Tendo em conta o debate em torno das declarações do primeiro-ministro sobre a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, parece oportuno relançar a ideia de que os docentes que leccionam esta disciplina tenham formação para tal. Isto porque, quanto mais os professores tiverem as ferramentas necessárias para potenciar diversas oportunidades de aprendizagem, mais esta disciplina tem o potencial de ser um espaço de crescimento e emancipação.
No meu caso, ainda antes da existência desta disciplina, tive a sorte de ter professoras que sacrificavam o seu tempo pessoal para, além de leccionarem as suas disciplinas, envolverem os alunos em projectos como o Erasmus+, o Parlamento dos Jovens, Assembleias Municipais Jovens ou voluntariado no Banco Alimentar.
Actualmente os professores do ensino básico (embora, infelizmente, não os do secundário) têm tempo lectivo dedicado a esta disciplina. Mas que formação e ferramentas lhes foram dadas para conhecer a fundo os referenciais, preparar estas aulas e pensar sobre todas as possíveis actividades relacionadas com estes temas? Perante as exigências do quotidiano escolar, como podemos esperar que um professor de uma área disciplinar completamente distinta tenha tempo para desenvolver este tipo de projectos, ao mesmo tempo que mantém as suas outras responsabilidades?
Uma possível solução seria a criação de um novo grupo de recrutamento em ciências sociais, como sugerido pelo professor Carlos Ceia, coordenador dos mestrados em ensino na NOVA FCSH.
A criação deste grupo de recrutamento e respectivo mestrado em ensino, para além de permitir a formação de novos profissionais vindos de outra áreas, num período em que faltam tantos docentes nas escolas, permitiria também oferecer a estes professores um percurso de aprendizagem que garanta uma formação transversal nos diversos temas que constam na Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania. Faria sentido que professores de outros grupos de recrutamento pudessem também aceder a esta formação, caso assim o entendessem.
Promovendo diferentes abordagens pedagógicas, seria possível dotar os professores de Cidadania com as ferramentas e condições necessárias para partilhar estes temas com os alunos de forma mais participativa, privilegiando, por exemplo, as visitas de estudo e a participação cívica, nomeadamente junto da comunidade envolvente da escola.
Poderia também ser criada uma rede de profissionais das mais diversas áreas (enfermeiros, contabilistas, biólogos, ativistas pelos direitos humanos, entre outros) disponíveis para co-construir com estes professores oportunidades de aprendizagem nestes temas. Actualmente são vários os professores que têm de dispensar algumas horas à procura de profissionais que possam convidar para participar nas suas aulas sobre os temas de educação para a saúde e sexualidade, educação financeira, educação ambiental ou educação para os direitos humanos. Porque não criar uma lista de contabilistas disponíveis para ir uma vez à escola “ensinar a fazer o IRS”? Porque não agilizar o contacto com associações de protecção do ambiente para promover mais projectos de voluntariado com os alunos? Esta rede poderia ser disponibilizada no site dedicado à Educação para a Cidadania.
Alguns, por receio da falta de “neutralidade” de quem possa estar a partilhar estes temas com os alunos, preferem defender a supressão/opcionalidade desta disciplina, ou que dela se excluam determinados temas. Não entendem que a existência desta disciplina pode garantir que os alunos têm acesso a uma pluralidade de opiniões, libertando-os das “amarras” que todos trazem dos seus próprios contextos.