Nova fase de protestos em Moçambique: 76 mortos depois, Governo ameaça com mais repressão

Nyusi acusa Mondlane de querer impor a sua agenda e diz que está agora a ouvir os candidatos opositores individualmente. Governo garante que vai usar “todos os meios” para impedir os protestos.

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Polícia moçambicano conversa com manifestante durante um protesto: o diálogo não tem imperado nas forças da ordem na resposta aos protestos LUÍSA NHANTUMBO / LUSA
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O Presidente cessante de Moçambique, Filipe Nyusi, culpa o candidato presidencial Venâncio Mondlane do fracasso da reunião de diálogo que convocou na semana passada para analisar a crise pós-eleitoral no país e encontrar soluções para resolver o impasse. Para o chefe de Estado em fim de mandato, o principal fomentador dos protestos que se prolongam desde 24 de Outubro quis impor unilateralmente uma agenda própria num diálogo a cinco.

“Não se cria agendas para um diálogo, para negociações, (…) unilateralmente”, disse Nyusi durante uma recepção a reitores das universidades públicas do país, citado pela Lusa. “Existe o primeiro encontro, em que as pessoas dizem quais são as preocupações. Isso é que fabrica a agenda. Mas se você está a fazer agenda, essa agenda é sua: quem lhe garante que o outro quer?”

As palavras do chefe de Estado surgem numa altura em que o Governo, através do ministro do Interior, Pascoal Ronda, anunciou que irá manter a sua mão dura em relação às manifestações que, segundo o balanço de terça-feira a Plataforma Eleitoral Decide, resultou na morte de 76 pessoas, ferimentos a tiro em outras 240 e mais de três mil detenções.

“O Governo, através das Forças de Defesa e Segurança [FDS], vai usar todo os meios à sua disposição para assegurar que se possam realizar cerimónias sociais como sejam casamentos, funerais, festas, entre outras, incluindo o funcionamento normal das instituições”, garantiu Ronda em conferência de imprensa, citado pela Lusa.

“Não se deve confundir como uso excessivo de força quando as FDS empregam os seus recursos para a protecção proporcional de infra-estruturas críticas públicas e privadas”, acrescentou o ministro, falando de que os agentes estão a agir no “cumprimento do dever sagrado” de protecção da pátria.

Palavras que não demonstram qualquer vontade de recuo, mesmo depois de uma semana em que a polícia admitiu que um dos seus veículos blindados atropelou uma manifestante no centro de Maputo, ao avançar propositadamente contra um palanque improvisado que havia sido construído no meio de uma avenida. Acção merecedora de uma reacção da União Europeia a condenar “a utilização excessiva de força” e a pedir o fim “da repressão violenta das manifestações”.

Em vigor a partir desta quarta-feira está uma nova fase de protestos convocada por Venâncio Mondlane para “todos os bairros”. Na segunda-feira, o candidato presidencial que garante ter ganho as eleições de 9 de Outubro, apesar dos contestados resultados oficiais lhe darem o segundo lugar a grande distância do candidato do poder, Daniel Chapo, pediu uma “actividade forte” dos seus apoiantes.

“Vão-se concentrar nos bairros e nas avenidas principais que atravessam os nossos bairros – não temos necessidade de fazer grandes deslocações – levantando os nossos cartazes”, entre as oito da manhã e as quatro da tarde, pediu Mondlane.

Segundo o site moçambicano Integrity Magazine, se logo cedo pela manhã se via na Matola, a cidade-satélite de Maputo, as pessoas a dirigirem-se para o trabalho normalmente, às 8h em ponto, os manifestantes começaram a cortar as principais vias, obrigando muita gente a ter de seguir a pé em direcção à capital.

Enquanto esta quarta fase da quarta etapa de protestos convocada por Mondlane prossegue até dia 11 de Dezembro, e o Conselho Constitucional prossegue na sua análise dos resultados oficiais das eleições para os validar ou não, Nyusi passou o diálogo para uma versão diferente, tendo em conta que os outros dois candidatos presidenciais da oposição se recusam a a reuniões conjuntas sem a presença de Mondlane.

“Convidei os quatro candidatos presidenciais, o figurino era quatro mais um, houve pensamentos diferentes, se o figurino era melhor ou não, mas não é com isso que estou preocupado, porque quando se faz diálogo existem muitos passos", disse o Presidente, antes de adiantar que encontrou um novo modelo para prosseguir o diálogo: “Já me reuni com todos de forma individual e estou a ouvir preocupações de cada um, que não são iguais."

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