Montenegro sobre violência doméstica: “É um autêntico crime de terror”
Primeiro-ministro aproveitou tomada de posse dos directores da PJ e dos serviços prisionais para responder às críticas do PS, garantindo que não olha com “ligeireza” para a violência doméstica.
O primeiro-ministro, Luís Montenegro, aproveitou esta terça-feira a tomada de posse dos directores da Polícia Judiciária (PJ), Luís Neves, e do novo director-geral de Reinserção Social e Serviços Prisionais (DGRSP), Orlando Carvalho, para responder às críticas do líder do PS, Pedro Nuno Santos, e garantiu que não olha para o crime de violência doméstica com ligeireza.
“É um autêntico crime de terror que atenta contra a dignidade humana, atenta contra aquilo que é mais fundamental na vida de uma pessoa e marca esse alguém para sempre”, disse, enquanto na pequena sala do Ministério da Justiça, onde já não cabia mais ninguém, imperava o silêncio.
O recado estava a ser dado. “Fico perplexo como é que perante a evidência da profundidade deste tipo de crimes, como outros, mas este em particular, perante o aprofundamento dos traumas, das circunstâncias absolutamente trágicas com que as suas vítimas ficam para sempre marcadas, como é que se pode querer desviar a atenção, nomeadamente no que concerne a uma coisa que tem que ver com o trabalho das forças de investigação”, afirmou o chefe de Governo que a seguir voltou a sublinhar o que disse na segunda-feira. “Pelo trabalho que o legislador fez ao fazer desse crime um crime público; pelo trabalho que muitas organizações fazem de apoio às vítimas; e pelo trabalho das forças de investigação, seja a PJ, a GNR ou a PSP, o trabalho que foi feito nos últimos anos fez com que a criminalidade participada neste caso concreto tivesse aumentado”, sustentou. E acrescentou: “E nós temos de ter noção de que esse aumento resulta muito do resultado do trabalho e não tanto do aumento da criminalidade em si – porque evidentemente não há um dado estatístico que compare aquilo que estava escondido com aquilo que está à mostra.”
“Se há quem pense que dizer isto é olhar com ligeireza para esta tipologia criminal, eu diria que ligeiro é aquele que não vê a realidade que tem diante dos seus olhos. Ligeiro é aquele não olha para essa realidade e não lhe dá a resposta que tem de ser dada”, rematou Luís Montenegro.
Recados à parte, o primeiro-ministro admitiu preocupação com o aumento de alguns fenómenos criminais, como a delinquência juvenil ou a criminalidade grupal, o combate à corrupção e o tráfico de drogas internacional e até interno, “muito à mostra, sobretudo em Lisboa e no Porto, assustando também as pessoas”.
“[No entanto,] é preciso dizer às portuguesas e aos portugueses que nós temos razões para confiar nas nossas polícias, nós temos razões para confiar nos nossos serviços públicos e nós temos razões para dizer alto e bom som que somos um país seguro, um dos mais seguros do mundo”, sublinhou Luís Montenegro.
Antes do chefe de Governo discursaram os empossados, nomeadamente Luís Neves, que foi reconduzido no cargo por um período de três anos. Aos 59 anos, o responsável cumprirá agora o terceiro mandato na liderança da PJ, depois de ter assumido o cargo de director nacional em 2018. Esteve praticamente cinco meses à espera de ser reconduzido, visto que a comissão de serviço tinha já terminado a 18 de Junho.
O director da PJ referiu que “é hora de recuperar o tempo e o espaço perdidos”, que a PJ tem “disponibilidade para uma colaboração plena” com o Ministério Público (MP) e agradeceu as palavras de incentivo do novo procurador-geral da República, Amadeu Guerra, nesse sentido. Luís Neves assegurou que a polícia que dirige vai estar particularmente atenta à prevenção de crimes, “desmontando redes organizados e ameaças emergentes internacionais, terrorismo, cibercrime, tráfico de droga e criminalidade económica e crimes de ódio”. Já no final e em declarações ao jornalistas, o director da PJ esclareceu que durante muitos anos a “gritante falta de meios que a PJ teve” levou a que muitas investigações se tivessem alongado e que “hoje isso não volta a suceder”.
Inibidores de sinal nas cadeias
O novo director-geral de Reinserção Social e Serviços Prisionais, Orlando Carvalho (64 anos e a trabalhar nas prisões em 1990, nomeadamente nos estabelecimentos prisionais de Aveiro, Vale de Judeus e Coimbra), anunciou medidas para reforçar a segurança das cadeias, nomeadamente “segurança estática dos estabelecimentos prisionais, entrada em funcionamento de inibidores de sinais de comunicações, revisão de procedimentos de segurança e reforço do parque automóvel”. Do caderno do encargos de Orlando Carvalho também faz parte “um reforço do pessoal de vigilância e mais recrutamento”, dada a notória falta de guardas prisionais.
“Sem estas questões resolvidas não há a mínima possibilidade de termos êxito”, afirmou, apontando a existência de pressões de vários lados, sobretudo das instituições internacionais onde Portugal tem sido “recorrentemente condenado”.
À saída, Orlando Carvalho explicou melhor aos jornalistas a questão dos inibidores de sinal, sublinhando que sabe que não vai ser “fácil de aplicar, porque as estruturas são diferentes”. Garantiu, ainda assim, que “o processo vai-se iniciar agora”. “Dependerá obviamente das condições técnicas, das disponibilidades orçamentais, mas o que é um facto é que o processo vai ter início agora”, afirmou, admitindo que há estabelecimentos prisionais prioritários, tendo em conta diferentes necessidades de segurança, consoante a população prisional que albergam. O novo responsável pelas prisões não quis dizer que estabelecimentos serão prioritários, mas admitiu que Vale de Judeus, de onde em Setembro fugiram cinco reclusos dos quais já dois foram recapturados, “será sempre um dos estabelecimentos que o sistema terá em atenção”.