Estudo revela que ribeiras urbanas estão poluídas por fármacos

Foram estudadas três ribeiras urbanas em Portugal e detectados oito fármacos. Numa das ribeiras existe alto risco para os invertebrados aquáticos devido a um antidepressivo.

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Em Portugal, foram estudadas três ribeiras urbanas, incluindo o Guadiana Miguel Manso
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Um estudo liderado por investigadores da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) concluiu que as ribeiras urbanas estão poluídas por uma grande diversidade de fármacos, afectando organismos aquáticos e processos ecológicos.

Esta investigação, feita em colaboração com a Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra (FFUC), teve como objectivo perceber o estado de contaminação de ribeiras urbanas por fármacos e os seus impactos no ecossistema e nos organismos aquáticos, revelou a FCTUC, em nota enviada à agência Lusa.

Assim, os especialistas efectuaram uma revisão bibliográfica de estudos científicos realizados em todo o mundo. "A revisão de literatura mostrou que ribeiras urbanas, para além dos rios, são um ecossistema de água doce crítico quando se trata da ocorrência de fármacos. Estas atravessam zonas muito urbanizadas e dado o seu pequeno volume de água e fraca capacidade de diluição podem ficar altamente poluídas, levando depois esses poluentes para os rios principais", alertou a investigadora do Departamento de Ciências da Vida da FCTUC e do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, Maria João Feio.

A estudante de doutoramento em Engenharia do Ambiente Fernanda Rodrigues refere que neste trabalho foram registados, em 49 ribeiras urbanas, a presença de 139 fármacos, pertencentes a dez grupos terapêuticos, em 13 países de quatro continentes, com predominância de anti-inflamatórios e anti-convulsivos. "Metabolitos dos fármacos foram também detectados, mas mais raramente analisados", acrescentou.

A equipa de investigação detectou fármacos como diclofenaco, ibuprofeno e paracetamol (analgésicos, anti-inflamatórios, anti-piréticos e anestésicos); claritromicina e eritromicina (antibióticos, anti-fúngicos e anti-pruriginosos); fluoxetina e citalopram (psicofármacos); estrona, 17ß-estradiol e etinilestradiol (hormonas); e genfibrozila (reguladores lipídicos).

Em Portugal, foram estudadas três troços de ribeiras urbanas (Mondego, Tejo e Guadiana), tendo sido detectado nas águas o total de oito fármacos. Observou-se ainda, numa das ribeiras, um alto risco para os invertebrados aquáticos devido a um antidepressivo, a fluoxetina.

Ao PÚBLICO, a investigadora Maria João Feio explicou que foi realizado um "teste toxicológico em laboratório com água recolhida de uma ribeira urbana no Alentejo" que detectou a presença deste antidepressivo, indicado para o tratamento da depressão, ansiedade, bulimia nervosa ou transtorno obsessivo-compulsivo.

De acordo com as especialistas, "os efeitos nos organismos aquáticos e processos ecológicos foram variados, desde bioacumulação, desregulação endócrina, crescimento deficiente, inibição de reprodução, aumento da mortalidade e distúrbios de eclosão até alterações morfológicas e diminuição da produção primária bruta e de biomassa".

Este estudo trouxe uma visão global sobre a questão dos fármacos em ribeiras urbanas e demonstrou também a necessidade de investir em novos estudos, nomeadamente em Portugal e na Europa, onde a equipa está a investigar esta questão. "Perceber como chegam estes fármacos aos ecossistemas ribeirinhos, de forma a minimizar a sua entrada, e conseguir eliminar estes poluentes da água é essencial para salvaguardar a saúde dos ecossistemas e organismos aquáticos, mas também a saúde humana, numa abordagem 'uma só saúde'", sustentaram.

A investigadora Maria João Feio acrescentou, ainda, que o estudo está a ser alargado a mais cidades europeias e que já foram recolhidas amostras de diversas ribeiras urbanas para proceder à "descaracterização dos fármacos e análise dos impactos nas comunidades de microalgas e invertebrados aquáticos".

"No entanto, o número total de ribeiras analisadas, até ao momento, é muito pequeno, e este estudo revelou a necessidade de estudarmos melhor a presença destes fármacos noutras ribeiras urbanas", acrescentou.

O artigo científico Pharmaceuticals in urban streams: a review of their detection and effects in the ecosystem, publicado na revista Water Research, contou ainda com a participação dos investigadores Luísa Durães, Nuno Simões, André Pereira e Liliana Silva.