As substâncias perfluoroalquiladas (PFAS, na sigla em inglês) compõem uma grande família de compostos químicos sintéticos utilizados há mais de 50 anos em diferentes produtos e processos industriais . São informalmente conhecidas como substâncias “químicas eternas” porque não se degradam facilmente, persistindo nos solos, reservatórios de água e organismos vivos (pessoas, animais e plantas). Estes poluentes permanecem nos ecossistemas ao longo de décadas e, consequentemente, acumulam-se na cadeia alimentar.
Existem mais de 4700 tipos de PFAS. Cada substância apresenta uma estrutura molecular distinta, mas têm em comum a presença de ligações do tipo carbono-flúor, que são das mais fortes na química orgânica.
São estas ligações robustas que tornam as substâncias perfluoroalquiladas tão persistentes – e daí a ideia de serem “eternas”, não degradáveis.
Graças a estas características químicas singulares, as PFAS tornaram—se extremamente apetecíveis para a indústria: além de duráveis, resistem à água, às gorduras e ao calor . À excepção dos tipos de PFAS que já foram proibidos — PFOA e PFOS, por exemplo —, esta família de substâncias é hoje amplamente utilizada nos mais diversos bens de consumo e processos industriais.
Como estamos expostos?
Os seres humanos podem estar expostos às PFAS no interior das habitações ou no local de trabalho, uma vez que são inúmeras as fontes de poluição por PFAS. Estas substâncias são utilizadas nos mais diferentes produtos — dos utensílios de cozinha antiaderentes aos têxteis antimanchas, passando por dispositivos médicos ou militares, produtos cosméticos , bens de higiene pessoal, espumas de combate a incêndios, tintas e embalagens alimentares .
Estas substâncias potencialmente nocivas também podem estar presentes nos alimentos e na água potável que ingerimos e até no ar que respiramos . Estudos científicos sugerem presença de PFAS na água potável — tanto da torneira como engarrafada —, nos ovos e nos grãos de café ou arroz , nos peixes de água doce e no pó das casas, por exemplo.
A maioria das PFAS é persistente no ambiente podem resistir mais tempo do que qualquer outra substância sintética.
É possível remediar solos, por exemplo, mas estas operações são muito dispendiosas. Precisamente por serem de difícil degradação, estes compostos acumularam-se na terra e nos reservatórios de água ao longo das últimas décadas .
Um mapa europeu de zonas contaminadas, divulgado em 2023, indicava que estes compostos químicos foram detectados em águas, solos e amostras de organismos em vários países europeus. Portugal surgia neste documento com nove pontos relevantes de contaminação.
Como consequência desta persistência, enquanto os PFAS continuarem a ser libertados para o ambiente, os seres humanos e outras espécies estarão expostos a concentrações cada vez maiores. Mesmo que todas as libertações de PFAS cessassem amanhã, continuariam a estar presentes no ambiente e nos seres humanos durante as gerações vindouras”
Agência Europeia de Produtos Químicos (Echa, na sigla em inglês)
Vários estudos publicados em revistas científicas sugerem uma associação entre a exposição a altos níveis de determinadas PFAS e prejuízos para a saúde humana.
Uma extensa reportagem publicada em 2024 na revista The New Yorker revelava como a empresa 3M, pioneira na utilização de PFAS em produtos impermeabilizantes, conhecia desde os anos 1970 que um tipo de PFAS — o PFOS — era tóxico para os seres vivos. O artigo mostra como a companhia manteve a informação confidencial mesmo sabendo que os testes indicavam a presença de PFOS no sangue não só dos trabalhadores da 3M, mas da população em geral. O PFOS não era apenas “eterno”, escreve a publicação norte—americana, mas também omnipresente – e daí ter sido banido globalmente, em 2009, pela Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos Persistentes.
O que fazer? Como se proteger?
É quase impossível eliminar por completo a exposição às PFAS, uma vez que estas substâncias estão por toda parte. Contudo, há algumas medidas que podem ajudar a reduzir significativamente a exposição:
Cuidado com os rótulos “sem PFOS/PFOA, que são menos abrangentes”
Susana Fonseca, vice-presidente da Zero
A União Europeia estava a considerar banir toda a classe das PFAS em 2026 ou, o mais tardar, no ano seguinte. Contudo, a Agência Europeia de Produtos Químicos, apoiada pelos cinco países que estiveram na génese da proposta de restrição universal dessas substâncias, está agora a considerar outras opções para utilizações específicas das PFAS – é o caso das baterias ou das células de combustível, por exemplo. Também deverão ser consideradas excepções para dispositivos médicos e semicondutores.
A incansável campanha de lobbying dos produtores de PFAS (e dos seus aliados) criou uma barreira a uma regulamentação significativa, mantendo estes ‘químicos eternos’ no nosso ambiente, apesar dos seus riscos bem documentados. Os gigantes da indústria estão a gastar dezenas de milhões anualmente para influenciar a política da UE, visando os chefes dos Estados-membros e até mesmo a presidente da Comissão Europeia para obter isenções. Ao reduzir as restrições e ao excluir as utilizações industriais, correm o risco de permitir que mais de metade das emissões de PFAS continuem a não diminuir, o que constitui um retrocesso devastador para a saúde pública e o ambiente”
Tatiana Santos, directora para a regulação de produtos químicos do Gabinete Europeu do Ambiente
Referências bibliográficas
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