Poluição por plástico: não fazer nada vai sair mais caro do que agir

O consenso científico é que temos de reduzir a produção de plástico para conter a poluição. Alguns países temem os efeitos dessa contenção na economia. Mas a ameaça da avalanche de plástico é maior.

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A produção incessante de plásticos está a criar uma poluição com impactos cada vez mais graves e com custos incomportáveis Andriy Onufriyenko/GettyImages
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Quando compra uma garrafa de refrigerante ou uma tablete de chocolate, provavelmente o preço não é muito elevado. Mas e se os verdadeiros custos da embalagem de plástico forem tidos em conta no preço que paga na caixa do supermercado?

Digamos, por exemplo, o custo de limpar a poluição causada pelo fabrico do plástico da garrafa, ou de tratar o invólucro do chocolate depois de o deitarmos fora? Ou até mesmo as despesas médicas que se acumulam, devido às ameaças para a saúde humana relacionadas com os plásticos? E não esqueçamos o custo dos danos infligidos à vida terrestre e marinha, que podem afectar ecossistemas inteiros.

Se assim fosse, o recibo teria um quilómetro de comprimento.

De 25 de Novembro a 1 de Dezembro, representantes de 175 países reúnem-se em Busan, na Coreia do Sul, para a quinta e última ronda de negociações sobre um tratado global sob a égide das Nações Unidas para travar a poluição por plásticos. A questão mais controversa é se o tratado incluirá ou não objectivos vinculativos de redução da produção de plástico.

Embora haja consenso científico sobre a necessidade de reduzir a produção de plástico para resolver as ameaças ambientais e de saúde que ela representa, alguns países estão preocupados com os potenciais impactos negativos que essa redução poderia ter nas suas economias.

No entanto, uma investigação levada a cabo por vários elementos da Coligação Científica para um Tratado de Plásticos Eficaz em todo o mundo, nos domínios da economia e das ciências ambientais, sugere que os países deveriam estar preocupados com o oposto: o facto de não se conseguir reduzir a produção de plástico pode constituir uma ameaça económica ainda maior.

O labirinto de plástico: não temos solução para o lixo que fazemos

A produção incessante de plásticos está a criar uma poluição com impactos cada vez mais graves e com custos que se tornam mais substanciais à medida que se multiplicam as crises.

No que diz respeito ao clima, estima-se que a indústria do plástico tenha sido responsável por 5,3% das emissões globais de gases com efeito de estufa em 2019. Se não forem tomadas medidas, estas emissões poderão duplicar ou mesmo triplicar até 2050.

O impacto da poluição por plástico na biodiversidade é assustador. Consegue-se encontrar actualmente microplásticos, que resultam da decomposição dos resíduos de plástico, em 26% dos peixes marinhos — uma proporção que duplicou na última década.

Já temos em mãos uma crise de saúde humana: por exemplo, uma estimativa feita em 2010 concluiu que pelo menos 1,8 milhões de cidadãos da União Europeia sofriam de doenças relacionadas com a exposição a substâncias químicas presentes nos plásticos.

Perante estas estatísticas, a redução da produção de plástico é um imperativo ambiental e de saúde pública.

Os custos astronómicos da crise do plástico

É impossível calcular com precisão os custos da crise do plástico a nível mundial, mas, no nosso último artigo, procurámos analisar os dados existentes para identificar um preço parcial.

Em primeiro lugar, há os custos de recolha, triagem, reciclagem e eliminação dos resíduos urbanos de plástico. Estima-se que estes custos, que são compensados pelas receitas da venda de plásticos reciclados e pela electricidade gerada pela incineração, variem entre 643 mil milhões de dólares e 1,61 biliões (milhões de milhões) de dólares a nível mundial, durante o período de 2016 a 2040.

São principalmente suportados pelos municípios ou empresas responsáveis pela gestão dos resíduos domésticos, mas são os contribuintes que acabam por pagar a factura.

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Garrafas de plástico para reciclagem recolhidas num mosteiro budista tailandês NARONG SANGNAK/EPA

A seguir, temos os danos causados ao ambiente marinho e terrestre. As tartarugas, os peixes, as aves marinhas e muitas outras espécies sofrem danos devido à ingestão de detritos de plástico. Estima-se que os custos destes danos ecológicos variem entre 1,86 biliões de dólares e 268,50 biliões de dólares durante o mesmo período.

A poluição por plástico tem também impactos significativos na saúde humana. Os aditivos presentes nos plásticos, como as substâncias químicas desreguladoras do sistema endócrino, estão associados a deficiências intelectuais, diabetes, obesidade, infertilidade, perturbações hormonais e cancro.

Estima-se que as doenças associadas a estas substâncias químicas custem anualmente 384 a 403 mil milhões de dólares nos EUA, 44 mil milhões de dólares na União Europeia e 18 mil milhões de dólares no Canadá — a preços de 2010. Ajustados para 2021 e repartidos pelo período 2016-2040, estes custos ascendem a 11,21 a 11,69 biliões de dólares. Esta é provavelmente uma estimativa conservadora, uma vez que se espera que os custos anuais subam com o aumento da produção de plástico e o crescimento da população.

Nestas três categorias — gestão de resíduos, poluição marinha e terrestre e saúde pública — descobrimos que, num cenário de manutenção do status quo, a poluição por plásticos que se acumulou no ecossistema global desde 1950 poderia custar entre 13,7 e 281,8 biliões de dólares em danos no período entre 2016 e 2040. É o equivalente a 548 mil milhões de dólares a 11,27 biliões de dólares por ano — até 2,5 vezes o Produto Interno Produto (PIB) da Alemanha.

Estes números evidenciam o enorme custo económico da crise do plástico, que excede em muito o preço de uma garrafa de refrigerante ou de uma barra de chocolate.

No entanto, há países que estão a tentar diluir o tratado global sobre os plásticos para se concentrarem apenas na gestão dos resíduos, não conseguindo assim resolver a raiz do problema: a produção de plástico.

À medida que a produção aumenta, os sistemas de tratamento terão dificuldade em acompanhar o ritmo, o que levará à libertação de mais plásticos na natureza. Se nada mudar, a quantidade de plástico libertado nos ecossistemas poderá duplicar até 2050, atingindo 121 milhões de toneladas por ano (contra 62 milhões de toneladas por ano em 2020).

Sem abordar a produção de plástico, gastaremos cada vez mais para limpar a poluição que poderia ter sido evitada, como se estivéssemos a tentar esvaziar uma banheira enquanto a torneira continua a correr a todo o vapor.

Infelizmente, os números económicos de que dispomos são provavelmente uma grande subestimação. Os dados disponíveis apresentam lacunas significativas — faltam os custos para a saúde humana fora da Europa, dos EUA e do Canadá, os custos dos danos causados aos ecossistemas terrestres em todo o mundo, o custo da limpeza de micro e nanoplásticos (actualmente, apenas os macroplásticos podem ser tratados) e o imenso desafio de lidar com os plásticos que vão para o fundo do oceano.

Um fardo desigual

Outros estudos mostram também que o custo da poluição por plásticos ao longo da vida é dez vezes mais elevado nos países com baixos rendimentos, apesar de pouca da produção e consumo de plásticos acontecer nestes países.

Além disso, os países do Sul Global serão mais gravemente afectados pela poluição por plásticos do que os do Norte Global.

Nos países que lucram com a produção e venda de plástico incluem-se os EUA, o Japão, a Coreia do Sul, a Alemanha e a Arábia Saudita, bem como Taiwan.

Os países ricos desempenham um papel central no comércio global de resíduos de plástico, exportando uma parte dos seus resíduos para países em desenvolvimento para serem reciclados. No entanto, este processo nem sempre garante uma reciclagem eficaz, aumentando assim o risco de fuga de detritos de plástico para os ecossistemas locais.

Os principais importadores líquidos de resíduos de plástico são a China, a Turquia, o Vietname, a Índia e a Malásia, que recebem volumes significativos de países exportadores como os EUA, o Japão, a Alemanha, a França e o Reino Unido. Apesar de um declínio recente da quota-parte dos países em desenvolvimento nestas importações, estes continuam a ser os principais destinos dos fluxos globais de resíduos de plástico, com consequências ambientais e sociais preocupantes.

Os países não só estão a pagar o preço da poluição causada pelo plástico, como também estão a pagar para o produzir. Um relatório do Fundo Monetário Internacional estima que os subsídios aos combustíveis fósseis ascenderam a sete biliões de dólares em todo o mundo em 2022, ou seja, 7,1% do PIB mundial. A maioria dos plásticos é derivada do petróleo e do gás natural.

A eliminação dos subsídios aos plásticos permitiria recuperar 30 mil milhões de dólares por ano só nos 15 principais países produtores de polímeros plásticos.

Uma oportunidade económica

No entanto, longe de ser um obstáculo, a redução da produção de plástico pode ser economicamente benéfica. A nossa investigação mostra que o custo líquido da inacção (13,7 a 281,8 biliões de dólares) pode ser significativamente mais elevado do que o custo das medidas para reduzir a produção de plástico e a poluição (18,3 a 158,4 biliões de dólares).

Além disso, uma transição bem gerida para uma economia pós-plástico, em que apenas os plásticos essenciais seriam permitidos, poderia estimular o crescimento económico através da criação de empregos no sector da reutilização e dos sistemas locais de depósito e recuperação.

Qualquer transição implica custos a curto prazo para o sector privado. Mas evitar os danos ambientais causados pela produção contínua de plástico conduz a benefícios líquidos a longo prazo — e possivelmente até a curto prazo, tendo em conta a subestimação dos custos actuais.

Por outras palavras, a redução da produção de plástico pode impulsionar as economias nacionais e mundiais. Alguns economistas defendem que um limite de produção internacional seria vantajoso para a própria indústria do plástico!

O tempo está a esgotar-se

Numa economia pós-plástico, apenas os produtos essenciais — como os tubos intravenosos, por exemplo — continuariam a ser utilizados, enquanto outros, como os plásticos de utilização única, seriam proibidos. Também seriam postos em prática sistemas locais de depósito-retorno para artigos reutilizáveis, como garrafas, talheres, copos, recipientes para alimentos, tabuleiros e embalagens. A concentração em soluções locais é fundamental para evitar as emissões de gases com efeito de estufa associadas ao transporte de longa distância.

No entanto, esta abordagem tem de ser alargada a nível global, para obter o máximo impacto. Esta mudança criaria todo um sector centrado na reutilização de contentores e embalagens, impulsionando o crescimento económico de uma forma que beneficia todos sem prejudicar a saúde humana ou os ecossistemas.

Se os líderes não agirem durante as negociações do tratado em Busan, os cidadãos consumidores pagarão o preço nas próximas décadas. Com o custo da poluição por plásticos a aumentar cada vez mais todos os anos, não podemos dar-nos ao luxo de esperar.


Mateo Cordier é Professor catedrático de economia e membro da Coligação Científica para um Tratado Eficaz sobre o Plástico, Universidade de Versailles, Universidade de Paris-Saclay

Este artigo foi republicado de The Conversation a partir de uma licença Creative Commons