PSD quer acabar com corte de 5% no salário de políticos: “Temos essa coragem”
Caso a proposta seja aprovada, os sociais-democratas querem que tenha efeitos imediatos e chegue aos políticos já eleitos. Mas admite negociar com outros partidos, na fase de especialidade.
O PSD quer acabar com o corte de 5% no salário de titulares de cargos políticos. A notícia foi avançada pelo Expresso e confirmada esta sexta-feira pelo líder parlamentar do PSD, Hugo Soares. Imposto durante a troika, há 14 anos e a "título excepcional", este é o único corte salarial que nunca foi reposto.
A reversão esteve em cima da mesa em 2019 e novamente em 2022, mas nunca reuniu consenso. A medida não constava no programa eleitoral da AD, mas o PSD diz agora que "é da mais elementar justiça que isso possa acontecer". "E nós temos essa coragem", afirmou Hugo Soares na conferência de imprensa de apresentação de propostas de alteração ao Orçamento do Estado.
"Nós não queremos aumentar os salários [dos políticos]. Queremos acabar com o corte que existe desde o tempo da troika", insistiu o líder do grupo parlamentar do PSD, rejeitando as pressões de partidos populistas que defendem cortes nos salários de políticos.
Para Hugo Soares, uma vez que "essa é a única reminiscência da troika no país", então, "não há razão absolutamente nenhuma para que quem exerce cargos públicos continue a ter um corte salarial". Para o social-democrata, "até do ponto de vista simbólico e político" esta é uma reversão relevante.
Por consensualizar fica a data a partir da qual o fim deste corte será aplicado. Ou seja, se será já no mandato dos actuais deputados eleitos ou só na próxima legislatura.
Quem sofre o corte salarial?
Actualmente o corte é aplicado ao salário-base de quem desempenha cargos políticos, desde o Presidente da República aos presidentes de câmara, passando pelos deputados, primeiro-ministro, ministros, secretários de Estado e membros de governos e deputados das regiões autónomas. Esta redução aplica-se também a alguns gestores públicos, como membros dos conselhos directivos ou de administração dos institutos públicos, uma vez que os seus ordenados são indexados ao do Presidente da República.
À data, o corte foi acordado entre PS e PSD, e inseria-se num “conjunto de medidas adicionais de consolidação orçamental” cujo objectivo era “reforçar e acelerar a redução de défice excessivo e o controlo do crescimento da dívida pública”.
Na prática, apesar de os salários destes titulares de cargos públicos serem actualizados em linha com os aumentos da função pública, o corte de 5% continua a ser aplicado.
Numa entrevista ao PÚBLICO em Maio de 2019, Eduardo Ferro Rodrigues, então presidente da Assembleia da República, argumentava contra a manutenção do corte, afirmando que "não faz sentido" que um magistrado tenha um salário mais elevado do que o primeiro-ministro.
Embora os salários dos políticos sejam mais elevados do que os 1505 euros mensais brutos nos quais se fixavam as remunerações médias dos portugueses em 2023, o salário de um magistrado no topo da carreira é superior ao salário quer do primeiro-ministro, quer do presidente da Assembleia da República. Enquanto um magistrado no topo da carreira (ao qual não é aplicado qualquer corte salarial) ganha 6912 euros líquidos mensais, o primeiro-ministro ganha cerca de 5838 euros líquidos mensais.
Em 2019, em entrevista ao Expresso, António Costa, à data primeiro-ministro, defendeu o fim deste corte salarial, notando ser o único ainda em vigor, depois de a "geringonça" ter aprovado o fim dos outros cortes aplicados a salários e pensões. "É evidente que os cargos políticos não podem ser desvalorizados, em nome da dignidade da própria função", disse, na mesma entrevista.
No entanto, a covid-19 trocou as voltas a António Costa e em 2022 a sua ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, atirou essa decisão para "outro tempo e outra conjuntura". Apesar da pressão dos autarcas através da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), a ministra explicou que o Governo "entendeu" que o corte deveria ser mantido. "Num tempo em que as famílias estão todas a passar restrições, achámos que não era tempo de eliminar esse corte. Achamos que é tempo de apoiar as famílias mais carenciadas", justificou então.