tártaro de sarrajão
- 7 peixes, 7 receitas (3): Caldeirada de peixe-porco
- 7 peixes, 7 receitas (4): Torricado de faneca
- 7 peixes, 7 receitas (5): Gaspacho com petinga braseada
Receita 6: Cavala marinada em citrinos
A cavala é a espécie que merece ser estudada ao detalhe. Não só por ser um peixe saboroso e nutricionalmente muito relevante, mas porque, através de um trabalho liderado pela Docapesca, passou a estar mais presente na dieta dos portugueses.
E a questão é: se a campanha de promoção que a Docapesca fez para a cavala fosse replicada para outras espécies, como estaríamos em matéria de hábitos de consumo de peixe? Como estaríamos em matéria de gestão do stock das espécies mais vulneráveis? Como estariam a finanças dos armadores e pescadores? Ou como poderia uma campanha destas mudar as mentes dos chefes e as ementas dos restaurantes?
De resto, foram inúmeros os chefes que tiveram responsabilidade no aumento de consumo de cavala, porque foram eles que, com imaginação e técnica, ora revelaram o sabor primário ora acresceram sabor à cavala.
Em fresco, sim, mas também em conserva. Noutros tempos, dentro de latas tínhamos cavala com ou sem picante. Hoje, não só os filetes são mais cuidados, como temos temperos para todos os gostos, com especiarias, ervas aromáticas e perfis de azeite variados. E tudo isso em menos de duas décadas.
E o curioso é que, sempre que vasculhamos cadernos de receitas já amarelecidos pelo tempo, descobrimos que já os antigos tinham imaginação com as cavalas. O autor deste texto, por exemplo, cresceu com uma receita que nunca viu reproduzida noutra cozinha e que é mesmo boa e relativamente fácil de fazer: cavalas assadas e recheadas.
As cavalas de porte grande têm de ser amanhadas (limpas), de forma que a barriga não seja aberta. Ou seja, corta-se a cabeça do peixe e é por aqui que se retiram as guelras e as tripas (à terceira cavala apanha-se o jeito).
Lava-se tudo muito bem lavado e reservam-se os peixes. À parte faz-se o recheio à base de um refogado elementar (muita cebola) com pão duro e enchidos. Este preparado vai para dentro das barrigas das cavalas. E estas vão ser colocadas num tabuleiro com cebolas às rodelas, salsa e batatinhas novas. Tabuleiro esse que, noutros tempos, entrava no forno a lenha quando saía o pão (naquela altura, já se tinha inventado as técnicas do aproveitamento energético e da cozedura a baixa temperatura). Hoje, lá teremos de levar o tabuleiro a um forno doméstico. Vale mesmo a pena.
Posto isto, vamos à receita de Arnaldo Azevedo, que é mais uma prova da versatilidade deste grande peixe que se vende por tuta e meia.
A próxima receita é publicada a 31 de Dezembro.