Caro leitor, cara leitora

Começo por vos apresentar a professora Joana Lopes, de 26 anos, que dá hoje aulas numa escola em Loures. Telefonei-lhe para saber o que leva uma jovem a tirar um curso e um mestrado na área do ensino, quando tudo o que ouve à sua volta é que ser professora é uma carreira difícil, em que não é fácil entrar e ter estabilidade, que terá de andar com a casa às costas, lidar com indisciplina crescente e com uma brutal sobrecarga de trabalho. 

Joana falou-me de “paixão”, do gosto de trabalhar com crianças, mas também admitiu que não foi sempre a primeira opção. “Apesar de querer ser professora, sinto que não foi logo a minha primeira intenção porque a opinião que temos, tanto dos pais, de colegas, da própria comunicação social, coloca esta profissão numa posição muito delicada e acaba por nos tirar um bocadinho a esperança de enveredar por este caminho.”

O pai, advogado, lembrou-lhe a experiência que a tia de Joana, também professora, tinha tido: anos e anos de casa às costas, partilhadas com outros professores, até ter conseguido aproximar-se da sua residência. “Isso fez com que acabasse por esconder um bocadinho o meu entusiasmo pela educação.” Mas não desistiu. Licenciou-se em Educação Básica em Coimbra, de onde é natural, e especializou-se no mestrado na área de História e Português de 2.º ciclo. E também ela fez as malas.

Deu aulas durante um ano na Escola Portuguesa em Cabo Verde a alunos do 1.º ano, uma “forma de ganhar alguma experiência”. Passou também por um colégio privado e, em Outubro de 2022, conseguiu a colocação numa escola em Loures, numa turma onde tinha alunos do 2.º e 3.º ano. Este ano, passou para os quadros do Ministério da Educação também num agrupamento de Loures, longe da sua cidade. E, disse-me ainda, aos 26 anos já não é a mais nova na sala de professores – o que pode ser um bom sinal.

Quando entrou pela primeira vez numa escola confessa que ficou desanimada. “Realmente a classe docente está muito envelhecida. Era a mais nova da sala dos professores quando cheguei. Senti-me um bocadinho desmotivada.”

Mas isso parece estar a mudar. Efeito ou não do intenso discurso da dificuldade que é colocar professores nalgumas zonas do país e de que, em poucos anos, não haverá docentes suficientes para fazer face às necessidades das escolas, os mais novos parecem estar a chegar-se à frente. “Em dois anos consegui finalmente ver uma sala de professores já mais heterogénea a nível de idades. Senti-me muito melhor, porque percebi que os jovens estão a começar a tentar cada vez mais entrar na carreira docente, muitos deles através da habilitação própria.” Este ano tem uma colega de História que tem 21 anos. 

São docentes que têm chegado às escolas apenas com a formação na área científica da disciplina à qual vão dar aulas, mas não em pedagogia ou didáctica. Quem forma professores admite que este possa ser um recurso para colmatar a falta de docentes que deixa milhares de alunos sem aulas, mas não abdica da necessidade dessa formação, por ser “constitutiva da profissão docente”. 

Estarão os jovens mais interessados em tornar-se professores? A procura pelos mestrados em ensino indicia esse interesse. Ainda assim, as faculdades e as escolas superiores de Educação não têm capacidade para formar professores ao ritmo a que são necessários, sendo por isso preciso reforçar as vagas. 

De jovem para jovem, Joana Lopes avisa os futuros colegas de que não será fácil. É preciso estar disponível para “sair da zona de conforto” e estar disposto a fazer as malas e a mudar de cidade.

Nas escolas, também não se esperam facilidades. Aos 26 anos, tem a seu cargo uma direcção de turma. Por isso, apesar da curta carreira, a sobrecarga de trabalho é já hoje algo que a preocupa e que acredita que poderá acabar por afastar muitos professores das escolas.

“Tenho-me apercebido que a sobrecarga [de trabalho] vai ser exponencial nos próximos anos devido à falta de docentes. Esse trabalho vem em dobro, o que nos deixa exaustos.” E deixa uma lista de coisas a melhorar: a formação docente para que se aborde mais como lidar com os diferentes contextos sociais que encontram nas escolas, mais apoios à deslocação e às rendas e uma maior atenção ao excesso de burocracia e a essa sobrecarga de trabalho. Neste ponto, será essencial recrutar mais psicólogos, assistentes sociais e professores de educação especial, que ainda “não chegam a todas as escolas”.

É a visão de uma jovem professora sobre a escola pública. Governo e sindicatos reúnem-se no próximo mês para iniciar o processo de revisão da carreira, que deverá passar por aumentar as remunerações dos escalões iniciais e por tornar este percurso mais claro e previsível — o que será também essencial para atrair mais jovens para a profissão. Mas não bastará.

Até quinta-feira!

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