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Da periferia de Salvador para o Web Summit, uma inovação médica para salvar vidas
Criada para pessoas com sonda gástrica, inovação liderada pela baiana Nilza Carla evita infecções e mortes de pacientes. Só no Brasil, daria mais qualidade de vida a 130 mil pessoas.
Pacientes que são obrigados a ter sonda gástrica para serem alimentados, chamados de gastrostomizados, costumam provocar complicações. Estima-se que 74% deles tem infecções, deslocamento do tubo ou irritações de pele, sendo que 15% morrem em decorrência das complicações.
Uma invenção da baiana Nilza Carla, 46 anos, promete resolver esse problema. Apresentado no Web Summit, ela criou um curativo que substitui a tradicional gaze colocada para envolver a entrada da sonda gástrica no organismo. “Gaze não é para manter seco. É um tecido e molha. É preciso um absorvente dérmico”, afirma Nilza, que veio para Portugal como uma das 10 startups escolhidas pela Central Única das Favelas.
A origem da invenção é um problema que atinge a família dela. “Meu filho, que hoje tem 18 anos, quando nasceu, foi diagnosticado com paralisia cerebral, e a médica indicou a sonda gástrica para ele viver e ter alguma qualidade de vida”, lembra Nilza, que vive na periferia de Salvador.
Mas a sonda gástrica presa com gaze não impede completamente a saída de líquidos. “O estômago tem comida, água, sucos gástricos e medicações. Com a sonda gástrica isolada com uma gambiarra de gaze, o paciente acaba tendo um odor forte e sangramentos”, relata Nilza, que, no Web Summit, levava dois bonecos para mostrar o que é o seu produto.
Inventar a solução
Sem conseguir trabalhar para atender o filho, e vivendo da pensão que recebe por causa da situação, o caminho dela foi procurar encontrar a melhor forma de cuidar do menino. Começou a estudar: primeiro, formou-se como técnica de enfermagem e, posteriormente, concluiu o curso de biologia. Atualmente, define-se como pesquisadora.
Foi em 2016 que surgiu o curativo para as sondas gástricas. “Experimentamos três protótipos e, no quarto, conseguimos”, diz. Ela trabalha com um grupo de mais quatro pessoas, incluindo uma médica gastroenterologista, uma coordenadora de inovação e fundos governamentais, um diretor de produção e um responsável pelas relações institucionais.
Nilza vê um grande mercado para seu produto. “Só no Brasil, há 130 mil pessoas gastrostomizadas. E há mais de 280 mil nos Estados Unidos, mais de 100 mil no Japão, 90 mil na França e 85 mil na Polônia. E, durante a pandemia, houve aumento de 12% no número de pessoas que precisam usar sonda por conta das complicações em consequência da Covid-19”, assinala. Ela calcula que cada pessoa teria de utilizar seis curativos por dia, cerca de 180 por mês.
Apesar dos oito anos desde a sua invenção e de ter recebido prêmios como o primeiro lugar no Impacta Nordeste e o primeiro lugar num concurso do Instituto Sabin, de a empresa dela ter sido escolhida como uma das 10 melhores startups do Brasil, a produção do curativo está praticamente parada. “Tínhamos um investidor que faliu por causa da pandemia. Quando temos uma encomenda, compramos a matéria-prima, que vem da China” explica.
No Web Summit, ela não está em busca de investidores. “Meu objetivo é que faculdades, hospitais e laboratórios testem meu produto. Acredito que quem deveria comprar o curativo é o SUS (Sistema Único de Saúde) e outros serviços públicos de saúde. Quero levar essa tecnologia para todas as pessoas gastrostomizadas”, declara.