Coreia do Norte expande fábrica de mísseis usados pela Rússia na Ucrânia

Investigação de um instituto norte-americano mostra trabalhos de expansão na Fábrica 11 de Fevereiro, que produz mísseis para a Rússia usar na Ucrânia.

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Imagens de satélite do complexo norte-coreano em Hamhung Planet Labs PBC/Handout via REUTERS
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Planet Labs PBC/Handout via REUTERS
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A Coreia do Norte está a expandir um importante complexo de fabrico de armas que monta um tipo de míssil de curto alcance utilizado pela Rússia na Ucrânia, segundo concluíram investigadores de um grupo de reflexão sediado nos EUA, com base em imagens de satélite.

A instalação, conhecida como a Fábrica 11 de Fevereiro, faz parte do Complexo de Máquinas Ryongsong em Hamhung, a segunda maior cidade da Coreia do Norte, na costa leste do país.

Sam Lair, investigador associado do Centro James Martin de Estudos de Não Proliferação (CNS), localizado no Instituto Middlebury de Estudos Internacionais na cidade norte-americana de Monterey, disse que a fábrica era a única conhecida por produzir a classe Hwasong-11 de mísseis balísticos de combustível sólido.

As autoridades ucranianas afirmam que estas munições – conhecidas como KN-23 no Ocidente – foram utilizadas pelas forças russas no seu ataque à Ucrânia. A expansão do complexo não tinha sido comunicada anteriormente.

Tanto Moscovo como Pyongyang negaram que a Coreia do Norte tenha transferido armas para a Rússia utilizar contra a Ucrânia, que invadiu em Fevereiro de 2022. A Rússia e a Coreia do Norte assinaram um tratado de defesa mútua numa cimeira em Junho e comprometeram-se a reforçar os seus laços militares.

A missão da Coreia do Norte junto das Nações Unidas não respondeu a um pedido de comentário para este artigo. As imagens de satélite, tiradas no início de Outubro pela empresa de satélites comerciais Planet Labs, mostram o que parece ser um edifício de montagem adicional em construção, bem como uma nova habitação, provavelmente destinada aos trabalhadores, de acordo com a análise dos investigadores da CNS. Parece também que Pyongyang está a melhorar as entradas para algumas das instalações subterrâneas do complexo.

Uma ponte rolante fora de uso que se encontrava em frente à entrada de um túnel, bloqueando o acesso fácil, foi removida, o que sugere que poderão estar a dar ênfase a essa parte das instalações, disse Lair.

“Vemos isto como uma sugestão de que estão a aumentar enormemente, ou estão a tentar aumentar significativamente, a produção desta fábrica”, disse Lair. O novo edifício de montagem tem cerca de 60 a 70 por cento do tamanho do anterior edifício utilizado para a montagem de mísseis.

Em 2023, os media estatais publicaram imagens, que a Reuters analisou, em que mostram o líder norte-coreano, Kim Jong-un, a caminhar por novos edifícios no complexo em Hamhung, onde os trabalhadores estavam a montar kits de cauda e cones de nariz para o que parecia ser o KN-23, de acordo com analistas.

No passado, vídeos divulgados publicamente pelos meios de comunicação estatais norte-coreanos mostram que o complexo produziu tudo, desde rodas de tanques até carcaças de motores de rockets, disse Lair.

Mísseis de baixa altitude

O KN-23 foi testado pela primeira vez em Maio de 2019 e foi projectado para escapar das defesas antimísseis voando numa trajectória mais baixa e “deprimida”, disseram especialistas à Reuters, tornando-os potencialmente úteis para a Rússia enquanto busca maneiras de penetrar nas defesas antiaéreas da Ucrânia.

A Rússia já disparou milhares de mísseis desde a invasão. A aposta da Coreia do Norte para fornecimentos adicionais poderia aliviar a pressão sobre as suas próprias instalações de produção, disse Lair.

A agência noticiosa estatal norte-coreana KCNA informou que está em curso a construção do Complexo de Máquinas Ryongsong.

Este mês, a KCNA disse que a instalação “está a avançar com os projectos para atingir o objectivo de modernização planeado para este ano”. O trabalho inclui a reconstrução de instalações de produção, bem como a montagem e instalação de equipamento em oficinas de máquinas e numa oficina de fundição de aço, afirmou.

Investigadores da SI Analytics, uma empresa sul-coreana de imagens de satélite que usa tecnologia de IA para vasculhar imagens, também confirmaram a nova construção na Fábrica de 11 de Fevereiro, informando num relatório nesta segunda-feira que algumas das construções perto da área de carregamento provavelmente seriam usadas para ocultar as futuras operações da fábrica dos satélites.

“Tendo em conta a presença de numerosos materiais de construção, veículos e vagões de carga carregados de materiais nas imediações do local, a construção parece estar a progredir rapidamente”, afirmou a empresa. O relatório refere que a fábrica foi utilizada para produzir mísseis balísticos, sem nomear o KN-23.

Michael Duitsman, também investigador associado da CNS, disse que era possível que a nova construção revelada nas imagens de satélite pudesse ser uma instalação de armazenamento, mas acreditava ser mais provável que fosse um novo edifício de montagem.

Os mísseis norte-coreanos são responsáveis por uma fracção dos ataques da Rússia na guerra contra a Ucrânia, mas a sua alegada utilização causou alarme em Seul e Washington porque sugere o fim de um consenso de quase duas décadas entre os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU sobre a prevenção de Pyongyang de expandir os seus programas de mísseis balísticos.

A SI Analytics disse nesta segunda-feira que também identificou novas construções no Complexo Vinalon, situado nas proximidades, que acreditam estar destinadas à produção de combustível para mísseis balísticos. A construção pode ter como objectivo aumentar a produção de propulsores sólidos ou UDMH, um importante combustível líquido utilizado em motores de foguetões, segundo o relatório.

Joseph Dempsey, analista militar do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos de Londres, disse que a expansão das instalações de mísseis balísticos de curto alcance da Coreia do Norte seria provavelmente motivada principalmente pelo desejo de aumentar o próprio arsenal do país.

Segundo o analista, não é claro até que ponto Pyongyang poderá ter expandido a capacidade de produção para satisfazer as exigências da sua nova cooperação com Moscovo.

De acordo com Washington, Kiev e Seul, mais de dez mil militares norte-coreanos foram enviados para a região russa de Kursk, onde a Ucrânia lançou uma importante incursão transfronteiriça em Agosto.

A tropa norte-coreana vai combater integrada na unidade aerotransportada e dos fuzileiros navais da Rússia, tendo alguns militares da Coreia do Norte participado já em batalhas na guerra na Ucrânia, disse na última quarta-feira um deputado sul-coreano que faz parte da comissão parlamentar dos serviços secretos.

A Rússia não negou o envolvimento de tropa norte-coreana na guerra que tem vindo a travar na Ucrânia desde que lançou uma invasão em grande escala em Fevereiro de 2022.