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Processos movidos contra empresas aéreas foram “educativos”, diz ministro do STJ
Há queixas sobre o excesso de ações contra as companhias áreas no Brasil, mas, para o ministro João Otávio de Noronha, esse movimento foi importante para que houvesse mais respeito aos consumidores.
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O grande número de processos judiciais enfrentados pelas empresas aéreas no Brasil foi “educativo”, pois fez com que as companhias passassem a respeitar mais os consumidores. É o que acredita o ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para ele, antes da enxurrada de ações, “as empresas eram displicentes” em relação aos passageiros. “Desviavam bagagens, não cumpriam horários, cancelavam voos”, disse ele, que participou, em Lisboa, do Fórum Impactos Econômicos e Sociais dos Litígios de Massa.
Na avaliação do ministro, que presidiu o STJ, não há exageros quando se olha para o número de processos que tramitam no Judiciário brasileiro atualmente: 83,8 milhões, segundo os números mais recentes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “A Justiça é o caminho para que as pessoas possam reivindicar seus direitos. Se há excesso nas demandas, cabe aos juízes avaliarem. O que não pode é limitar o poder da população de chegar aos tribunais. Não se pode restringir à Justiça somente aos que podem pagar bons advogados”, afirmou.
Os questionamentos sobre o grande número de ações contra as empresas aéreas foram feitos pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que também participou do evento realizado em Lisboa. Segundo ele, há “cinco mil vezes mais processos contra empresas aéreas no Brasil do que nos Estado Unidos”. Essa comparação, na visão dele, aponta que algo está errado. Noronha, por sua vez, assegurou que as ações refletem a qualidade dos serviços que são prestados pelas companhias áreas, que melhoraram depois de se verem questionadas nos tribunais. As empresas passaram a respeitar mais a clientela.
Pelos cálculos da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), há aproximadamente 400 mil processos contra as companhias espalhados pelo Judiciário brasileiro. Ou seja, uma ação para casa 227 passageiros no Brasil, ante 1,2 milhão observado nos Estados Unidos. Os outros setores com volumes grandes de processos na Justiça são o financeiro, o da saúde e o de telecomunicações. Em Portugal, a litigância em massa atinge, principalmente, a Agência para Integração, Migrações e Asilo (AIMA).
Ridículo trágico
Para o procurador-geral da República, Paulo Gonet, é preciso ter cautela com o “ativismo judicial”, que resulta em um número excessivo de ações no Judiciário. No entender dele, esse ativismo é sustentado, entre outros, pelo Ministério Público e por associações. “É fundamental entendermos os nossos limites para não cairmos no ridículo, porque o ridículo não é só engraçado, é trágico”, afirmou. “Que estudemos as consequências desses atos e que a empolgação não nos leve a esquecer a razão de ser dos instrumentos”, frisou.
Ministro do STJ e corregedor nacional de Justiça, Mauro Campbell pediu aos juízes que não sejam “meros despachantes de processos”, porque isso é inadmissível num Judiciário já sobrecarregado. “Temos 83 milhões e 800 mil ações em tramitação. Mas nós, com o julgamento de um único tema, o da prescrição intercorrente, fizemos com que 27 milhões de processos fossem para o lixo. Isso dá uma dimensão do quanto é irracional o uso do Poder Jurídico e a falta de diálogo entre as instituições judiciárias brasileiras”, assinalou.
O número de ações judicias tramitando no Judiciário seria maior, na avaliação do advogado Ricardo Morishita, professor do IDP, não fossem os órgãos de defesa dos consumidores (Procons), que acabam por fazer uma filtragem das demandas. “Nos Procons, chega-se a um acordo em cerca de 80% dos casos. Trata-se de um serviço extrajudicial, gratuito, que ajuda na redução dos conflitos de massa”, frisou.