Governo da Geórgia congela processo de adesão à UE “até ao final de 2028”
Primeiro-ministro georgiano acusa o bloco de “chantagem” depois de o Parlamento Europeu ter aprovado resolução a responsabilizar o partido no poder pelo “agravamento da crise democrática” no país.
O Governo da Geórgia anunciou na quinta-feira que vai retirar da sua agenda o processo de adesão à União Europeia “até ao final de 2028”, acusando o bloco comunitário de recorrer à “chantagem” nas negociações com o país. O primeiro-ministro georgiano, Irakli Kobakhidze, assegura que a Geórgia ainda tem como objectivo juntar-se aos 27 até 2030, mas avisa: “É crucial que a UE respeite os nossos interesses nacionais e valores tradicionais”.
Depois de ter atribuído à Geórgia, no ano passado, o estatuto de país candidato à adesão, Bruxelas já tinha, na verdade, suspendido as negociações, assim como o envio de 30 milhões de euros em ajuda militar, em Julho, em resposta à aprovação da polémica “lei dos agentes estrangeiros”.
Sondagens citadas pela Reuters mostram que cerca de 80% dos georgianos apoiam a adesão à UE, objectivo que até está consagrado na Constituição do país do Cáucaso.
O anúncio de Kobakhidze foi feito depois de o Parlamento Europeu ter adoptado, na quinta-feira, uma resolução que reitera que as últimas eleições georgianas não foram “livres nem justas”, mas a derradeira etapa do “agravamento da crise democrática” na Geórgia. Para além disso, a resolução diz que o “partido no poder, o Sonho Georgiano, é totalmente responsável” por esse cenário.
Em resposta à tomada de posição do Governo, centenas de pessoas voltaram a protestar em frente ao Parlamento, em Tbilissi, entre quinta-feira à noite e a madrugada desta sexta-feira. A polícia antimotim disparou gás lacrimogéneo e canhões de água para tentar dispersar os manifestantes e, segundo o Ministério do Interior, foram detidas 43 pessoas e feridos 32 agentes policiais.
A Coligação para a Mudança, a maior plataforma de partidos opositores, informou que duas dirigentes suas foram “atacadas” pela polícia durante os protestos. Uma partiu uma mão e a outra partiu o nariz.
Numa mensagem publicada no Facebook, a líder da coligação, Nika Melia, convocou mais protestos para esta sexta-feira. “Hoje só temos uma tarefa: servir o país, para que amanhã tenhamos um país e para que os nossos filhos tenham um futuro”, apelou.
No poder há 12 anos, o Sonho Georgiano é acusado por muitos líderes europeus e ocidentais e por uma grande parte da sua população de estar a liderar uma deriva autoritária na Geórgia e a implementar uma agenda política pró-russa.
A legislação que limita os direitos da comunidade LGBTQI+ ou a referida “lei dos agentes estrangeiros” – que obriga qualquer organização não-governamental que receba mais de 20% de financiamento de fontes externas a integrar uma lista – são vistas como altamente inspiradas em leis impostas pelo Kremlin na Rússia.
A realização, o processo de contabilização e de anúncio dos votos e o desfecho das últimas eleições legislativas, em Outubro, deram força a estas acusações contra o Sonho Georgiano e aceleraram decisivamente o afastamento entre o Governo e a UE.
Depois de as sondagens à boca das urnas terem apontado para uma maioria parlamentar dos partidos opositores e pró-europeus, a Comissão Eleitoral Central atribuiu a vitória ao Sonho Georgiano, com cerca de 54% dos votos.
A oposição e os observadores eleitorais denunciaram irregularidades em todo o processo, falaram em “fraude” e “golpe” e Salome Zurabishvili, Presidente e crítica do Governo, recusou reconhecer o resultado, mesmo depois de uma contabilização parcial dos votos.
Em declarações à agência noticiosa Interpress, o embaixador da UE em Tbilissi, Pawel Herczynski, diz que a decisão do Governo georgiano de congelar o processo de adesão ao bloco comunitário é “triste”, “desoladora” e “contradiz claramente” a “política de todos os anteriores governos da Geórgia” e “os desejos da grande maioria da população”.
Segundo a Reuters, mais de 100 diplomatas georgianos assinaram uma carta a criticar a suspensão das negociações até ao final de 2028, argumentando que essa decisão viola o compromisso constitucional do país em aderir à UE num futuro próximo.