Em prova: brancos que se bebem durante todo o ano
Uma prova para ajudar a deitar por terra a ideia de os vinhos brancos só se bebem Verão. A acompanhar, algumas pistas para a harmonização no prato, com garantia de boas surpresas e prazer redobrado.
A Região dos Vinhos Verdes é uma das melhores, se não a melhor, para a produção de vinhos brancos. Tem vindo a evoluir de tal maneira que deu um salto qualitativo enorme nos últimos dez anos. Isto é também fruto da recuperação de algumas castas que eram muito pouco conhecidas ou mal trabalhadas, que têm vindo a ser estudadas e experimentadas, com resultados por vezes surpreendentes.
Para além dos produtores mais conhecidos e daqueles de maior dimensão, têm aparecido novos produtores, de tamanho pequeno ou médio, com vinhos muito bons, que ajudam a mudar a imagem da região e têm vindo a motivar empresas vinícolas de outras regiões a investir ali.
Se o trabalho nas vinhas foi fundamental para produzir uvas de grande qualidade, o trabalho da enologia nas adegas é cada vez mais importante para obter um resultado final que não pára de crescer.
E o pagamento justo aos muitos viticultores que vivem das suas vinhas foi socialmente muito importante para conseguir fixar uma produção constante de qualidade. Assim, os Vinhos Verdes são cada vez mais reconhecidos, acumulando prémios nacional e internacionalmente, o que tem vindo a despertar a curiosidade do consumidor, hoje mais atento e conhecedor. A restauração não fica atrás e é hoje muito vulgar encontrar nas cartas de vinhos dos restaurantes uma oferta mais alargada de Vinhos Verdes, mesmo a preços mais elevados, quando o justificam.
Outra das alterações evidentes na região é o constante abandono dos vinhos com gás, que cada vez mais produtores deixam de lado. Embora ainda haja regionalmente um consumo razoável deste tipo de vinhos, a tendência é para essa categoria acabar a médio prazo. Nas tascas e restaurantes regionais, ainda é vulgar ouvir as garrafas serem abertas com aquele som inigualável que o gás proporciona. Não me choca mesmo nada beber esse tipo de Vinhos Verdes, quando feitos com qualidade, mas a tendência é noutro sentido.
Mesmo os Verdes com gás continuam a ser consumidos durante todo o ano, incluindo no tempo mais frio, como é tradição. Os seus irmãos mais modernos seguem-lhes já as pisadas, porque fazem belíssimas harmonizações, como já se encontram na alta restauração, pois chefes de cozinha e escanções vão descobrindo cada vez mais essas ligações extraordinárias.
E muitos escanções esclarecidos e conhecedores já servem muitos desses vinhos a temperaturas um pouco mais altas, realçando-lhes aromas e paladares até agora desconhecidos. Não devemos esquecer que é grande tradição nesta região servir vinho branco a acompanhar petiscos diversos como presunto, salpicão, chouriço, chouriço de sangue, azeitonas e broa.
Na região do Lima, o arroz de sarrabulho e os rojões têm tantas vezes por companhia os Verdes da casta loureiro. O belo capão assado no forno de Freamunde vai tão bem com um avesso ou mesmo um azal. Vinhos destas castas acompanham também a vitela assada no forno de Fafe. E, lá mesmo em cima, com que é que se acompanha o cordeiro de Monção e o cabritinho de Melgaço, assados no forno? Com a excelência do alvarinho, pois claro. E isto acontece durante todo o ano.
É, pois, tempo de abandonar de vez essa ideia de que os brancos são só para consumir no Verão. É tempo de experimentar bebê-los durante todo o ano, a acompanhar petiscos e pratos que normalmente só acompanharíamos com tinto. As surpresas serão muitas e o prazer será redobrado.
Como sempre, o meu bacalhau e o meu polvo da noite de Natal terão a companhia acertada de alguns Vinhos Verdes… sem gás.
Uma nota do autor
Sou viciado em música, que me acompanha de manhã à noite, sempre. Por isso, habituei-me a ligar a música e as sensações que me transmite, a outra sensações, aromáticas e de paladar. O vinho, outra das minhas paixões, é desde há muitos anos, companhia inseparável das minhas músicas. Transmite também o estado de espírito do momento em que o provo e em que ouço música. Ligar os dois é também um desafio que me provoca, me mantém atento e me dá imenso prazer.
Este artigo foi publicado na edição n.º 14 da revista Singular.
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