Frita, é uma categoria. Mas quem diz “não” a um torricado de faneca?
De olho na sustentabilidade e na promoção da mudança de hábitos de consumo, pedimos ao chef Arnaldo Azevedo sete receitas com peixes populares. Esta é a quarta da série.
Arnaldo Azevedo é um chef que tanto se sente bem a combinar ingredientes improváveis no Vila Foz, onde detém uma estrela Michelin, como a recriar receitas tradicionais ligadas ao mar no Bistrô by Vila Foz, que está inserido no Mercado de Matosinhos.
Arnaldo passou pela banca do Tó Peixe e trouxe carapaus, sardinhas, cavalas, petingas, peixe-porco, sarrajão e a bela da faneca. E, numa hora, preparou sete receitas. Vamos à quarta – as seguintes serão publicadas a cada dois dias, até ao final do ano. Bom proveito!
Já publicadas:
- 7 peixes, 7 receitas (1): Carapaus de escabeche
- 7 peixes, 7 receitas (2): Tártaro de sarrajão
- 7 peixes, 7 receitas (3): Caldeirada de peixe-porco
Receita 4: Torricado de faneca
Não podemos afirmar com certezas científicas, mas é plausível que seja no Norte que se coma mais fanecas, coisa que acrescenta muitos pontos ao bom gosto das gentes desta parte do país. Por regra, as fanecas são fritas e com um arroz ora de tomate, ora de feijão, ou ainda de grelos. São uma delícia quando frescas, condição obrigatória.
A questão da frescura é o calcanhar de Aquiles deste peixe de cor prateada e dourada, que é o pão nosso de cada dia em muitas casas de comunidades piscatórias e não-piscatórias, mas quase sempre próximas dos grandes mercados de peixe.
Por outro lado, é muito engraçado observar, nos mercados municipais, que quem compra fanecas são mulheres que estão perto ou acima da idade de reforma, o que significa que a faneca é um peixe de hábitos ou de memória. O facto de ser um peixe barato também é um bom indicador sociológico.
Verdade se diga que a faneca é lixada porque se não for mesmo fresca o caldo entorna-se. Quer dizer, liberta um aroma que a malta do peixe classifica como fénico. Isto é, cheira a amoníaco. Coisa que acontece com outras espécies mais nobres (cação, safio ou raia), mas no caso da faneca é tudo muito mais rápido. Deve ser uma espécie de vingança do peixe para com os humanos.
Agora, quando o peixe está fresco, é uma categoria. Bem fritas, apresentam uma textura muscular delicada e sedosa, com a pele crocante e cheia de nuances de sabor. Se nos esquecermos das questões de etiqueta, apetece-nos libertar o filete com os dedos e trincar as cabeças.
Sim, não é um peixe talhado para restaurantes com pergaminhos, mas, recentemente vimos um chef famoso do Norte do país a abastecer-se de fanecas no mercado de Angeiras – espaço que todos os fãs de peixe deviam visitar. Com acesa curiosidade, perguntámos se o peixe era para pessoal da casa. “Nada disso! Não faço um único caldo de peixe que não leve fanecas. Intensificam muito o sabor do caldo.” E esta, hein?!
A próxima receita é publicada a 27 de Dezembro.