Investigadora Maria Manuel Mota defende antecipação de rastreios do cancro colorrectal e da mama

“Estamos a ver casos muito jovens. E quando estamos a falar de jovens é abaixo dos 40 anos. Já existem pelo mundo inteiro, não é apenas em Portugal”, alerta a investigadora.

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A cientista Maria Manuel Mota lidera o novo Instituto Gulbenkian de Medicina Molecular TIAGO PETINGA / LUSA
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A investigadora Maria Manuel Mota, que lidera o novo Instituto Gulbenkian de Medicina Molecular (GIMM), defende uma antecipação dos rastreios nos cancros colorrectal e da mama e alerta que estão a aparecer cada vez mais cedo na população.

No cancro colorrectal, que era um cancro tipicamente de pessoas acima dos 50 anos (...), nós estamos a ver casos muito jovens. E quando estamos a falar de jovens é abaixo dos 40 anos. Já existem pelo mundo inteiro, não é apenas em Portugal, é um fenómeno que está a acontecer em vários tipos de cancro, afirmou a investigadora.

Numa entrevista à Lusa a propósito do trabalho que o GIMM vai desenvolver, a investigadora diz que os rastreios terão "todos de ser pensados, e lembra: "muitas vezes as normas são muito rígidas e os dados que vêm da ciência têm de nos fazer repensar isto.

O director do Programa Nacional para as Hepatites Virais, Rui Tato Martinho, já tinha alertado para o aumento de casos de cancro da mama, colorrectal e do fígado em pessoas mais jovens, apontando a obesidade e o consumo exagerado de álcool e carnes vermelhas como causas para este problema.

Quanto ao cancro da mama, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) está a actualizar a norma referente ao rastreio, antecipando-o dos 50 para os 45 anos. O documento já deveria ter ficado concluído no Verão.

A recomendação da DGS vem cumprir as recomendações da União Europeia emitidas há dois anos para antecipar a primeira mamografia para os 45 anos e estender o rastreio até aos 74 anos.

Instituto tem 42 milhões para melhorar rastreios

As equipas de investigação do Instituto Gulbenkian de Medicina Molecular terão nos primeiros seis anos 42 milhões de euros só para desenvolver soluções para aplicar em problemas de saúde como, por exemplo, o rastreio dos cancros colorrectal e da mama.

O GIMM-Care é um dos dois grandes programas de investigação do GIMM, que nasceu da fusão do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (IMM) e Instituto Gulbenkian de Ciência.

Em entrevista à Lusa, Maria Manuel Mota explica como o GIMM-Care pretende fazer a ponte entre a descoberta a e a aplicação prática, reduzindo o tempo entre o aparecimento soluções inovadoras de saúde e sua aplicação prática. A intenção é que estas soluções fiquem disponíveis no Serviço Nacional de Saúde (SNS).

“Estas equipas são muito mais do que investigadores. É muito mais transdisciplinar. Temos investigadores, mas também temos pessoas da logística a dizer como é que a solução poderia ser aplicada”, explicou a responsável, sublinhando que estas equipas trabalham por missões.

Como exemplo de “missões” em que as equipas já trabalham, Maria Manuel Mota aponta o cancro colorrectal – “número um em incidência e mortalidade em Portugal” –, cujo peso negativo se pretende reduzir, por exemplo, melhorando os rastreios.

“É um cancro completamente evitável, quando descoberto a tempo”, lembra a investigadora, recordando: “nenhum país, por mais rico que seja, consegue fazer colonoscopias a todos os seus cidadãos a partir dos 50 anos”.

Para ajudar a melhorar o método de rastreio, os investigadores do GIMM, com a experiência obtida com os testes desenvolvidos durante a pandemia, querem ajudar o SNS a levar a mais gente o teste do sangue oculto nas fezes, já usado como rastreio do cancro colorrectal, melhorando-o e tornando-o mais low-cost: “A Holanda conseguiu atingir 80% da população, de dois em dois anos, é isso que nós devemos atingir”.

Além do cancro colorrectal, o GIMM-Care está igualmente focado no cancro da mama, sobretudo nos mais jovens, surgindo cada vez mais em mulheres abaixo dos 40 anos.

Neste caso, como o rastreio (mamografia) implica uma exposição a radiações, lembra que deve haver uma priorização de quem precisa fazer o rastreio: “o objectivo é estar sempre em diálogo com a sociedade, não por alarmismo, para dizer as soluções que existem e como as podemos usar”.