Portugal continua a ser “bom aluno” em matéria climática, mas caiu duas posições no Índice de Desempenho das Alterações Climáticas (CCPI, na sigla em inglês), uma avaliação que permite cotejar o desempenho anual de 63 países e da União Europeia. Portugal surge este ano na 15.ª posição – no ano passado estava em 13.º lugar – e, por um triz, não saiu do grupo de países com classificação alta.
A edição de 2025 do relatório CCPI, elaborado anualmente por organizações não-governamentais (com a colaboração da portuguesa Zero), é apresentada esta quarta-feira na Conferência do Clima das Nações Unidas (COP29), que decorre até sexta-feira no Azerbaijão. O objectivo do documento é comparar o progresso das políticas climáticas de cada país, sendo analisado ainda o desempenho conjunto das 27 nações que compõem a União Europeia.
Nesta edição, a lista de desempenho climático continua a ser liderada pela Dinamarca, seguida pelos Países Baixos, que sobe três posições, e pelo Reino Unido, que escalou 14 lugares. Esta vertiginosa ascensão britânica deve-se ao encerramento da última central a carvão em Setembro, colocando um ponto final em 140 anos de uso desse combustível fóssil no arquipélago.
O índice CCPI considera os avanços no que toca à mitigação climática de cada um dos países avaliados. Juntas, estas economias representam 90% das emissões do planeta. As quatro categorias avaliadas são emissões de gases com efeito de estufa (com um peso de 40%), energias renováveis (20%), uso de energia (20%) e as políticas climáticas actuais (20%).
As fontes de informação são não apenas dados estatísticos facultados por diferentes entidades internacionais, mas também uma avaliação por peritos do desempenho nacional e internacional em matéria de políticas climáticas. Uma vez pontuadas, às nações podem ser atribuídas cinco classificações distintas: muito alta, alta, média, baixa e muito baixa.
Os três primeiros lugares do índice correspondem à classificação “muito alta”. A exemplo das edições anteriores, estas três posições não foram atribuídas uma vez que nenhuma nação está perfeitamente em consonância com as metas do Acordo de Paris (um tratado subscrito em 2015 no qual cerca de 200 países se comprometem a manter a subida dos termómetros globais abaixo dos 1,5 graus Celsius em relação aos níveis pré-industriais). Portanto, em termos práticos, podemos dizer que Portugal é o 12.º país com melhor desempenho climático.
O caso português
Apesar de ter descido no ranking do CCPI 2024, Portugal continua no grupo de países com nota “alta”. Recebeu uma classificação alta em termos de emissões de gases com efeito de estufa, mas média no que toca à utilização de energia, às energias renováveis e à política climática.
“É de ressalvar que a revisão do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) apresenta pontos positivos, como o objectivo global de redução das emissões para 2030 ter sido revisto para 55% em relação a 2005, em conformidade com a Lei de Bases do Clima, e a meta de longo prazo, de neutralidade climática antecipada para 2045, já está reflectida, mas fica ainda a faltar a consideração de uma meta para 2040”, refere a Zero, numa nota de imprensa.
A associação ambientalista também observa que o desempenho em matéria de energias renováveis “foi melhorado, passando a apontar uma capacidade instalada de 48 GW”. Contudo, argumenta a Zero, “parte do aumento deve-se à expansão da energia eólica e solar para produzir hidrogénio para exportação, um processo altamente ineficiente em termos energéticos” – o que significa que a essa capacidade adicional de energia renovável “não se materializa substancialmente em reduções de emissões”.
A Zero sublinha ainda que Portugal tem de se esforçar mais para cortar emissões no sector dos transportes, dado que o automóvel continua a dominar as deslocações dentro e fora das cidades. Os comboios e demais transportes públicos permanecem subutilizados. “Poucos ou nenhuns progressos a esse nível têm sido feitos”, lamenta a associação.
Perante este cenário de estagnação no sector dos transportes, que se soma ao aumento dos incêndios florestais, a Zero estima um aumento das emissões nacionais em 2024. A área de floresta ardida este ano aumentou de 34 para 136 mil hectares em relação ao ano anterior.
A principal recomendação que o relatório apresenta para Portugal, segundo o comunicado da Zero, é que sejam não só adoptadas políticas públicas “mais corajosas e consequentes” na descarbonização nos transportes e na agricultura, mas também que seja levada a sério a Lei de Bases do Clima, “cujo incumprimento é grosseiro”.
O cenário mundial
O documento revela que a maioria dos países avaliados apresenta metas climáticas insuficientes para 2030, o que significa que terão de ser bastante ambiciosos nos compromissos que definirem para 2035. Apenas 19 países têm um objectivo considerado adequado, ao passo que os restantes 45 ficam aquém da fasquia desejável para cumprir o Acordo de Paris.
A União Europeia cai este ano para o 17.º lugar, descendo uma posição, mas continuando no grupo de classificação “média”. A boa notícia é que esta é a primeira vez em que “nenhum Estado Membro recebe a pontuação ‘muito baixa’”, nota a Zero.
Das 27 nações que compõem o bloco europeu, 16 países estão classificados com pontuação “alta” ou “média”, sendo que os lugares cimeiros estão ocupados por representantes europeus (Dinamarca e Países Baixos, como referido).
A Zero destaca a incongruência europeia de insistir em dar subsídios aos combustíveis fósseis quando se comprometeu a eliminar progressivamente, até 2025, o uso de petróleo, gás e carvão.
Relativamente aos países do G20, cujos representantes estiveram reunidos no Rio de Janeiro para mais uma cimeira, apenas dois dos países integrantes receberam uma classificação alta: o Reino Unido e a Índia, ocupando, respectivamente, a 6.ª e a 10.ª posições. O bom desempenho indiano deve-se à forte aposta nas energias renováveis, ainda que haja uma grande dependência do carvão.
A classificação baixa é atribuída a outros 14 nações do G20, sendo a Coreia do Sul (63.º lugar), a Rússia (64.º) e a Arábia Saudita (66.º) aquelas com pior desempenho. A associação ambientalista considera estes resultados algo “preocupante”, considerando que os membros do G20 representam, juntos, mais de 75% das emissões mundiais de gases com efeito de estufa.
O maior emissor mundial, a China, ocupa um lugar pouco auspicioso: 55.º lugar, resvalando para o grupo da classificação “muito baixa”, a mais inferior de todas. Este desempenho deve-se à grande dependência energética em relação ao carvão e a metas climáticas inadequadas, ainda que as autoridades chinesas apostem numa expansão brutal das energias renováveis.
Já o segundo maior emissor, os Estados Unidos (EUA), mantém-se na mesma posição: 57.º lugar, na liga dos países com pior desempenho. Com a eleição de Donald Trump para a Casa Branca, pairam incertezas sobre o caminho norte-americano em direcção ao uso de energias renováveis e transportes movidos com energia limpa.
Se o novo Presidente eleito suprimir ou minar a Lei de Redução da Inflação criada pela administração de Joe Biden, o desempenho climático dos EUA nos próximos quatro anos poderá degradar-se ainda mais.
Donald Trump já deu sinais de que pretende recuar em matéria climática: escolheu o ex-congressista Lee Zeldin para liderar a Agência de Protecção Ambiental, por exemplo, um nome que tem sistematicamente votado contra leis ambientais propostas pelo governo de Biden.
Estima-se que o Presidente eleito tente reverter muitas regras da agência ambiental relativas à queima de combustíveis fósseis, incluindo uma medida que promove a redução das emissões de carbono das centrais eléctricas e do sector dos transportes nos EUA.
O índice de desempenho climático CCPI é publicado, desde 2005, pelas organizações Climate Action Network, Germanwatch e New Climate Institute.