A natureza do trabalho, do dinheiro, do mercado imobiliário e da vida faz com que, actualmente, muitas pessoas provavelmente estejam numa relação financeira mista. Se estás na casa dos 20 ou 30 anos e namoras, esta situação pode parecer-te familiar: o teu companheiro pode já ter começado a carreira, enquanto tu ainda estudas. Ou podes já ter comprado uma casa e conhecer alguém com dificuldades em pagar as contas.
O dinheiro tem uma enorme influência nas nossas vidas e pode ditar o equilíbrio de poder nas relações. Ao longo de um relacionamento duradouro, este equilíbrio provavelmente vai alterar-se. Casamentos, filhos, casa própria, interrupções de carreira, períodos de doença ou de desemprego e reforma podem afectar as finanças de um casal.
Como terapeuta de casais, estou a par das consequências desastrosas que o dinheiro pode ter numa relação. Um inquérito realizado em 2023 pela Associação Britânica de Aconselhamento e Psicoterapia revelou que 55% dos terapeutas estão a assistir a um aumento do número de casais que procuram ajuda para resolver problemas financeiros.
Não é de admirar que esteja a surgir uma tendência de “terapeutas do dinheiro”, especializados em apoiar as pessoas e as suas finanças.
Ansiedade financeira
O dinheiro suscita todo o tipo de ansiedades e problemas, muitas vezes provenientes das nossas experiências de infância. Se a tua família tinha pouco dinheiro durante o teu crescimento, é normal que te preocupes com o facto de não teres dinheiro suficiente. Isto pode levar-te a procurar um companheiro que te possa apoiar financeiramente.
Para algumas pessoas, isto pode fazer com que se sintam seguras e cuidadas no início da relação, mas podem acabar por se ressentir da facilidade com que o parceiro ganha dinheiro e da relação que tem com o dinheiro que ganha.
É possível que não estejas totalmente consciente destes sentimentos ou da sua origem. Pode ser útil perceberes a relação que tens com o dinheiro e o teu “estilo de vinculação financeira” antes de tentares compreender o de outra pessoa.
As ansiedades financeiras podem transformar-se em comportamentos que prejudicam a relação pessoal, tais como guardar segredos.
Se achas os teus hábitos de despesas embaraçosos, podes sentir necessidade de os esconder do teu parceiro. Ou, se tiveres grandes investimentos, podes sentir necessidade de os proteger. Este tipo de infidelidade financeira pode quebrar a confiança no relacionamento. Para o evitares, é importante falar sobre valores financeiros e gestão do dinheiro com o companheiro. Esta conversa pode ser desconfortável ou difícil, especialmente se tiverem origens financeiras diferentes.
Encontrar um equilíbrio financeiro
A maioria dos casais é financeiramente disfuncional desde o início, mas isso não significa que não possam resolver o problema. É possível ter uma relação financeira saudável baseada na confiança, na aceitação e na compreensão, mas isso exige uma comunicação sincera e aberta.
Um conselho importante é ir mais longe do que aquilo que se ganha. O salário que trazes para um relacionamento pessoal é menos importante do que os teus valores financeiros — ou seja, o significado que atribuis ao dinheiro e a forma como o geres.
Falem sobre a importância que ambos atribuem ao dinheiro e como é que este se relaciona com a vossa educação familiar, género e emprego. Discutam como valorizam as contribuições financeiras e não-financeiras que ambos fazem para o casal. E descubram como querem gerir o dinheiro conjuntamente e quais são os vossos objectivos financeiros enquanto casal.
Os terapeutas de casais, como eu, falam muitas vezes do “encaixe do casal” — aquilo que vos faz ter uma ligação, mas que não conseguem identificar. É o que nos faz sentir que encontrámos um parceiro que satisfaz as nossas necessidades. Os valores financeiros partilhados estão fortemente ligados à qualidade e à satisfação do relacionamento e são uma parte importante da compatibilidade do casal.
Se tu e o teu parceiro estiverem de acordo sobre a forma como querem utilizar o dinheiro para melhorar as vossas vidas e as dos que vos rodeiam, as vossas motivações financeiras são complementares. No entanto, se, por exemplo, um de vocês gostar dos aspectos de poder e estatuto do dinheiro e o outro não, vão entrar em conflito.
A partilha das responsabilidades de gestão do dinheiro também pode ajudar-te a estar em sintonia com o teu parceiro. As investigações neste sentido mostram que os casais que partilham contas bancárias e planeiam as despesas e poupanças em conjunto estão mais satisfeitos com o seu relacionanemto, têm menos conflitos financeiros e melhores relações sexuais do que os casais menos unidos financeiramente.
Mas apesar de os casais prosperarem com a colaboração monetária, é fundamental manterem a sua própria independência financeira. Uma relação não é uma forma fiável de garantires o teu futuro financeiro. As separações podem ser dispendiosas, mas o impacto financeiro é menor se tiveres mantido a tua independência financeira durante o relacionamento.
Certifica-te de que tens um plano para continuares financeiramente independente do teu parceiro e teres as tuas finanças pessoais. Os casais podem continuar a colaborar e a ser financeiramente sinceros e, ao mesmo tempo, terem independência financeira.
Nunca é demasiado cedo ou demasiado tarde para começarem a falar de dinheiro, independentemente de estarem juntos há algumas semanas ou há décadas. Se tiverem dificuldade em fazê-lo, recorrer a uma terceira pessoa, seja ela terapeuta, consultor financeiro ou amigo de confiança, pode ajudar.
Exclusivo P3/ The Conversation
Ylva Baeckstrom é ex-banqueira e professora de Finanças na universidade King's College London, no Reino Unido