Recentemente, estava na cozinha a fazer pipocas. Não era nada de especial — eu adoro pipocas. Quando me estava a preparar para sair, depois do típico “até logo” para a minha colega de casa, ela disse: “Bom filme!”. Só que eu não ia ver um filme; então, porquê esta associação automática? Tal como com o Ano Novo, as pessoas associam certas ações ou momentos a ideias fixas — festas, resoluções — sem fazerem muitas perguntas. Entre o Natal e o Ano Novo, os dias confundem-se, a rotina desaparece, substituída por um vazio indefinido. Segunda ou quinta-feira, quem sabe? Deixamo-nos levar por uma calma atípica, sobretudo depois das semanas de frequências. O ritmo da vida parece ter sido interrompido. Os compromissos e as pressões quotidianas passam para segundo plano, enquanto os pensamentos vagueiam.
A cada dia que passa, sobretudo quando entramos em dezembro, sentimos a urgência de nos agarrarmos a momentos que, paradoxalmente, ainda não se foram. É como se estivéssemos a tentar congelar o tempo, sabendo que em breve serão memórias. O ano ainda não acabou, mas já damos por nós a dizer adeus, como se o fim estivesse no ar e a nostalgia antecipada se apoderasse de nós. E, no entanto, ironicamente, o que parecia ser um espaço de reflexão e de descanso acaba por ser um reflexo do que deixámos para trás e o primeiro vislumbre do que está para vir.
A contradição entre esta semana suspensa e o ritual estruturado da meia-noite é quase palpável. A contagem decrescente para o Ano Novo torna-se um grito coletivo, como se, por alguns segundos, tivéssemos o poder de moldar o futuro. O que é que estamos realmente a celebrar? O fim de um ciclo e o início de outro, ou a necessidade de controlar o que está para vir? Brindamos ao que ainda não sabemos, agarrados à esperança (e aos copos de champanhe), comemos 12 passas (ou uvas debaixo da mesa, se seguirmos as tendências do TikTok) na tentativa de garantir os desejos para o ano que se aproxima. Tudo isto numa tentativa de impor ordem ao que é incerto, de marcar a transição entre o que foi e o que está para vir, na esperança de que, ao fazê-lo, possamos ganhar algum controlo sobre o caos do tempo.
O Ano Novo convida-nos, dizem-nos, a festas, barulho e resoluções. Como se o mundo nos dissesse que este é o momento de corrigir falhas, de planear o que, no fundo, até podemos nem sequer conseguir controlar. A pressão para começar o ano da “forma ideal” é inegável: grandes festas, grandes planos, promessas de mudanças e objetivos. Somos lembrados de que devemos estar animados, cheios de energia e otimismo, como se mudar o calendário fosse a solução para tudo. No entanto, estas expectativas chocam muitas vezes com a realidade: com o fim das férias, as resoluções perdem-se e o entusiasmo esmorece. Estudos citados pela Fisher College of Business da Ohio State University mostram que uma em cada cinco pessoas desiste das sua resoluções até ao final da primeira semana do ano e quase metade até ao final de janeiro
É nessa altura que se instala a depressão sazonal e se começa a sentir o peso das expectativas não cumpridas. O início do ano, que parecia prometedor, acaba por se transformar numa continuação da luta contra a procrastinação e a pressão para fazer tudo “bem”. A contradição entre o que esperamos e o que experimentamos é um reflexo da nossa vulnerabilidade inata, de como a natureza das nossas vidas está fora do nosso controlo.
Acredito que a magia do Ano Novo não está nos objetivos esquecidos da primeira semana de janeiro, mas no momento em que, por um instante, acreditamos que o tempo nos pertence. Celebramos a passagem de algo que nunca conseguimos agarrar ou parar, guiados pela nostalgia do que foi e pela esperança do que ainda poderá ser. Celebramos o Ano Novo porque somos humanos, feitos e cheios de emoções, porque o tempo, para o bem e para o mal, passa por nós e deixa a sua marca. A nostalgia, mais do que um reflexo do que perdemos, é a força que nos leva a querer mais — a agarrarmo-nos ao que foi e a sonhar com o que ainda será. Brindamos à passagem do tempo porque o sentimos; e é esse sentimento que dá sentido ao futuro e, acima de tudo, à vida.