Ao iniciar-se a segunda semana da COP29, há desânimo em Bacu, no Azerbaijão. As negociações na 29.ª Conferência da Convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas prosseguem a passo de caracol e sem demonstrarem a ambição necessária para responder aos problemas. Sobretudo no que diz respeito às necessidades de financiamento para apoiar os países mais pobres e mais vulneráveis a enfrentar os efeitos da mudança do clima e a limitarem as suas emissões de gases com efeito de estufa. “Acabem com o teatro e vamos falar a sério”, pediu o secretário executivo da Convenção, Simon Stiell.
“A primeira semana da COP29 caracterizou-se uma fraca liderança, processos lentos, textos demasiado longos e distantes de um resultado com escala suficiente para que haja justiça climática”, comentou Chiara Martinelli, directora para a Europa da rede de organizações não-governamentais Climate Action Network (CAN), citada num comunicado.
Se a União Europeia tem liderado a diplomacia noutras conferências do clima, isso não está a acontecer no Azerbaijão. A UE está a fazer parte do problema, com críticas a chover sobre a Hungria, que lidera a representação europeia, porque o país detém a presidência rotativa do Conselho Europeu, bem como sobre o comissário para o Clima, chefe da delegação da UE, o holandês Wopke Hoekstra.
“A UE tem orgulho em ser o maior financiador internacional de acção climática e fazer a sua parte no apoio aos países vulneráveis. Mas, nas salas de negociação, vemos uma União Europeia muito diferente”, declarou Emilia Runeberg, coordenadora da CAN para as polícias de clima e desenvolvimento.
“A UE continua a opor-se a que o novo objectivo de financiamento global inclua metas claras para o financiamento da adaptação [às alterações climáticas] e das perdas e danos [causados pelos efeitos da mudança do clima, que podem ser tempestades e secas, por exemplo]”, afirmou Runeberg. O estabelecimento destas metas traria mais transparência, para garantir que o financiamento seguiria para onde é mais necessário, e asseguraria a capitalização do Fundo de Perdas e Danos, recentemente criado, defende.
“Tu-primeiro-ismo”
O apelo do secretário executivo da Convenção das Alterações Climáticas das Nações Unidas foi claro. “Não podemos ter um surto de ‘tu-primeiro-ismo’, com alguns grupos a recusar-se a discutir um assunto até que outros cedam noutro ponto. Isto é uma receita para ir a lado nenhum. E pode fazer com os esforços das negociações climáticas recuem numa altura em que é crucial avançarem”, afirmou Simon Stiell, na abertura do plenário nesta segunda-feira.
O anterior quadro de financiamento para adaptação e mitigação das alterações climáticas previa atingir 100 mil milhões de dólares anuais. Mas só em 2022 o dinheiro canalizado pelos países mais ricos para os mais vulneráveis atingiu essa soma. E, mesmo assim, muito desse dinheiro é concedido sob a forma de empréstimos, que agravam a dívida destes países, frequentemente já a braços com empréstimos a instituições financeiras como o Fundo Monetário Internacional e outras.
Em discussão está a criação de um novo quadro de apoio, a partir de 2025, que cientistas, países em desenvolvimento e organizações não-governamentais (ONG), dizem ter de ser no valor de vários biliões (à portuguesa – o equivalente aos triliões anglo-saxónicos) de dólares.
Necessidades subavaliadas
Um artigo publicado nesta segunda-feira na revista científica Nature Climate Action, assinado por investigadores ligados a ONG, diz que estão subavaliadas as estimativas das necessidades de financiamento dos países em desenvolvimento. São precisos entre um bilião e 1,5 biliões de dólares anuais em apoios financeiros (e não empréstimos, com todos os seus encargos) anuais para cumprir os objectivos climáticos do Acordo de Paris (que o aquecimento global não ultrapasse 1,5 graus Celsius ou, no máximo dos máximos, dois graus).
“Particularmente preocupantes são as suposições relativamente ao sector energético. Concluímos que Agência Internacional de Energia subavaliou as necessidades de apoio para uma transição energética justa em cinco vezes menos em algumas publicações”, afirmou Andreas Sieber, dirigente da 350.org e primeiro autor do artigo, citado num comunicado de imprensa.
A falta de progresso na COP29 está a fazer com que os diplomatas presentes apelem à ajuda de outra cimeira, a do G20, que decorre no Rio de Janeiro, no Brasil. “Não podemos ter sucesso sem eles, e o mundo está à espera de ouvir o que têm a dizer”, afirmou o presidente da COP29, Mukhtar Babayev, citado pela Reuters. “O G20 representa 85% do Produto Interno Bruto global e 80% das emissões de gases com efeito de estufa.”
O G20 é composto pela União Europeia como bloco, África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia. A verdade é que a esmagadora maioria dos países do G20 não enviou os seus chefes de Estado ou de Governo à COP29 (os primeiros-ministros de Itália, Giorgia Meloni, e do Reino Unido, Keir Starmer, passaram por lá), o que deixa esta conferência do clima com um nível de peso diplomático bem baixo.