“Ninguém no PS faz acordos com o Chega; nós combatemos o Chega”, responde Pedro Nuno a Montenegro
Socialistas recusam proximidade a André Ventura e acusam Luís Montenegro de incompetência. Carlos César defende a “coragem de [o PS] dizer sim ou não independentemente das companhias”.
Um dia depois, o mesmo cenário, protagonistas diferentes, mas igual assunto: a ligação do PS ao Chega. O partido de André Ventura foi o presente envenenado que PSD e PS trocaram nos seus jantares de Natal. Depois de Luís Montenegro ter acusado os socialistas de fazerem "alianças estratégicas" com o Chega, nesta quinta-feira Pedro Nuno Santos respondeu lembrando que foi "o PSD que fez acordo com o Chega na Madeira e nos Açores", para além de o Governo "se ter apropriado da agenda" da extrema-direita na imigração, na segurança, nas aulas de cidadania, e, agora, no acesso de estrangeiros ao SNS.
"Onde faltou verdadeiramente vergonha e sobrou descaramento foi na associação do PS ao Chega" feita por Montenegro, criticou o líder socialista, que não se cansou de insistir na ideia: "Não há partido político em Portugal mais distante do Chega que o PS. Não existe nenhum partido político que combate mais o Chega que nós."
Pedro Nuno Santos, que acusara o primeiro-ministro de "desrespeitar profundamente" um "Parlamento que legisla" por criticar as medidas aprovadas na redução do IRS e do IVA da electricidade nos consumos mais baixos, do fim das portagens, vincou que nenhuma das propostas que o PS fez, e que foram aprovadas (por todos os partidos da oposição), era da agenda da extrema-direita. "Não nos vamos apropriar nem meter na nossa a agenda da extrema-direita. Mas o Governo tem-se apropriado."
"Ninguém no PS faz acordos com o Chega; nós combatemos o Chega", vincou o secretário-geral socialista, empurrando para o PSD a preocupação constante de andar a "disputar com o Chega o território eleitoral". "Miguel Albuquerque lidera o governo regional porque fez um acordo com o Chega", apontou Pedro Nuno, argumentando que o PS-Madeira votou a favor da moção de censura do Chega porque "sempre foi contra este governo regional". O executivo "tem seis membros arguidos e agora que o parceiro parlamentar os abandonou era o PS que iria suportar um Governo que combate desde o primeiro dia", questionou.
O líder do PS retomou uma das linhas do discurso da líder parlamentar, de que o Governo é "profundamente incompetente e sem credibilidade", "manipula os dados para mascarar o insucesso da sua política" – nomeadamente na educação (alunos sem professor) e na saúde (cirurgias oncológicas) – e só faz "anúncios de powerpoint mas não resolve os problemas estruturais". Lamentou a ingratidão de Montenegro por ter feito um discurso tão crítico "sobre o partido que teve o sentido de Estado e responsabilidade de lhes viabilizar o orçamento", mas prometeu "fazer-lhe frente" com mais propostas no próximo ano para "infligir mais derrotas à direita".
Os avisos de César sobre o facilitismo e a coragem
Antes, Carlos César tinha usado o orçamento como exemplo da "coragem" com que o PS está na política, mas deixando um aviso a quem se perde, no partido, em ilusões discursivas. "Há perigos que contaminam a ansiedade com que os representantes da oposição que são também protagonistas de uma alternativa ao Governo [ou seja, o PS] se confrontam e uma delas é o excessivo facilitismo na sua intervenção. Porque o populismo tanto mora no facilitismo da negação como no desvario da promessa."
"A capacidade e credibilidade de um partido como o nosso estão inteiramente dependentes das razões pelas quais dizemos não e da coragem com que também sabemos dizer sim. (...) É com esse sentido que devemos prosseguir: com a coragem de dizer não e com a coragem de dizer sim, independentemente das companhias", apontou.
O presidente do PS contrariou a tese de Montenegro de que a novidade é ver agora o PS e o Chega juntos: "Novidade será a direita e o Chega se juntarem, como nos Açores, mostrando que estão juntos porque os unem as mesmas razões. (...) O PS não se confunde –nem nunca se confundiu – nem com os devaneios à sua esquerda, nem se descuidou com os perigos que chegam da extrema-direita. Ao contrário, foi o PSD que se escondeu junto do PS no processo que conduziu ao 25 de Novembro e é o PSD que nos Açores tem uma coligação de facto com o Chega e com a extrema-direita."
O presidente do partido deixou ainda o caderno de encargos para os próximos meses, como a defesa de uma política identitária, a aposta na redução das desigualdades, inovação, combate aos extremismos, defesa da segurança e do trabalho, cuidados aos idosos e defesa do espaço europeu. E apelou ao empenho num "ano especialmente trabalhoso" que se aproxima com eleições regionais na Madeira, autárquicas, e as escolhas para as presidenciais de 2026.
A abrir o jantar, a líder parlamentar Alexandra Leitão defendeu que, apesar da sessão legislativa "exigente", o PS tem mantido o seu papel "vigilante, fiscalizando a acção do Governo e apresentando propostas concretas para o país", mas também "expondo a incompetência e falta de transparência da AD, que tem resultado na fragilização dos serviços públicos" – numa referência a questões como os alunos sem professor, o cálculo do aumento das pensões ou listas de espera oncológicas.
A presidente da bancada socialista falou das conquistas do partido no Parlamento, da redução das taxas do IRS ao aumento da dedução das rendas, passando pelas portagens das ex-Scut, e também das derrotas impostas pela direita em medidas que considera "fundamentais" como a dotação para a habitação pública e a dedicação exclusiva no SNS – e prometeu voltar à carga com mais "medidas concretas" nessas e noutras áreas.
Mas a missão passa também por "travar o avanço da extrema-direita", que transformou o Parlamento num "palco de ataques políticos, ultrapassando os limites da decência e urbanidade". E criticou indirectamente Aguiar-Branco, dizendo que "aceitar insultos e intolerância em nome da liberdade de expressão é o primeiro passo para normalizar o racismo, a misoginia e a xenofobia". "Primeiro cedem nos discursos, depois nas políticas e, quando damos conta, a extrema-direita passou da sombra a centro da acção política."
O evento contou também com a presença de Manuel Alegre, que se tornou presidente honorário do PS no congresso de Janeiro deste ano e que entrou no Refeitório dos Frades da Assembleia da República ladeado por Carlos César e Pedro Nuno Santos; e da nova líder da Juventude Socialista Sofia Pereira.