Em Ensaio sobre o Agora, Tiago Fernandes expõe, sem medo, a vulnerabilidade masculina

O escritor luso-brasileiro mostra, no livro de estreia, que a poesia é o caminho para derrubar mitos de que homens não podem falar sobre suas fragilidades. Obra será lançada em 20 de dezembro.

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Com o livro de poesia "Ensaio sobre o Agora", o pernambucano Tiago Fernandes quer falar sobre a fragilidade masculina Arquivo pessoal
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Homens, desde muito pequenos, são educados para não demonstrar vulnerabilidades. São poucos os que se atrevem a falar sobre esse tema de forma aberta, sem medo da exposição. Foi a inquietação ante esse padrão social preestabelecido que levou o pernambucano Tiago Fernandes a questionar, por meio da poesia, que, independentemente do gênero, todos têm suas limitações. Mas, de forma alguma, elas devem ser vistas como fraqueza. Muito pelo contrário.

“Homens não falam. Não somos incentivados a lidar com questões complexas, afetivas ou delicadas”, diz Fernandes, que lança, em 20 de dezembro, o livro Ensaio sobre o Agora, que reúne poemas que transformam sentimentos vividos e, por vezes, sufocados em versos que criam pontes poéticas entre Brasil e Portugal, conectando culturas, tempos e emoções em uma narrativa sensível e profunda. "Este livro é a minha forma de romper o silêncio”, diz.

O poeta e jornalista ressalta que o livro, repleto de sentimentos não expressados no universo masculino, resgata memórias, emoções e reflexões sobre a condição humana. Na avaliação dele, os poemas, ainda que profundamente autobiográficos, são representativos de temas universais, como família, corpo, amores e desilusões. “Ao falar de mim, também falo do outro”, destaca Fernandes, que encontrou na poesia um espaço para explorar a complexidade humana.

De família portuguesa, o poeta nasceu em Recife e sua obra carrega a marca entre dois mundos. O rio Tejo, as ruas boêmias da capital portuguesa e os mares de Recife, Fortaleza e o Rio de Janeiro emergem como personagens vivos nas poesias. Ele também expõe as memórias da infância, os momentos alegres com a avó portuguesa no bairro carioca do Estácio, no poema No Estácio é Dia de Feira. Já o período difícil em que ele enfrentou um hospital sozinho aos 14 anos está em Noite Fria.

As memórias se estendem pelos poemas Fé Roubada e Versos Embriagados, que falam de dor e superação, e por Lisboa Vestida de Surpresa e Delírio e Perdidos, sobre a experiência coletiva de deslocamento, nostalgia e busca por pertencimento.

Esperança ante a pobreza

Tiago Fernandes conta que a relação dele com a poesia começou na adolescência, de forma improvável. “Durante a leitura cotidiana do jornal Folha de Pernambuco, no ano de 2008, eu me deparei com um projeto editorial para divulgar poemas de autores conhecidos e desconhecidos. Simplesmente, me apaixonou pelas poesias e passei a esperar ansiosamente pela próxima edição”, lembra. Entre os autores que o influenciaram estão Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Mário Quintana e Fernando Pessoa.

“Como não tinha dinheiro para comprar livros, a cada publicação das poesias, recortava as folhas do jornal e colava em um caderno velho de cor verde. Foi nesse caderno que a poesia se tornou minha grande parceira de vida”, diz. “Era ali que eu encontrava esperança para enfrentar a pobreza, a escassez e a violência que marcaram minha infância e adolescência”, acrescenta. Agora, o caderno verde se transformou em poema no primeiro livro.

Segundo o poeta, com o passar dos anos, de tanto ler, ele começou a rabiscar os primeiros versos. “Ainda estava no Brasil”, frisa. Fernandes se mudou para Portugal em 2018 e a ideia de publicar o livro surgiu durante uma conversa despretensiosa. “Em um dos meus encontros com um colega poeta e roteirista, em Lisboa, falando sobre a minha relação com a literatura, ele me provocou a escrever poesias. Experimentei e lá se vão cinco anos”, afirma.

Na avaliação do autor, sua escrita é permeada de outras artes, como a música. “O samba me inspira profundamente, assim como o fado. As pessoas que conheço, as pessoas pelas quais me apaixono. Tudo isso tem sido imortalizado em minha poesia de uma forma muito sutil e profunda”, assinala. E enfatiza: “A criação poética tornou-se uma companheira diária. Sempre que surge uma ideia, inicio as primeiras anotações. A minha produção está envolta em um processo lento, porém, contínuo”.

Para a apresentação de Ensaio sobre o Agora, o escritor preparou uma roda de poesias, que será realizada no Kreatori (Rua Domingos Sequeira, 13, Estrela, Lisboa), no dia do lançamento da obra, a partir das 19 horas, com entrada gratuita. Esse formato, acredita ele, tem como objetivo abrir um espaço acolhedor e divertido para a livre expressão poética do público. “Esse modelo dialoga com a história da obra”, diz.

A primeira edição do livro é voltada para o público de língua portuguesa. Em formato online (ebook e kindle), os exemplares podem ser adquiridos pela Amazon. Mas Fernandes já trabalha na tradução dos poemas para o inglês, com o objetivo de ampliar os horizontes da obra que ele classifica como confessional e universal.

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