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Com 100 mil imigrantes atendidos, Centro Hindu completa três meses. Queixas persistem
Primeiro posto a ser aberto pela AIMA dentro da força-tarefa para resolver os mais de 400 mil pedidos pendentes de residência, Centro Hindu aponta avanços, mas há muitos entraves a serem superados.
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A abertura do Centro Hindu, em Lisboa, como ponto de atendimento a imigrantes com processos pendentes junto à Agência para Integração, Migrações e Asilo (AIMA) completa três meses nesta segunda-feira (09/12). Desde então, segundo levantamento realizado por instituições que prestam serviços à agência, cerca de 100 mil pessoas foram atendidas apenas neste posto, quase um quarto dos mais 400 mil processos pendentes de pedidos de autorização de residência em Portugal. Especialistas acreditam que o esforço que vem sendo feito pelo governo com esse centro e os demais espalhados pelo país é louvável. Mas ainda há muito por ser feito, uma vez que os serviços prestados nesses locais são limitados.
Na opinião do advogado Alfredo Roque, da VE Consultoria, infelizmente, os profissionais que atuam no Centro Hindu não têm a formação necessária para executar os trabalhos, que são complexos. “Eles apenas recebem as documentações, fazem a biometria, mas a verdadeira checagem dos documentos é feita posteriormente pelos servidores da AIMA. O ideal seria que todo o processo fosse analisado ali no centro, para que, diante de qualquer problema, os imigrantes fossem informados. Certamente, as pendências seriam muito menores”, afirma. “Os centros não podem ser formados apenas por carimbadores de papéis”, acrescenta.
Para ele, seria mais proveitoso aos imigrantes e ao governo suprimir etapas no atendimento, uma vez que há pessoas esperando por soluções para os casos delas há mais de dois anos. “Os centros da força-tarefa são excelentes iniciativas, mas cujos resultados ficam a desejar. E, mais uma vez, são os imigrantes que sofrem por não verem seus casos resolvidos com presteza”, ressalta. No total, destaca o ministro da Presidência do Conselho de Ministro, António Leitão Amaro, nos mais de 20 centros da AIMA espalhados pelo país, 221 mil imigrantes foram atendidos, dos quais 108 mil tiveram os pedidos de residência negados, principalmente, por falta de pagamento das taxas exigidas. Mas ainda cabem recursos.
Segundo a advogada Catarina Zuccaro, a fragilidade do sistema de atendimento montado pelo governo se reflete na demora para a entrega dos cartões de residência, depois de aprovadas as autorizações de residência. Pelas regras em vigor, a AIMA tem até 90 dias úteis para encaminhar os tão esperados documentos. “O problema, no entanto, é que quase ninguém recebeu os cartões. Só estão sendo entregues os documentos de quem recorreu à Justiça”, assinala. Ela frisa, ainda, que, se o governo passado tivesse mantido o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), certamente, a situação hoje seria bem melhor para os imigrantes.
Problemas estruturais
A advogada Larissa Belo lembra que, apesar de terem inserido todos os documentos no sistema do SEF, sucedido pela AIMA, durante os pedidos de manifestação de interesse, os imigrantes notificados pelos centros da força-tarefa estão sendo obrigados a refazer tudo. “Na minha avaliação, um dos motivos para isso seria a perda de informações quando da transição do sistema do SEF para a AIMA. Isso justificaria o retrabalho, que atrasa todo o processo”, avalia. “Há, ainda, a limitação das pessoas que estão trabalhando nos centros. Elas não têm poder de decisão”, complementa.
Larissa chama a atenção para problemas estruturais no Centro Hindu. “Há, ali, 20 pessoas fazendo o atendimento, mas apenas um scanner para a copia dos documentos dos imigrantes. Com isso, o que vemos é fila de espera entre os funcionários do centro para escanear o que precisam. Por isso, um atendimento que poderia durar apenas 15 minutos, como já aconteceu comigo, leva até duas horas. Isso limita muito o trabalho”, relata. “Mas, a despeito de todos os entraves, é preciso reconhecer que os centros deram um conforto para os imigrantes, que esperavam por um atendimento há anos”, assinala.
Presidente da Consultoria Aliança Portuguesa, o advogado Fábio Knauer acredita que, dentro do que foi proposto pelo governo, o Centro Hindu, nesses três meses, cumpriu seu papel. “Porém, não é suficiente, pois, acompanhando todo o trabalho, vemos que há muitas incertezas, sobretudo, em relação aos agendamentos, tema que continua a ser judicializado. Ou seja, para chegar até à AIMA, está sendo necessário entrar com um processo judicial. Esse é o maior sinal de que as falhas permanecem, independentemente dos centros”, diz.
Knauer lembra que o prazo para o governo resolver todas as pendências da AIMA acaba em junho de 2025. “As cobranças por resultados vão aumentar daqui por diante. Será que esse prazo realmente será cumprido?”, questiona. “Não podemos negar que houve avanços nos últimos três meses, mas a situação está longe do ideal, tanto que os Tribunais estão sobrecarregados com milhares de processos. Sabemos que pedidos de agendamento junto à AIMA não deveriam dominar a Justiça, como está ocorrendo”, afirma.