Associações preocupadas com aumento do risco de pobreza entre as crianças portuguesas

Estudo revela que 20 em cada 100 alunos provenientes de famílias desfavorecidas reprovam de ano durante o 2.º e 3.º ciclos do ensino básico.

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Taxa de risco de pobreza infantil agravou-se entre 2022 e 2023 e tem peso no desempenho académico Nuno Ferreira Santos (arquivo)
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Várias organizações da sociedade civil alertaram esta quarta-feira para o aumento do risco de pobreza entre as crianças portuguesas e pedem aos governantes que coloquem o tema como prioridade política. Os números mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE), relativos a 2023, apontam para "um aumento da taxa de pobreza infantil com 347 mil crianças em risco de pobreza monetária". "São mais 44 mil do que no ano anterior", sublinham os subscritores de uma carta aberta.

A "taxa de risco de pobreza infantil em 2023 foi de 20,7%", correspondendo a um regresso aos valores de 2017, o que coloca as crianças como o "grupo etário que regista a maior taxa de risco de pobreza e também aquele em que se observa uma evolução mais desfavorável deste indicador", pode ler-se no documento, assinado por peritos e por várias organizações, entre as quais a Rede Europeia Antipobreza, Instituto de Apoio à Criança e a Cáritas Portuguesa.

Os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, de que Portugal é signatário, prevêem uma redução de 50% do número de crianças em situação de pobreza em relação a 2019 (360 mil). Contudo, "o cenário actual não nos confere garantias de que em 2030 o país esteja a cumprir a meta estabelecida", referem os subscritores, que criticam a falta de articulação das "diversas estratégias que visam o bem-estar das crianças", em particular os projectos Garantia para Infância, da Estratégia Nacional para os Direitos da Criança 2021-2024 ou da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza 2021-2030.

O problema, referem, tem várias causas, incluindo a "escassez de rendimentos familiares (em regra associados aos salários baixos e precariedade laboral), condições habitacionais precárias e pobreza energética, desigualdades no acesso a uma educação de qualidade e inclusiva, dificuldade no acesso a cuidados de saúde mental, perigos do mundo digital/exclusão digital, fenómenos migratórios, violência e delinquência juvenil ou abusos".

Pior desempenho escolar

Perante este diagnóstico, os subscritores pedem mudanças políticas que assegurem consequências positivas concretas para as crianças, com investimento em projectos que coloquem os mais novos no centro de projectos de combate à pobreza. Na carta, reclamam uma "abordagem baseada nos direitos da criança enquanto sujeito de direitos, como sustentado pelo Comité dos Direitos da Criança, que seja clara, integradora e coordenada da intervenção para o desenvolvimento de políticas e programas que garantam o superior interesse das crianças"

O apelo foi divulgado no dia em que se comemoram 35 anos da adopção da Convenção sobre os Direitos da Criança, e no âmbito do Grupo de Trabalho da Pobreza Infantil, dinamizado pela Rede Europeia Antipobreza. A propósito da efeméride, a EPIS – Empresários para a Inclusão Social divulgou um estudo que revela que 20 em cada 100 alunos provenientes de famílias desfavorecidas reprovam de ano durante o 2.º e 3.º ciclos do ensino básico.

A análise, que envolveu uma amostra de 10 mil estudantes e analisou resultados entre 2020 e 2023, aponta o peso das desigualdades no desempenho académico e especifica que no 2.º ciclo os alunos de classe média-baixa apresentam uma taxa de transição de 96,4%. No terceiro ciclo, a mesma classe social apresenta uma taxa de passagem de ano de 83,8%.