Curitibano transforma prédio do século XVIII em 14 apartamentos de luxo

Edifício histórico ao lado do Museu dos Coches e junto do palácio presidencial foi residência do feitor de D. João V. Propriedade tinha pontos de amarração de naus de grande porte.

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A casa, concluída em 1779, foi transformada em apartamentos e uma loja Jair Rattner
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No Século XVIII, foi o primeiro prédio da Rua da Junqueira, ao lado do Museu dos Coches. Ali, com azulejos de cor grená, era a casa do Capitão Vilar, o feitor do rei D. João V. Entre as atribuições de um feitor estavam a recolha de impostos, a fiscalização do comércio e a administração de mão de obra.

O engenheiro paranaense Guilherme Vialle, 45 anos, conta a história da casa que reformou e batizou de Villa dos Coches. “Quando D. João V comprou o pequeno palácio do 3º Conde de Aveiras e várias quintas próximas para construir o Palácio de Belém, cedeu o terreno ao lado ao seu feitor, o capitão Vilar, que construiu quatro casas, uma para viver e três para alugar”, diz. Era o início da estrada que ligava o palácio à cidade de Lisboa.

Foi o filho do capitão, o desembargador Vilar, que, em 1776, mandou construir a casa, um projeto do arquiteto italiano Giacomo Azzolini. Concluída em 1779, foi uma demonstração da riqueza, que acumulou nas funções de administração da Justiça no reino, a que a proximidade do palácio real ajudava. “O desembargador Vilar foi uma pessoa importante na época”, explica Vialle.

Atualmente, a parte de trás do empreendimento Villa dos Coches está voltada para o Museu dos Coches. Mas, quando a casa foi construída, havia ali um muro para o Rio Tejo, área que foi aterrada para a construção da linha de trem para Cascais.

“O muro é da época em que existia ali a feitoria dos ingleses. Ele ainda tem alguns dos cachorros, como eram chamados os pontos de amarração dos barcos. Como os cachorros são altos, eram barcos de grandes dimensões. Dá para imaginar que daqui partiram as naus que iam para o Brasil”, presume o engenheiro.

Foi em 2021 que Vialle, que vivia há 10 anos em Portugal, comprou a casa. Foi um momento de sorte. “Eu morava em Birre, Cascais, e tinha um vizinho muito idoso, com mais de 85 anos, que estava desenvolvendo o projeto da casa. Só para o licenciamento da obra foram quatro anos”, revela.

Como os filhos do proprietário não estavam interessados em desenvolver o projeto, a decisão foi vender. “Ainda havia na casa alguns inquilinos, com aluguéis antigos, muito baixos, que nós adiantamos um valor de indenização para que saíssem”, explica. A legislação portuguesa protege os inquilinos, tornando difícil de retirar das casas em casos de contratos antigos — normalmente, feitos por pessoas com muita idade — e limitando os aumentos de aluguéis.

As obras começaram em 2022 e, sendo numa zona histórica, foram encontrados vestígios de antigas ocupações. “Havia um poço e uma laje de pedra antiga, mas, depois de análise, verificaram que não tinham valor arqueológico”, assinala. Já os pontos de amarração de barcos foram mantidos na parede externa, voltada para o Museu dos Coches.

Da casa antiga, além do traçado original, houve vários elementos que foram mantidos. Entre eles, um teto decorado, um lambril de azulejos de meia altura, que foi retirado para as obras e, depois, recolocado, e algumas madeiras que duraram 250 anos e estão em ótimo estado. "Podem durar mais 250”, diz Vialle.

Teto decorado de 1779 Jair Rattner
Lateral do anexo à casa, com parede de azulejos Jair Rattner
Lambril de azulejos original do século XVIII Jair Rattner
Antigo muro do Tejo, incorporado no anexo, com pontos de amarração de barcos Jair Rattner
Vista do anexo a partir do pátio do Museu dos Coches Jair Rattner
Lateral da Villa dos Coches, com pontos de amarração de barcos Jair Rattner
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Teto decorado de 1779 Jair Rattner

Além da casa original, que foi dividida em sete apartamentos e uma loja, foi feito um anexo, com mais sete unidades. Na decoração da parede externa, foi colocado um painel de azulejos com desenho de um coche sendo puxado por um homem.

Os apartamentos vão de estúdios a três quartos. “O investimento total ficou em volta de 7,5 milhões de euros (R$ 47,2 milhões), dos quais 2,4 milhões de euros (R$ 15,1 milhões) foram para comprar a casa”, detalha Vialle.

Em janeiro de 2025, os apartamentos podem começar a ser ocupados. “Em menos de três anos, teremos a obra concluída”, comemora o curitibano. Um estúdio de 30 metros quadrados está ofertado por 340 mil euros (R$ 2,15 milhões) e um apartamento de três quartos, com 130 metros quadrados, por 1,25 milhão de euros (R$ 7,86 milhões). Os apartamentos maiores contam com garagem, numa região em que é muito difícil encontrar lugar para estacionar.

Pela segurança

Foi para evitar a violência que Vialle decidiu deixar Curitiba para viver em Portugal. “Eu me formei em engenharia civil em 2001. Quando decidi vir para Portugal, trabalhava na Tha Engenharia, que fez parte da construção da Curitiba”, lembra. “Quando me casei, decidimos ter filhos e o Brasil não é um país seguro. Há muita violência”, constata.

Ele conta porque escolheu o país para morar. “Desde 2005, costumava vir com frequência para Portugal. No começo, vim com um antigo sócio, que tem família portuguesa. E me apaixonei pelo país. Tinha a região do Parque das Nações toda renovada e, no resto da cidade, via uma quantidade enorme de prédios que precisavam de renovação”, ressalta.

Em Portugal, montou uma empresa de reformas de imóveis com a esposa, Mônica Vialle, que é arquiteta. “Eu faço o trabalho de engenharia e ela, os projetos”, afirma.

Entre as áreas em que já executaram obras de renovação está um edifício na Avenida António Augusto de Aguiar, no Saldanha, e um no Chiado. Ele diz que o prédio da António Augusto de Aguiar foi comprado por 600 euros (R$ 3.770) o metro quadrado e o do Chiado, a mil euros (R$ 6.300) o metro quadrado. Atualmente, nessas regiões, o preço do metro quadrado está acima de 4 mil euros (R$ 25 mil).

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O paranaense Guilherme Vialle, que há 11 anos trocou Curitiba por Lisboa para investir no imobiliário Jair Rattner

Fundo de investimento

O próximo passo de Vialle será a criação de um fundo de investimento imobiliário. “Vai se chamar Portuguese Riviera Fund e buscará a renovação de empreendimentos na região que abrange Cascais a Lisboa”, relata.

Ele pretende que os locais a serem renovados tenham vista para o mar ou fiquem a uma distância próxima do mar. Sobre a localização, ele explica: “A região tem 30% do PIB (Produto Interno Bruto) do país e perto de 30% da população de Portugal”.

Será um fundo SIC (Sociedade de Investimento Coletivo), que é regulado pela Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, o equivalente português da CVM brasileira. “A montagem jurídica do fundo foi feita pela Ernst & Young. Será uma associação com a Refund Explorer, que fará a contabilidade, a tesouraria e as contratações e nós, a parte imobiliária”, diz Vialle.

O foco será em empreendimentos de pequena dimensão. “Não interessa competir com os grandes players do mercado. Não vamos ter dimensão para isso”, explica o engenheiro.

O modelo de negócio prevê que a compra seja feita quando tudo estiver pronto para iniciar as obras. “Queremos ter riscos controlados. Não queremos correr os riscos do licenciamento”, acrescenta. Cada empreendimento deverá estar concluído em, no máximo, três anos.

No total, o fundo pretende gerir 20 milhões de euros (R$ 126 milhões) em investimentos. As subscrições vão começar em janeiro e os primeiros empreendimentos terão início quando forem atingidos os 7 milhões de euros (R$ 44 milhões) de comprometimento de entradas. A previsão de Vialle é que esse valor seja alcançado em 12 meses.

Entre os apelos aos investidores brasileiros está o fato de que os fundos imobiliários são isentos de Imposto de Renda e os aplicadores terão de pagar apenas 10% de tributo quando ocorrer a distribuição de dividendos.

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