SPMS empurram para os hospitais a responsabilidade pela cobrança das facturas do SNS a não-residentes
A presidente dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde insistiu que a facturação do tratamento prestado pelo SNS a estrangeiros não-residentes é da responsabilidade das unidades locais de Saúde.
A presidente do conselho de administração dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), Susana Cavaca, garantiu na manhã desta quarta-feira que o sistema informático do Serviço Nacional de Saúde (SNS) “responde à facturação” relativa aos serviços prestados no SNS, sendo esta “da responsabilidade das unidades locais de Saúde (ULS) que fazem o acolhimento” dos utentes, sejam nacionais ou estrangeiros. A responsável foi ouvida na Comissão da Saúde, na Assembleia da República, a requerimento do Chega e do PS, sobre o tratamento de cidadãos estrangeiros no Serviço Nacional de Saúde. Já o director executivo do SNS, que também esteve no Parlamento a prestar esclarecimentos sobre o tema, disse que a “IGAS vai aprofundar o relatório que fez e vai caracterizar melhor” a dimensão do problema.
Numa intervenção em que destacou não estar “em condições de disponibilizar informação” relativamente à facturação destes serviços prestados a estrangeiros não-residentes, tendo em conta o âmbito da intervenção da SPMS, “que está circunscrito à gestão e manutenção destes sistemas de informação”, Susana Cavaca deixou a garantia: “Não é por falta de sistema que se faz ou não a facturação.” Os sistemas a que se referia são o Registo Nacional de Utentes, o SIGAI (Sistema Integrado de Gestão e Administração de Informação) e o Sonho (Sistema Integrado de Informação Hospitalar).
“Relativamente aos dados, os sistemas têm disponíveis os dados para análise, não somos nós que os temos. São disponibilizados à ACSS [Administração Central do Sistema de Saúde] e à Direcção Executiva (DE-SNS)”, explicou em resposta às perguntas dos deputados relativas a que informação é disponibilizada pelos sistemas informáticos sobre utentes estrangeiros não-residentes em Portugal.
Por sua vez, o director executivo do SNS, António Gandra d'Almeida, referiu que na “parte da cobrança entre países, a plataforma existe e está a cargo da ACSS e aí a DE-SNS não interfere”, insistindo que “todos os organismos têm as suas competências”.
Questionado pelos deputados sobre qual é o tipo de situações que leva não-residentes a utilizar o SNS e a possibilidade de estarem envolvidas redes organizadas, Gandra d'Almeida frisou: “Não é investigado por nós.” “É um tema que tem de ser abordado por várias entidades. O crime não é investigado pelo Ministério da Saúde. E deve ser investigado quando há alguma suspeita, mas é difícil, a não ser que nos relatem que é uma rede que traz [estes utentes] ou como vieram ter acesso” aos hospitais do SNS, assumindo aguardar o relatório mais detalhado da IGAS, que trará mais detalhes sobre estas situações.
Por seu turno, Susana Cavaca adiantou que “é possível distinguir entre cidadãos com acordos e cidadãos sem acordos” na área da Saúde, mas “é preciso que haja este cuidado, à entrada do utente no SNS [de facturação] e isso é uma responsabilidade da própria ULS que faz o acolhimento do cidadão”. “Não é por não haver sistema”, terminou.
A responsável explicou que o âmbito de actuação dos SPMS se cinge à gestão e manutenção dos sistemas de informação e garantiu que, apesar de serem antiquados, já é possível fazer cruzamento de dados, por exemplo, com a Segurança Social ou as Finanças e explicou ainda que todos os utentes que entram no sistema têm um número de identificação e que, se não houver entidade financeira a quem atribuir o pagamento, “é a própria pessoa que tem de pagar”.
Recorde-se ainda que, presente no Parlamento na última semana, o presidente do conselho directivo da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), André Trindade, disse que, mesmo que “no limite extremo” quisessem, os hospitais e os IPO não conseguiriam fazer “cobrança coerciva” de pagamentos por tratamentos prestados no SNS a quem não tem número de identificação fiscal (NIF) em Portugal.
Chamado pelo Chega e pelo PS para falar daquilo que erradamente se designou por “turismo de saúde”, e instado pela deputada da Iniciativa Liberal, Joana Cordeiro, a clarificar se a sua posição era de restringir o acesso ao SNS, o responsável afirmou que não cabe à ACSS fazer “juízos de valor” e explicou: “O problema não está na identificação, o problema está na falta ou na dificuldade de obter a informação e, mesmo que se obtenha essa informação, se essa informação de facto é consistente e nos permite ir no encalço de quem deve ao SNS.”
Em causa está um relatório da Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS), que deu conta de que um total de 102.182 pessoas estrangeiras não-residentes em Portugal foram assistidas nos serviços de urgência dos hospitais do SNS em 2023. Entretanto, o PSD e CDS-PP entregaram um projecto de lei que visa alterar a Lei de Bases da Saúde para travar a “utilização abusiva” do SNS por estrangeiros não residentes em Portugal. O PS já disse que irá votar contra, mas o Chega poderá viabilizar o diploma.