Por dia, quatro brasileiras que moram no exterior são vítimas de violência

Portugal aparece em quarto lugar no triste ranking, segundo o Mapa Nacional da Violência de Gênero. A liderança nas agressões contra as mulheres está com a Itália, seguida pelos Estados Unidos.

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Em 2023, 1.556 mulheres brasileiras que moram no exterior foram vítimas de violência doméstica Manuel Roberto
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As agressões contra mulheres brasileiras que vivem no exterior têm sido cada vez mais frequentes. Dados divulgados nesta quarta-feira (11/12) apontam que, em média, por dia, 4,2 cidadãs oriundas do Brasil foram vítimas de violência doméstica em 2023. No total, houve 1.556 denúncias junto a embaixadas e consulados brasileiros espalhados pelo mundo. O país onde mais se registraram ataques contra brasileiras foi a Itália, com 350 casos. Na sequência, aparecem Estados Unidos (240), Reino Unido (188), Portugal (127) e Espanha (94).

As informações fazem parte do Mapa Nacional da Violência de Gênero, projeto viabilizado pelo Observatório da Mulher Contra a Violência, do Senado Federal, pelo Instituto Natura e pela Associação Gênero e Número. “Ainda que alarmantes, esses números tendem a ser muito piores quando se acompanha de perto a realidade das brasileiras no exterior”, diz Evones Santos, presidente do Comitê Popular de Mulheres em Portugal. “Na minha avaliação, esses dados estão subnotificados”, acrescenta.

A mesma avaliação é feita pela antropóloga, pesquisadora e ativista Rita Cássia Silva. “Sabemos que, por estarem em situação de vulnerabilidade, muitas mulheres acabam não denunciando as agressões, porque não confiam nas autoridades locais, uma vez que as polícias tendem a ser xenófobas, e mesmo nas autoridades brasileiras”, assinala. Segundo ela, há mulheres que, por não terem a documentação adequada do país em que vivem, deixam de procurar os consulados porque temem ser denunciadas. “Esse pensamento é um erro. Para nós, o que importa é proteger as brasileiras, documentadas ou não”, assinala o cônsul-geral do Brasil em Lisboa, Alessandro Candeas.

O levantamento, que consolidou dados de 186 representações sob responsabilidade do Ministério de Relações Exteriores (MRE), revela que a maior parte das denúncias feitas por mulheres brasileiras que residem no exterior — 904 — são de violência vicária, ou seja, por meio da agressão a terceiros, que envolvem a guarda dos filhos, sobretudo. No consulado de Lisboa, apenas em outubro deste ano, quase 80 mulheres relataram estar com problemas psicológicos por temerem ser afastadas das crianças. Várias, inclusive, se submetem à violência física e verbal para ficar próximas dos filhos.

Egito e Irlanda preocupam

Na avaliação de Daniela Grelin, diretora executiva de Direitos e Saúde das Mulheres e Comunicação Institucional do Instituto Natura, o atual levantamento representa mais um avanço para o enfrentamento da violência contra mulheres. “A importância desses números, pela primeira vez acessíveis desta maneira, é imensa. Eles lançam luz sobre a dimensão do problema da violência de gênero contra as mulheres brasileiras no exterior. Esta é uma inovação significativa que transformará a maneira como abordamos e enfrentamos este grave problema social", ressalta.

Pelos dados do Itamaraty, mais de 2,5 milhões de brasileiras residem atualmente no exterior de forma documentada. “É importante destacar que todas as mulheres brasileiras, independentemente da sua situação migratória, têm o direito de solicitar ajuda nos corpos consulares sem o risco de serem denunciadas”, assinala Daniela. Para a procuradora especial da Mulher no Senado, Zenaide Maia, "a nova seção do Mapa Nacional da Violência de Gênero, que agora incorpora dados inéditos sobre a violência contra mulheres brasileiras no exterior, reforça a urgência de proteger e apoiar essas cidadãs onde quer que elas estejam”.

Daniela chama a atenção para o que considera um ponto importante do levantamento. Mesmo não estando entre os cinco países com mais registros de violência contra as brasileiras, Egito, com 64 denúncias, e Irlanda, com 50, explicitam um quadro preocupante, pois, como têm um contingente menor de cidadãos oriundos do Brasil, proporcionalmente, a frequência das agressões é maior. No Egito, são apenas 2.500 brasileiros.

“Devemos considerar que esses números talvez não consigam captar a real dimensão do problema, devido à ausência de registros. Isso pode sugerir uma alta taxa de subnotificação de mulheres que sofrem violência doméstica e não recorrem às repartições consulares, ou que enfrentam obstáculos para acessar informações sobre como e onde podem solicitar ajuda”, complementa a diretora do Instituto Natura. Do total das representações brasileiras ao redor do mundo, em 48,8% não houve registros de casos de violência contra mulheres em 2023.

Rede de apoio

No entender de Daniela, as estatísticas podem sugerir que a informação adequada sobre a possibilidade de denúncias e pedidos de ajuda não alcança as mulheres brasileiras, o que pode ser resultado da insuficiência de políticas de prevenção à violência. Para Evones Santos, diante dessa realidade, é vital que as repartições consulares estejam equipadas com pessoal preparado para proteger e apoiar a comunidade.

Diretora da Secretaria de Transparência do Senado Federal, Elga Lopes acredita que a criação de redes de apoio para brasileiras no exterior exige colaboração entre instituições públicas, empresas privadas e sociedade civil. “Ao saírem do Brasil, muitas mulheres perdem o amparo das leis nacionais e enfrentam não só a violência de gênero, mas, também, a violência institucional, muitas vezes sem suporte. Somente com esforços integrados será possível garantir seus direitos e dignidade”, frisa.

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