Wisdom, uma albatroz, é a ave mais antiga do mundo. Aos 74 anos, ainda põe ovos

Wisdom é um símbolo de esperança e longevidade entre a sua espécie. Todos os anos, os biólogos aguardam o seu regresso ao refúgio natural para a época de acasalamento.

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Estima-se que Wisdom já tenha chocado cerca de 30 crias durante a sua vida a partir dos 50 ovos que pôs Jon Brack
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Todos os anos, os biólogos de vida selvagem do arquipélago havaiano aguardam ansiosamente um albatroz chamado Wisdom (que em português significa "sabedoria").

A ave selvagem mais velha do mundo, com 74 anos, faz uma peregrinação anual ao Refúgio Nacional de Vida Selvagem do Atol de Midway (antiga base naval dos EUA e actualmente um refúgio natural). Mas todos os anos parece menos provável que Wisdom, que já ultrapassou em mais de 30 anos o tempo de vida médio da sua espécie, consiga chegar.

“Nenhum de nós quer estar aqui no ano em que ela não aparecer”, disse Jonathan Plissner, biólogo supervisor da vida selvagem no refúgio, ao The Washington Post.

Wisdom não só apareceu entre centenas de milhares de aves marinhas no mês passado, como também surpreendeu os biólogos ao realizar uma dança de cortejo com um novo parceiro. No dia seguinte à sua chegada, os funcionários do refúgio encontraram Wisdom sentado sobre um novo ovo – possivelmente o 60.º que ela produziu – anunciou o Serviço de Pesca e Vida Selvagem dos EUA na semana passada. Os biólogos conhecem-na pelo seu ninho e pela faixa vermelha brilhante com o número Z333.

Um símbolo de esperança e resiliência

Wisdom tem sido um símbolo de esperança para a espécie, ao mesmo tempo que expande o conhecimento dos cientistas sobre as aves marinhas. “O facto de ela ter aguentado tanto tempo é muito, muito especial”, comentou o biólogo de 61 anos.

Os cientistas acreditam que ela já tinha procurado o seu novo companheiro. “Foi observada a fazer uma dança de cortejo com vários pretendentes no ano passado, depois regressou nesta época de reprodução ao seu local habitual de nidificação”, disse Plissner.

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Os albatrozes-de-laysan são conhecidos pela sua longa capacidade de voo Jon Plissner / USFWS

Os albatrozes-de-laysan, como Wisdom, estão ameaçados devido à poluição por plásticos, a predadores como ratos e ratazanas, à introdução de plantas não nativas nas áreas de nidificação, à sobrepesca e à subida do nível do mar. Segundo o biólogo, muitos albatrozes ficam presos nos longos cabos dos barcos de pesca comercial e afogam-se.

Durante mais de sete décadas, Wisdom conseguiu de alguma forma evitar tudo isso. “O albatroz mais próximo da sua idade que conhecemos tem 52 anos”, disse Plissner, referindo que os albatrozes vivem normalmente entre 12 e 40 anos. “Com Wisdom, muito se deve a pura sorte”, comenta ele. “Mas ela pode ter alguns bons genes também.”

Jennifer McKay, bióloga de vida selvagem do Serviço Geológico dos EUA, explica que é difícil prever quanto tempo Wisdom vai viver e reproduzir-se. “Os cientistas tendem a não especular sem provas preexistentes”, disse McKay. “Por isso, usamos os dados recolhidos no passado para projectar o futuro e, sendo ela a mais velha, não há dados anteriores para projectar o futuro.”

A história de Wisdom

Os albatrozes-de-laysan, que têm uma envergadura de asas que chega aos 240 centímetros e são conhecidos pela sua longa capacidade de voo, regressam frequentemente ao seu local de nascimento para a época de acasalamento todos os Outonos, clarifica Plissner. O Atol de Midway abriga cerca de duas a três milhões dessas aves, a maior população de albatrozes do mundo.

Wisdom costumava ser comparado a um albatroz-real-do-norte chamado Grandma (em português, avó), que tinha 61 anos quando produziu uma cria, mas há anos que não é visto na sua área de nidificação na Nova Zelândia e presume-se que esteja morto. Wisdom também viveu mais do que a pessoa que a identificou em 1956, o famoso ornitólogo Chandler Robbins, que morreu em 2017, com 98 anos, de insuficiência cardíaca congestiva e outras doenças.

Robbins estava a trabalhar no refúgio Midway para o Serviço de Pesca e Vida Selvagem dos EUA e acreditava que a ave tinha cerca de seis anos na altura. “Sinto-me afortunado por ter conhecido Chandler Robbins numa reunião da Audubon Society quando tinha sete anos, crescendo na Virgínia”, disse Plissner. “E agora estou a interagir com a mesma ave em que ele colocou as bandas. É extraordinário.”

Os albatrozes-de-laysan põem apenas um ovo por ano, e Plissner estima que Wisdom já tenha chocado cerca de 30 crias durante a sua vida a partir das cerca de cinco dúzias de ovos que pôs.

As aves marinhas acasalam para toda a vida, disse ele, e revezam-se na incubação dos ovos e no cuidado das crias, que alimentam regurgitando pequenos peixes, lulas e crustáceos. “A última vez que [Wisdom] fez um ninho foi em 2021, e o seu então companheiro desapareceu depois disso”, explica Plissner, que acredita que ela sobreviveu a três companheiros.

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Uma das crias de Wisdom que nasceu em 2021 Jon Brack

O regresso mais aguardado

“Foi emocionante vê-la regressar no ano passado e começar a cortejar e a dançar com as outras aves”, contou o biólogo. “Soubemos então que ela estava a tentar activamente encontrar um novo companheiro." A dança de cortejo de um albatroz é um assunto complicado e barulhento que envolve cerca de duas dúzias de posturas, com muitas bicadas, balançando, buzinando e batendo o bico.

Depois de Wisdom ter posto um ovo no final do mês passado, a poucos metros do local onde já tinha feito o ninho, ela e o seu companheiro mais novo, ainda sem nome, começaram o paciente processo de incubação, que demora cerca de 60 dias, refere Plissner. A nova cria deverá eclodir por volta do final de Janeiro.

Os fãs da matriarca albatroz estão a seguir o seu último capítulo e a dar os parabéns na página do Facebook dos Amigos do Refúgio Nacional de Vida Selvagem do Atol de Midway.

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O Refúgio Nacional de Vida Selvagem do Atol de Midway acolhe todos os anos a maior colónia de albatrozes do mundo Jon Brack

Provavelmente, ninguém está mais feliz do que Plissner, que se tem deliciado com a história de Wisdom desde que chegou a Midway há sete anos. “Não sabíamos como é que ela reagiria à perda de um companheiro na sua idade, por isso, vê-la a divertir-se com as outras aves deu-nos esperança”, afirmou.

“Em cerca de 75% das vezes, o ovo eclode, pelo que não temos razões para suspeitar do contrário no caso da Wisdom”, afirmou. “E no próximo ano, quando for altura de ela voltar a fazer o ritual, não tenho dúvidas de que estará de volta."