Direita acusa Centeno de ter “agenda” para Belém e “fragilizar” Banco de Portugal
A previsão “isolada” de Mário Centeno causou “estranheza”. CDS e IL falam em “agenda” e “ambição mal disfarçada” do ex-ministro das Finanças, que ainda não desfez o tabu de uma candidatura a Belém.
Uma "agenda" em torno de um tabu não desfeito que "mina profundamente a credibilidade e independência" do Banco de Portugal. Foi assim que, à direita, foram recebidas as previsões de Mário Centeno sobre o défice para os próximos anos. Além da estranheza pela circunstância de as projecções do governador estarem "isoladas" das previsões das restantes instituições nacionais e internacionais, neste espectro político aponta-se uma ambição "mal disfarçada" de Centeno em relação à corrida presidencial.
Na última sexta-feira, o Banco de Portugal apontou para um regresso aos défices nos próximos anos, a começar já em 2025, com uma projecção de um resultado negativo de 0,1%. A instituição liderada por Mário Centeno avisa que o país pode violar as novas regras orçamentais europeias se não forem postas em prática medidas de consolidação. O ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, disse nesta segunda-feira manter "total confiança" na previsão do executivo de um excedente orçamental para o próximo ano.
Ao PÚBLICO, o deputado do PSD António Rodrigues diz não acreditar que um governador "pudesse alterar a sua perspectiva sobre os números pela questão ideológica ou para causar algum embaraço ao Governo", mas considera "estranhíssimo" que "todas as instituições nacionais e internacionais tenham uma perspectiva diferente". "Seria gravíssimo se o fizesse para sufragar a sua potencial candidatura", considera. "A independência do Banco de Portugal tem de se manter", conclui.
Paulo Núncio, líder parlamentar do CDS, lembra que foi o próprio Presidente da República a considerar que Centeno fez "um aviso político, desvalorizando as competências mais técnicas que se esperam de um regulador". Para o centrista, Centeno "é um político comprometido com o passado e o governo socialista" e tem "ambições presidenciais mal disfarçadas". Núncio critica ainda o governador por não afastar "de forma clara, pública e inequívoca" uma possível candidatura à Presidência da República enquanto está no banco central. "Pelo contrário: sempre que pode, alimenta essa ideia", o que "mina profundamente a credibilidade, independência e competência do regulador bancário", lamenta Paulo Núncio.
O centrista assinala também, em resposta ao PÚBLICO, que "as previsões contrariam todas as expectativas até agora conhecidas, tanto a nível doméstico como internacional" e que "não deixa de ser sintomático" o "isolamento" das previsões do banco central em relação a outras instituições, o que "fragiliza a independência do Banco de Portugal aos olhos do país", mas também "a sua própria credibilidade" de Centeno e "qualquer hipótese de ser considerado um candidato presidencial legítimo".
A mesma opinião é partilhada por Rui Rocha, líder da Iniciativa Liberal, que fala numa "agenda" de Centeno e avisa que "nenhuma das afirmações que faz pode ser lida fora de um contexto político que é a sua intenção de candidatura à Presidência da República".
Núncio faz ainda eco das críticas feitas em 2020 pelo PSD, quando Centeno transitou directamente do Ministério das Finanças para o lugar de governador, e lembra que Centeno chegou a considerar assumir a chefia do Governo na sequência da demissão do então primeiro-ministro socialista, António Costa. "Nunca deveria ter sido nomeado governador", atira, ainda que sem se pronunciar sobre os efeitos das mais recentes declarações na relação com o executivo.
Também nesta segunda-feira, em declarações à rádio Observador, Manuela Ferreira Leite, ex-ministra das Finanças, declarou-se "perplexa" com as declarações do governador por não conseguir entender "a discussão em torno de décimas de contas públicas". A ex-ministra acredita que Centeno se arrisca a ser acusado de "fazer política através do Banco de Portugal".